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Indefinição na Alemanha deixa Zona Euro, Macron e Brexit em suspenso

Angela Merkel vive o momento mais difícil em 12 anos à frente da chancelaria alemã, após o fracasso nas negociações para a formação de uma coligação de governo. Sem um governo estável na Alemanha, as propostas de Emmanuel Macron para a França e a Zona Euro poderão ficar em suspenso, assim como as negociações para o Brexit.

Reuters
20 de Novembro de 2017 às 11:10
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"Como chanceler, farei tudo para assegurar que o país é bem gerido nas semanas difíceis que se avizinham", disse Angela Merkel na madrugada desta segunda-feira, 20 de Novembro, depois de os liberais terem abandonado a mesa de negociações para a formação de um governo, após uma maratona negocial de 15 horas.

 

"Difíceis" é a palavra a reter, porque a chanceler alemã vive o momento mais difícil dos últimos 12 anos como chanceler germânica. Um momento difícil no plano interno que dificilmente deixará de ter consequências ao nível externo, em especial para a União Europeia: de elemento estabilizador para a Europa, e para a Zona Euro em particular, a Alemanha ameaça agora tornar-se num foco de instabilidade para a política europeia.

Com a proximidade do Conselho Europeu, marcado para meados de Dezembro, em que os líderes europeus se preparavam para discutir a reforma da Zona Euro e as propostas do presidente francês, Emmanuel Macron, para aprofundar a integração no bloco do euro, a inexistência de um governo em plenitude de funções na Alemanha poderá redundar em novo adiamento.

Mesmo o plano de Macron para implementar as chamadas reformas estruturais em França pode ser colocado em causa, já que o líder gaulês apostava na conciliação de uma agenda interna reformista com avanços ao nível da integração europeia, designadamente na moeda única.

Se Macron estava dependente do resultado das negociações na Alemanha e do tipo de acordo que permitisse formar um novo governo alemão para prosseguir a sua agenda política, este momento de indefinição pode deixar o presidente francês duplamente manietado. Numa declaração feita esta manhã em Paris, Macron assumiu que este bloqueio nas negociações de governo não é favorável aos "interesses" da França.

Por outro lado, também as conversações em torno do Brexit podem sofrer novo revés. Tendo em conta o impasse que não tem possibilitado garantir avanços nas negociações - com diferendos na questão da factura do divórcio, dos direitos dos cidadãos europeus a residir no Reino Unido e ainda a questão da fronteira entre as duas Irlandas -, a primeira-ministra britânica, Theresa May, esperava que a estabilização governamental na Alemanha possibilitasse negociar uma solução directamente com Merkel.

 

Temas como a renovação e reforço das sanções financeiras aplicadas por Bruxelas à Rússia ou ainda a revisão periódica do memorando de entendimento grego poderão também ficar em banho-maria.

 

Mais fragilizada, Merkel tem três opções

 

Já se sabia que seria difícil formar a inédita coligação Jamaica (assim chamada porque as cores dos partidos são as mesmas da bandeira jamaicana), juntando a aliança democrata-cristã (CDU de Merkel e o partido-irmão da Baviera, a CSU) ao FDP (liberais) e aos Verdes, contudo o mês de conversas exploratórias não só não permitiu aproximar posições, acabou por sublimar as diferenças.

Foi o que realçou o líder liberal Christian Lindner, que ao bater a porta na última madrugada sinalizando "inúmeras contradições" entre as quatro forças políticas, garantiu que as últimas horas de conversações levaram a "revezes" negociais.

Merkel considerou "lamentável" a saída do FDP que colapsou as negociações do que poderia ter sido um "dia histórico". Na quinta-feira passada, data-limite informal imposta pela própria chanceler para a conclusão das negociações exploraórias, Merkel, que ainda em Setembro disse acreditar numa solução governativa antes do final de 2017, mostrava-se optimista quanto a um desfecho positivo. Porém, tal não se verificou e sexta-feira as negociações foram retomadas num ambiente de menor optimismo.

Esta madrugada a chanceler reconheceu que a migração foi a "questão central" que travou um acordo mas o clima e o peso financeiro do apoio aos países de Leste, segundo escreve a Der Spiegel, continuaram a constituir entraves sensíveis.

Angela Merkel vai esta segunda-feira comunicar pessoalmente ao presidente da Alemanha, Frank-Walter Steinmeier, o fracasso nas conversações que tinham como objectivo alcançar um acordo de princípio que permitisse dar um passo em frente para negociações formais com vista à formação de uma coligação governativa com suporte parlamentar maioritário.

O social-democrata Steinmeier tem a palavra final, podendo convidar Merkel a formar um governo minoritário, cenário nunca visto desde 1949, ou instar a líder da CDU a nova insistência negocial. A chanceler, que confirmou que para já permanecerá como líder de um governo em gestão, com base na grande coligação com o SPD, ficou limitada a três opções.

Merkel poderá tentar reeditar a aliança com os social-democratas, cenário improvável tendo em conta que o pior resultado de sempre do SPD nas eleições de Setembro levou Martin Schulz a colocar de parte uma nova coligação com a CDU. Schulz posicionou o partido como a maior força da oposição, também para evitar deixar esse papel à extrema-direita (AfD), que entrou no Bundestag pela primeira vez desde a Segunda Guerra.

 

A segunda opção passa por governar em minoria, com base na aliança democrata-cristã CDU-CSU ou incluindo os Verdes na coligação, o que ainda assim não permitiria obter suporto maioritário no Bundestag.


Uma terceira e última opção passa pela convocação de eleições antecipadas, algo que também nunca aconteceu desde 1949, que ao que tudo indica decorreriam na próxima Primavera.

Contudo, este parece ser o cenário a evitar, não só porque as eleições federais de Setembro implicaram uma importante quebra do "centrão" (CDU e FDP) e uma importante subida da AfD, mas porque também mostraram que na Alemanha se fez sentir a tendência de reforço eleitoral de forças anti-sistema acompanhada da perda de expressão dos partidos considerados moderados.

A realização de novas eleições poderia reforçar uma ou ambas as tendências, o que reforça as duas primeiras opções como as mais viáveis. Habitualmente elogiada pela capacidade negocial e por ser capaz de, à última hora, apresentar uma solução capaz de ultrapassar diferenças aparentemente insanáveis, Angela Merkel terá a última palavra, embora numa posição de fragilidade raras vezes experimentada pela chanceler. O tempo escasseia. 

Steinmeier pede regresso à mesa de negociações

Depois de ouvir Merkel comunicar formalmente o colapso das negociações, o presidente alemão fez uma declaração aos alemães em que instou os partidos com assento parlamentar a retomarem o diálogo para encontrarem uma solução em nome do interesse germânico.

 


"Todos os partidos políticos eleitos para o parlamento germânico têm a obrigação para com o interesse comum de servir o nosso país", declarou Steinmeier que disse esperar "prontidão" das forças políticas para encontrarem uma solução "no futuro próximo".

 

O ex-ministro dos Negócios Estrangeiros de Merkel lembrou ainda que a incapacidade dos partidos em forjarem uma coligação seria incompreensível tanto para os alemães como para o conjunto dos europeus.

 

No entanto, não obstante a posição de Steinmeier, tanto o SPD  como os Verdes já vieram a terreiro defender a realização de eleições antecipadas. "Não temos medo de repetir as eleições", afirmou o líder social-democrata, Martin Schulz, para quem um governo minoritário não é uma opção válida.

 

Também a líder dos ambientalistas, Katrin Göring-Eckardt, prefere um novo acto eleitoral na próxima Primavera. Pelo seu lado, o co-líder do AfD, Alxander Gauland, exige a demissão de Merkel. O FDP ainda não tornou pública a sua intenção.

(Notícia actualizada às 15:10 com declaração do presidente alemão)

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