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As 8 questões a que Mário Centeno ainda tem de responder

Mário Centeno defende hoje pela última vez o seu Orçamento. O prazo para entrega de propostas de alteração termina no final do dia e as votações na especialidade decorrem na próxima semana. Há pelos menos 8 temas que ainda não estão claros.

Miguel Baltazar/Negócios
17 de Novembro de 2017 às 08:00
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Pouco mais de um mês após a entrega no Parlamento, o ministro das Finanças passará a manhã de 17 de Novembro na Assembleia da República, na última defesa individual da sua proposta de Orçamento do Estado para 2018. Quanto terminar estará a horas do fim do prazo para a entrega das propostas de alteração dos partidos. As atenções estão centradas nas novidades relativas a medidas como o regime simplificado de IRS, a derrama sobre grandes empresas ou as despesas com florestas, mas há outras questões a que o ministro das Finanças ainda não respondeu. 

1. Quanto valem as medidas extraordinárias?
O governo enviou para Bruxelas uma lista de medidas extraordinárias que não explicitou na proposta de Orçamento de Estado que entregou no Parlamento a 13 de Outubro, nem enviou à UTAO, os técnicos a trabalhar no Parlamento, a tempo do seu relatório de análise ao OE que usou informação até 27 de Outubro. Os dados vieram a ser conhecidos apenas a 07 de Novembro, pelo relatório de análise do Conselho das Finanças Públicas (CFP), que discorda em larga medida do Governo. Para a equipa de Mário Centeno as medidas extraordinárias de 2017 ajudam o défice em 294 milhões de euros, e nelas inclui receitas de IRC com EDP, e com a recuperação de uma garantia do BPP, e despesas extraordinárias com impostos por activos diferidos, com garantias para lesados do BES e com swaps de empresas públicas. O CFP entende que destas medidas apenas a garantia do BPP e a assunção de dívidas de swaps são extraordinárias, e estima um efeito positivo nas contas deste ano de 368 milhões de euros. Para 2018 as divergências são maiores: o governo espera um efeito negativo de 492 milhões de euros (pela não existência da receita de IRC associada à EDP e por mais despesas com impostos por activos diferidos, incêndios e pagamentos à Grécia), enquanto o CFP coloca o efeito negativo em apenas 53,5 milhões de euros, a verba prevista para incêndios. A Comissão Europeia tomará posição sobre este assunto para a semana, mas o Governo já deverá ter informação pelo menos sobre a apreciação preliminar. Dependendo do valor de medidas extraordinárias, a melhoria do saldo estrutural em 2018 poderá rondar os 0,5% do PIB como previsto pelo Governo ou os 0,3 pontos antecipados pelo CFP.

2. O que planeia para incêndios?
É um dos temas quentes do Orçamento. O que sabe até agora é que a 21 de Outubro o Governo anunciou medidas de apoio às regiões ardidas e respectivas populações de 400 milhões de euros, entre os quais se incluíam medidas sem impacto orçamental (como linhas de crédito) e outras com impacto em 2017 e 2018, onde se incluem por exemplo medidas para limpeza da floresta e reconstrução de casas e infraestruturas, por exemplo. Desde então pouca informação adicional tem sido disponibilizada. Segundo o Conselho das Finanças Públicas (CFP), o governo candidatou apenas 53,5 milhões de euros de despesas com incêndios em 2018 para serem consideradas como medidas extraordinária em Bruxelas. E já esta semana o primeiro ministro afirmou que o OE terá 670 milhões de euros para o conjunto de actividades relacionadas com a reforma da floresta, prevenção e combate aos incêndios e apoio à reconstrução do país: 370 milhões que já estavam inscritos na proposta inicial e outros 300 milhões que seriam entretanto acrescentandos. Não é claro no entanto quanto destes montantes é despesa efectiva, por exemplo. 

3. O que explica o aumento de quase 800 milhões de euros em vendas?
Tanto CFP, como UTAO salientam o risco desta previsão que o Negócios evidenciou logo nas primeiras análises ao Orçamento do Estado. A redução do défice orçamental prevista para 2018 (de 1,4% do PIB para 1% do PIB, ou cerca de 700 milhões de euros) depende de um aumento previsto nas receitas com vendas de 767 milhões de euros. O Negócios questionou várias vezes o ministério das Finanças sobre o que justifica esta variação, mas não obteve resposta. Conselho das Finanças Públicas e UTAO consideram que é um dos principais riscos à execução orçamental, a que se juntam outros, nomeadamente nas previsões de crescimento da outra receita corrente, da receita de capital e da despesa de capital. Em sentido contrário, o Governo prevê um aumento significativo da despesa com consumos intermédios (uma vez excluídas as PPP) que não parece ser compatível com as promessas de poupanças inscritas no relatório de Orçamento e poderá dar alguma folga à execução.

4. Cativações são para controlar OE ou para fazer política?
Dizem respeito apenas a menos de 3% da despesa da administração central, mas tem sido um dos temas de embate político mais quente entre o ministro das Finanças e o Parlamento. Centeno insiste que precisa de uma margem confortável de despesa cativada (a que só pode ser gasta com a sua autorização) para garantir que não há derrapagens. E defende que os seus resultados no controlo do défice atestam a sua eficácia. O PSD e CDS-PP, mas também PCP e Bloco consideram que o ministro pede margem a mais: com este nível de cativações pode até orçamentar despesa a mais (dando uma ideia de crescimento de gastos que compensa com aumentos de receita), para depois, ao longo do ano, fechar a torneira. No fundo, em vez de serem um mecanismo de controlo, seriam um instrumento de política e ilusão orçamental. O ministro recusa as críticas e garante que as cativações baixarão significativamente, de 1.423 milhões de euros em 2017 para 1.156 milhões em 2018, embora não esclarecendo se fala de cativações iniciais ou finais. Já a UTAO aponta para quase estabilização dos cativos iniciais em recordes históricos: 1.881 milhões de euros em 2017 (2,9% da despesa da administração central) para 1.776 milhões de euros em 2018 (2,7% da despesa da administração central). O tema deverá aparecer novamente no debate: o PSD pelo menos já propôs um limite às cativações de 1,5% da despesa.

5. Salários sub-orçamentados? Quanto valem as progressões?
Tanto o CFP como a UTAO salientam os riscos da orçamentação das despesas com pessoal no OE que, num cenário benigno, traduzem um problema de falta de transparência da proposta de Orçamento e, no pior cenário, revelam sub-orçamentação, analisam os especialistas das duas entidades. Em 2017 estes gastos derraparão. Na proposta de Orçamento, como destacou o Negócios, prevê-se um aumento marginal dos gastos com pessoal, de apenas 71 milhões de euros face a 2017. Isto apesar do descongelamento das progressões, com um custo estimado de 353 milhões de euros, e "da reposição da aplicação de instrumentos de regulamentação colectiva do trabalho (22 milhões de euros); das novas condições remuneratórias para enfermeiros (15 milhões de euros); da reposição do regime de trabalho suplementar ou extraordinário (7 milhões de euros); e do programa de regularização extraordinária dos vínculos precários nas AP". O Governo diz que tem 130 milhões de euros para progressões numa dotação centralizada no ministério das Finanças, e que a verba restante está nos 450 milhões de euros de dotação provisional, mas não diz quanto. Dada a falta de informação e as polémicas dos últimos dias, nomeadamente os recentes protestos dos professores sobre as suas progressões, é normal que o tema vá a debate para se saber, afinal, quanto custam as progressões em 2018 e qual o risco de suborçamentação dos gastos com pessoal.

6. O que explica o aumento de 40% no investimento?
O Governo prevê um aumento de 40% na despesa de investimento em 2018, ou mais 1300 milhões de euros face a 2018. A promessa surgiu na versão final do Orçamento já depois de em versões iniciais do documento estarem valores substancialmente inferiores. Dada a dimensão do crescimento, e o facto de tanto em 2016 como em 2017 a execução ter ficado abaixo do prometido (cerca de mil milhões é o desvio estimado para este ano), os partidos com assento parlamentar, em particular o PCP, têm pedido nos debates informação detalhada ao Governo sobre que projectos fundamentam esta previsão. Ainda não receberam resposta. O Negócios também não.

7. Recibos verdes no regime simplificado de IRS não pagarão mais imposto?
É uma das medidas mais polémicas do Orçamento e, tal como com as florestas, poderá ter resposta clara apenas nos próximos dias, após a entrega das propostas de alteração ao Orçamento do Estado. As alterações propostas ao regime simplificado prevêem que a consideração de despesas que gerem um abatimento de IRS superior a 4.104 euros carecem de recibos no e-factura. Ou seja, a partir desse montante, para manter os actuais níveis de tributação, os profissionais liberais e empresários têm de "provar" os seus gastos. O governo defende que daqui não virá mais complexidade, pois já é suposto as despesas estarem no e-factura, e além disso desenhará um sistema fácil de registo de despesas mistas (que resultam tanto da vida pessoal como profissional) . Defende ainda que a alteração introduzirá mais justiça fiscal. Os críticos falam em aumento de impostos encapotado e o fim do regime que se diz simplificado. Os partidos que apoiam o governo já disseram que não querem um aumento de IRS para os recibos verdes, mesmo para os 10% dos contribuintes que o governo estima que sejam afectados pela medida. Resta saber como se garantirá a neutralidade fiscal.

8. Vai mesmo subir a derrama de IRC? Quanto custaria e quantas empresas seriam?
É uma das medidas mais polémicas. PCP, Bloco de Esquerda e uma parte do PS vêem com bons olhos um aumento da derrama para empresas com lucros superiores a 35 milhões de euros, que subiria de 7% para 9%. A medida será vista com maus olhos pelos ministros das Finanças e da Economia, que apostam na estabilidade fiscal e não querem prejudicar as empresas, nem criar essa impressão. Ainda não se conhecem quantas empresas seriam afectadas e qual o impacto orçamental. Os partidos à esquerda entendem no entanto que seria uma boa forma de pedir um pouco mais de esforço fiscal às grandes empresas, que aliás foram beneficiadas na sua factura fiscal por medidas como a reavaliação de activos. A par com a derrama, PCP e Bloco de Esquerda reclamam também o fim do corte de 10% no subsídio de desemprego ao fim de seis meses.
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