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Lagarde avisa Tsipras que Atenas está muito longe de ter programa coerente
Depois do Wikileaks ter revelado uma conversa entre responsáveis do FMI, Lagarde avisou que se a Grécia não conseguir restabelecer a confiança no país, poderá ser forçada a adoptar ainda mais medidas.
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A directora-geral do Fundo Monetário Internacional (FMI) revelou este domingo a carta que enviou ao primeiro-ministro grego, depois de Alexis Tsipras ter pedido a Lagarde uma clarificação sobre o programa de ajustamento da Grécia.
A responsável máxima do FMI alerta que as duas partes estão ainda longe de chegar a acordo sobre o programa a implementar por Atenas e deixa vários recados ao líder grego.
"A minha visão é que estamos ainda a uma grande distância de chegarmos a um programa coerente que posso apresentar à nossa comissão executiva. Já em muitas ocasiões fiz questão de assinalar que só poderemos suportar um programa que seja credível e com base em assunções realistas e que cumpra os objectivos de colocar a Grécia num caminho de crescimento robusto e recuperação gradual da sustentabilidade da dívida", refere Lagarde, na carta que foi publicada no site do FMI.
Esta missiva surge depois de Tsipras ter enviado no sábado uma carta à líder do FMI. Missiva que surgiu depois de o Wikileaks ter publicado a alegada transcrição de uma teleconferência entre dois responsáveis do FMI, na qual estes discutem a estratégica para a Grécia aceitar mais cortes orçamentais e para levar a Alemanha ceder a uma nova reestruturação da dívida.
A directora-geral do FMI avisa que se a Grécia não conseguir restabelecer a confiança no país, poderá ser forçada a adoptar ainda mais medidas. Ainda assim, abre a porta a que sejam fixadas metas orçamentais menos exigentes, desde que sejam realistas, de modo a que posteriormente se possam tomar medidas para aliviar a dívida grega. "No interesse do povo grego, temos que acelerar a conclusão das negociações", refere.
Confiança
Sobre a divulgação da conversa entre responsáveis do FMI, Lagarde diz a Tsipras que para as negociações terem sucesso, "tem de haver confiança mútua de ambas as partes" e que os incidentes deste fim-de-semana fazem aumentar as preocupações se "poderemos alcançar progressos num clima extremamente sensível e com comunicados de ambos os lados".
Ainda assim, Lagarde diz ter decidido fazer regressar a Atenas a equipa do FMI para que as negociações possam prosseguir. "Para que possam fazer o seu trabalho, é crítico que as vossas autoridades assegurem um ambiente que respeite a privacidade das suas discussões internas e tomem todas as medidas necessárias para garantir a sua segurança pessoal".
Reforça que o FMI conduz as negociações "de boa-fé, não através de ameaças e não comunicamos através da revelação de conversas privadas".
A conversa entre os responsáveis do FMI O documento divulgado pelo Wikileaks identifica os interlocutores da conversa como o director de assuntos para a Europa do Fundo Monetário Internacional (FMI), Poul Thomsen, e a chefe da missão da instituição na Grécia, Delia Velculescu, tendo a conversa acontecido a 19 de Março último.
Nesta conversa, ambos os responsáveis mostram-se muito exasperados com o ritmo lento das negociações quanto às reformas a concretizar pelos gregos e a pouca pressão por parte das instituições e parceiros europeus, e falam sobre a estratégia a adoptar nas negociações do terceiro programa de resgate para o FMI fazer valer a sua posição.
Do que se compreende das transcrições, a instituição liderada por Christine Lagarde defende metas orçamentais mais exigentes, que implicam maiores cortes de despesa, como um excedente primário orçamental de cerca de 3,5% do Produto Interno Bruto (PIB), e propõe um alívio da dívida grega.
Durante a conversa, Poul Thomsen lembra que, no passado, os gregos só aceitaram ceder às exigências quando "estavam prestes a ficar sem dinheiro e a entrar em incumprimento".
"E isso é provavelmente o que vai acontecer de novo. E, neste caso, arrasta-se até Julho e claramente os europeus não vão ter quaisquer discussões durante o mês anterior ao 'Brexit'", acrescentou o responsável do FMI, em referência ao referendo britânico marcado para 23 de Junho, que vai decidir sobre a permanência do Reino Unido na União Europeia.
Thomsen fala ainda da reestruturação da dívida grega, que há bastante tempo o FMI defende, e da forma como levar a Alemanha a aceitá-la.
"Basicamente, nós a certa altura dizemos. ‘Olhe, senhora Merkel, tem um desafio e tem de pensar o que lhe traz mais custos. Ir em frente sem o FMI e, aí o parlamento alemão irá questionar ‘O FMI não participa?’, ou escolher o alívio da dívida que nós pensamos que é necessário para estarmos dentro’", afirmou, citado na transcrição disponibilizada pela Wikileaks na sua página na internet.
A Alemanha tem insistido na participação do FMI no terceiro programa de resgate à Grécia, uma vez que considera que esta será mais exigente com a Grécia na execução de reformas.
Para aceitar estar financeiramente envolvido no resgate, no valor de 86 mil milhões de euros, o FMI – que actualmente presta assistência técnica - exige de Atenas várias reformas, nomeadamente nas pensões, mas também que a Zona Euro aceite a renegociação da dívida pública do país.