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Dez respostas sobre a polémica do salário mínimo e da TSU

O desconto na taxa social única que consta do acordo de concertação social sobre o salário mínimo foi posto em causa. Dez perguntas e dez respostas para entender porquê.

Bruno Simão/Negócios
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1. Que acordo é este?
O acordo anunciado a dois dias do Natal envolve o Governo, a UGT e as quatro confederações patronais. Depois de terem defendido uma redução do valor de 557 euros, que estava previsto no Programa de Governo, os patrões acabaram por aceitar o valor, mediante contrapartidas. A mais imediata é a redução de 1,25 pontos na taxa social única a cargo dos empregadores durante (mais) um ano. Numa altura em que PCP e Bloco de Esquerda apresentam várias propostas, ficou também previsto que a "discussão" sobre legislação laboral seja feita "durante o ano" de 2017. No documento, que na sua última versão de Dezembro, deixou cair a referência específica à meta do aumento para 600 euros na legislatura (que continua a constar do Programa de Governo) o Executivo compromete-se a condicionar os futuros aumentos do salário mínimo à avaliação das "condições económicas e sociais". A cerimónia de formalização do acordo estava prevista para Janeiro, mas ainda não foi confirmada.



2. Porque é que o acordo é importante para o Governo?
É importante para credibilizar o aumento do salário mínimo, que sobe 5% pelo segundo ano consecutivo, nomeadamente aos olhos de Bruxelas. "Este apoio alargado reforça esta decisão. Reforça internamente, dá mais credibilidade à decisão, e reforça também do ponto de vista externo, do ponto de vista internacional", já que "muitos duvidam que se possam fazer determinado tipo de políticas no nosso país", afirmou o ministro do Trabalho, Vieira da Silva, quando o acordo foi anunciado, em Dezembro. Por outro lado, ao fechar compromissos com os patrões e com a UGT sobre as políticas laborais, por exemplo, o Governo ganha argumentos para travar a pressão dos parceiros à esquerda para a reversão de medidas nesta área. 



3. O que é que ameaça o acordo?
Já se sabia que PCP e Bloco de Esquerda estavam contra qualquer redução na taxa social única (TSU) e que iriam pedir a apreciação parlamentar do decreto-lei quando este for publicado, o que, por si só, não comprometia a medida, tal como se viu no ano passado. A grande surpresa desta semana foi a posição do PSD, que garantiu que votará ao lado de bloquistas e comunistas, chumbando o desconto na TSU. A ameaça compromete a concretização do acordo em concertação social, pelo menos nos termos em que ele foi alcançado.



4. E porque é que a decisão do PSD é surpreendente?

Por um lado porque, apesar das reservas sobre o aumento do salário mínimo, o PSD não é por princípio contra reduções da TSU. Foi o Governo de Passos Coelho que em Setembro de 2012 propôs uma redução definitiva da taxa social única (TSU) a pagar pelas empresas em 5,75 pontos percentuais, ao mesmo tempo que a taxa contributiva a cargo dos trabalhadores subiria sete pontos, uma medida que não avançou devido à forte contestação política e popular. Mesmo após o final do programa de ajustamento, quando aprovou o aumento do salário mínimo de 485 euros para 505 euros, o Governo também aprovou uma descida da TSU para os patrões, de 0,75 pontos, apesar de as condições serem menos generosas do que as que agora estão previstas no acordo.

Por outro lado, porque o PSD tem sempre defendido a legitimidade das decisões que saem de concertação social.


5. Como é que o PSD justifica esta decisão?
O PSD argumenta que não tem de dar a mão ao Governo nas situações em que o Executivo não consegue garantir o apoio dos seus parceiros à esquerda. "A haver um processo no Parlamento, que fique desde já claro que terá de ser a coligação de esquerda a tomar uma posição, porque nós não seremos uma muleta do Governo, dando ao Governo o apoio que não consegue entre os seus parceiros", justificou o líder parlamentar do PSD. Luís Montenegro também disse que o maior partido da oposição é "frontalmente contra" a descida da TSU como forma de compensar o salário mínimo, rejeitando que haja uma contradição entre esta posição e o desconto aprovado em 2014. 


"Nós não somos incoerentes porque o que foi feito, apenas e só em 2014, tinha como quadro uma medida que era aplicada só um ano e, simultaneamente, com o compromisso dos parceiros que, nos anos subsequentes, o aumento do salário mínimo teria por base outros factores como inflação, crescimento e produtividade", justificou.

6. O desconto na TSU é diferente do que foi aplicado em anos anteriores?

Sim. Apesar de ter uma lógica semelhante, o desconto na TSU previsto para 2017 é mais abrangente que o desconto aplicado em 2016, também pelo governo de António Costa, que por sua vez já foi mais generoso que o desconto decidido em 2014, pelo Governo de Passos Coelho.


O desconto do Governo anterior era de 0,75 pontos mas aplicava-se essencialmente às empresas tivessem pago os 485 euros em alguns dos meses anteriores ao aumento, deixando de fora os salários intermédios (trabalhadores acima dos 485 euros e abaixo dos 505 euros). Essa lógica foi alterada no ano passado: o desconto que se aplicou em 2016, aprovado pelo governo de António Costa, já incluía os trabalhadores com salários intermédios (entre os 505 euros e os 530 euros), o que alargou substancialmente a abrangência da medida.

Para 2017 estava previsto um novo alargamento: a taxa de desconto sobe para 1,25 pontos percentuais (aumentando de quatro para sete euros), o acordo volta a garantir que o desconto aos salários intermédios (entre os 530 euros e os 557 euros) além de alargar o leque de empresas abrangidas por permitir que a redução se aplique a quem pague, além do salário mínimo, trabalho nocturno e suplementar até um vencimento total de 700 euros. É por isso que cobre pelo menos 18,9% dos custos com o aumento do salário mínimo mas que, nalguns casos, pode chegar a superá-los, tal como já aconteceu em 2016.

 

7. Como reagiram os parceiros sociais?
A CCP e a UGT criticaram a decisão do PSD, alegando que desvaloriza a concertação social, o que consideram incoerente com o discurso do maior partido da oposição. A CIP, a CTP e CAP pediram que o Governo encontre uma solução, que sugeriram que pode passar por outras contrapartidas. De acordo com a Lusa, o secretário-geral da CGTP (que não assinou o acordo) considerou a iniciativa do PSD positiva, apesar de também ter apontado incoerências ao principal partido da oposição.

 

8. Que alternativas existem ao desconto da TSU?
Desde pelo menos 2010 que a subida do salário mínimo é acompanhada de um desconto na TSU, apesar das suas diferentes versões. O resultado das discussões dos últimos meses em concertação social – ou pelo menos o que se tornou público – sugere que será difícil desenhar uma medida alternativa que atenue de forma tão directa, rápida e eficaz o aumento do custo do salário mínimo. Mas são as confederações patronais que mais têm a perder se o salário mínimo aumentar sem qualquer contrapartida. Os patrões, que são recebidos esta segunda-feira por António Costa, podem por isso flexibilizar posições para garantir compensações, aceitando outros formatos.


9. A polémica põe em causa o valor do salário mínimo?

Não. O salário mínimo já está promulgado, publicado e em vigor. Por isso, a partir deste mês as empresas estão obrigadas a garantir aos trabalhadores a tempo completo o valor de 557 euros brutos. Independentemente das contrapartidas que venham a ser concretizadas ou não. Juntas, as posições do PSD, do PCP e do Bloco de Esquerda põem em causa a redução da TSU sem comprometerem o segundo aumento consecutivo de 5% no salário mínimo.  


10. Qual é o papel do Presidente da República?

Marcelo Rebelo de Sousa apoiou activamente um acordo em concertação social e é natural que continue a fazê-lo. Quando na quinta-feira foi confrontado com a decisão do PSD, o Presidente da República deu a entender que as posições ainda podem evoluir. "Eu prefiro não comentar cenários. Penso que devemos esperar para ver o que se passa, se há ou não debate parlamentar e qual é a decisão desse debate", afirmou.

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