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Mentores da reestruturação grega: a situação política está a ficar "perigosa"

Lee Buchheit, advogado, e Mitu Gulati, professor de direito, são considerados os mentores da reestruturação da dívida grega e vêm com preocupação os últimos desenvolvimentos no País. Aconselham cautela na interpretação dos juros baixos na Europa.

Reuters
12 de Março de 2015 às 20:33
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O problema com a dívida grega não é tanto económico ou legal, mas principalmente político e os desenvolvimentos dos últimos meses são preocupantes, analisam Lee Buchheit e Mitu Gulati, os mentores da solução jurídica que permitiu à Grécia concretizar em 2012 a maior reestruturação de dívida pública da história. 

 

O confronto entre o governo grego e os restantes governos da Zona Euro, em particular com a Alemanha está escalar e os governantes de ambos os lados estão a colocar-se em posições das quais, algum dos lados, "poderá ter de desistir de forma embaraçosa e isso é muito perigoso", defende Lee Buchheit, advogado do escritório de advogados Cleary Gottlieb Steen & Hamilton, em Nova Iorque, que assessorou o governo grego na reestruturação de 2012.

 

Buchheit, um dos mais conceituados especialistas internacionais em reestruturações de dívida, considera que os incentivos dos vários lados para chegar a um acordo estão desalinhados, dificultando um acordo.

 

Do lado grego, um país que experimentou "um ajuste ornamental imenso" há, como é habitual em episódios desta natureza, uma rejeição social e política da austeridade. Do lado dos restantes governos, e em especial dos do norte da Europa, há o sentimento de que já baixaram significativamente o esforço grego com a dívida, pelo menos nos próximos anos, pelo que não têm forma de defender perante os seus eleitorados uma nova reestruturação. "Não agora, se fosse daqui a dez anos" talvez fosse possível, afirmou o especialista, numa conferência sobre dívida soberana, organizada na Católica Global School of Law.

 

Mitu Gulati, professor na universidade de Duke, também nos Estados Unidos, que partilhou a sessão, está igualmente a apreensivo, desaprovando a retórica em que o debate está ser colocado, pelo menos do lado grego, por exemplo quando pede publicamente reparações de Guerra à Alemanha.  

 

O académico alinha com a conclusão de que, com a Grécia a dever essencialmente aos governos da Zona Euro e beneficiando de condições favoráveis, "o problema não é o stock de dívida, é político". "O governo grego quer gastar mais dinheiro e de formas que os governos mais poderosos da Zona Euro desaprovam", afirmou, considerando por isso que o embate procura "disciplinar as contas gregas, de forma a que sirva de mensagem a outros eventuais governos de esquerda".

 

E quando as taxas de juro subirem?

 

Os dois especialistas também trouxeram a Lisboa uma mensagem que aconselha cautela na interpretação do actual momento nos mercados que mantêm as taxas de juro baixas para quase todos os países da Zona Euro. Esse é um efeito da intervenção do BCE e não dura sempre, defendem. 

 

Quando as taxas de juro subirem, vários governos da Zona Euro serão então confrontados com os elevados stocks de dívida acumulada durante a crise. E essa pressão será traduzida em facturas de juros que desviaram recursos desejados para outros objectivos, como educação ou saúde.

 

"Os países endividados e confiantes que conseguirão crescer" e resolver o problema, "mas o que acontecerá quando as taxas de juro subirem: quanto tempo irão tolerar pagar e cortar despesas sociais, por exemplo?", perguntou Mitu Gulati à audiência, evidenciando esse dilema como um dos principais riscos para a Zona Euro nos próximos anos, e lembrando que a região não tem sido particularmente dinâmica em termos de crescimento.

 

Lee Buchheit concorda e lembra outras características preocupantes para os países altamente endividados da Zona Euro, entre os quais a Itália, pelo seu enorme stock de dívida surge em destaque. Os países não controlam a moeda e a inflação é baixa, dois instrumentos pelos quais seria possível incentivar o crescimento e cortar o valor real da dívida, sublinha.

 

"Historicamente, em reestruturações os países tendem a desvalorizar as moedas para ganharem competitividade e crescerem e isso não é possível para os Estados da Zona Euro"; "Outra forma de baixar a dívida, usada de forma eficaz por exemplo pelos Estados Unidos a seguir Grande Guerra, é gerar inflação. Mas na Zona Euro ela está perigosamente baixa", analisou.

 

O quadro negro chegou acompanhado de muitos avisos, mas sem propostas de solução. Nem Buchheit, nem Gulati defenderam, por exemplo, uma acção conjunta europeia para redução de dívidas, como tem sido proposto por vários economistas. Mas das suas intervenções fica a ideia de que, muito provavelmente, ainda se vai ouvir falar bastante de reestruturações nos próximos anos da Zona Euro.

 

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