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Mattarella ouviu partidos e a crise política voltou à casa de partida
Ouvidos os líderes partidários, o presidente de Itália prometeu que a "crise será resolvida brevemente" e anunciou que, na próxima terça-feira, fará uma nova ronda de consultas aos partidos para avaliar se existem condições para formar um novo governo com apoio de uma maioria parlamentar alternativa.
A crise política italiana vai continuar pelo menos até à próxima terça-feira. O presidente da República de Itália, Sergio Mattarella, deu uma conferência de imprensa ao final desta tarde em que anunciou ter decidido corresponder ao pedido feito por vários partidos e conceder mais tempo para que seja procurada uma solução para superar a crise política transalpina.
Pouco depois de concluir a ronda aos partidos representados no parlamento que decorreu nos dois últimos dias, Mattarella falou brevemente sobre a "crise de governo" aberta pela "rutura polémica na relação entre os dois partidos" que formam a coligação de governativa ainda em exercício.
"A crise será resolvida brevemente", assegurou Sergio Mattarella que referiu cinco vezes a palavra "parlamento", sinalizando que qualquer decisão presidencial terá em conta o "dever ineludível" do presidente que passa por respeitar a "expressão da vontade maioritária do parlamento".
O presidente notou ainda a inoportunidade desta crise oficialmente instalada pela demissão, na terça-feira, de Giuseppe Conte do cargo de primeiro-ministro. O contexto de incerteza internacional provocado pelos sinais de abrandamento e pela disputa comercial e a necessidade de Itália cumprir com as suas obrigações relativamente à União Europeia (em concreto a escolha do comissário transalpino e a aprovação de um orçamento para 2020) foram os fatores apontados.
Tendo referido que mais do que uma força política lhe solicitou mais tempo para avaliar e discutir as condições existentes para encontrar uma solução, Mattarella não deixou qualquer indicação de qual a direção a seguir.
Não referiu se privilegia a formação de uma maioria de governo alternativa à aliança Liga-5 Estrelas, nem que tipo de aliança, se contempla avançar com o regresso às urnas ou sequer se admite um executivo tecnocrático.
A terminar, revelou que na próxima terça-feira fará outras nove consultas aos líderes partidários para concluir se nessa altura estão ou não reunidas condições para forjar uma nova solução governativa.
Volta tudo à estaca zero e tudo é possível
Uma vez que o presidente não deixou indicação alguma sobre o caminho que preconiza para sair da crise instalada desde que o líder da Liga e vice-primeiro-ministro, Matteo Salvini, proclamou o fim do governo e exigiu eleições antecipadas, todas as hipóteses continuam em cima da mesa.
E todas são mesmo todas. É que apesar de a relação entre Salvini e o Movimento 5 Estrelas de Luigi Di Maio ter chegado a ponto de rutura, o líder da Liga disse hoje, após falar com Mattarella, estar "disponível" para retomar, "sem rancores" a governação com os "grillini".
No entanto, Salvini reitera que o cenário preferido continua a ser o regresso antecipado às urnas, a que não é alheio o facto de a Liga dominar as sondagens, que apontam para a possibilidade de a Liga poder obter a maioria em conjunto com o Irmãos de Itália de Giorgia Meloni para um executivo de extrema-direita.
Governo P5 Estrelas-PD é possibilidade real
Não abordando para já os cenários de governo tecnocrata de iniciativa presidencial, fórmula pouco popular sobretudo depois da experiência Mario Monti, e de novas eleições, que Mattarella preferiria evitar para não criar constrangimentos à aprovação do orçamento de 2020, sobre como forte hipótese uma aliança entre os dois partidos atualmente mais representados no parlamento: 5 Estrelas e PD.
Os partidos respetivamente liderados por Di Maio e Nicola Zingaretti reúnem-se, pela primeira vez, esta sexta-feira, sendo que um dos pontos essenciais e que pode causar maior fricção passa por definir quem poderia liderar tal solução. Um primeiro-ministro de um dos partidos poderia ser mal recebido pelo parceiro, pelo que, neste caso, a solução podia ser o recurso a um nome independente, como foi exemplo Giuseppe Conte.
Depois de ontem ter apontado cinco pontos essenciais que um acordo com o 5 Estrelas teria de prever, esta quinta-feira Zingaretti traduziu-os em "três princípios não negociáveis", que comunicou também a Mattarella. A saber: abolição dos dois decretos sobre segurança interna com o cunho de Salvini; pré-acordo (prévio a um eventual acordo de governo) sobre as principais medidas económicas a constar do orçamento para o próximo ano; rejeição à reforma constitucional através da qual o 5 Estrelas quer cortar em 345 o números de parlamentares (deputados e senadores). A reforma constitucional proposta pelo antigo líder do PD e primeiro-ministro, Matteo Renzi, previa uma redução do número de deputados e senadores.
O líder do PD recusa um "governo a todo o custo" e defende a necessidade de um "governo de mudança".
Pelo seu lado, o 5 Estrelas transmitiu a Mattarella como grande prioridade evitar novas eleições e total disponibilidade para formar uma "maioria sólida" de governo. Di Maio não excluiu em momento algum recuperar a aliança com a Liga, algo que Salvini assume como hipótese, contudo pode não ter afastado esse cenário enquanto estratégia para ganhar força na negociação com o PD.
Na conversa com o presidente, Di Maio elencou ainda 10 pontos que considera decisivos para evitar eleições antecipadas e garantir a governação até ao final da legislatura, prevista para 2023. Nenhum entra em clara contradição com as exigência feitas pelo PD, pelo que a questão do primeiro-ministro a designar e a questão das mudanças ao sistema político surgem como os principais obstáculos a um entendimento.
A favorecer um acordo está o facto de ambos os partidos quererem evitar o regresso às urnas e salvaguardar a "hegemonização" da política italiana pretendida por Salvini, que pede "plenos poderes" para aplicar o programa da Liga.
O relógio está a contar.