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Margarida Marques: "Não podemos justificar políticas incómodas com a Europa"
Apresentar políticas incómodas como imposições de Bruxelas traduz um discurso “infelizmente” comum na Europa, mas o Governo português não está a exagerar nesse erro, avalia Margarida Marques.
Durante mais de duas décadas, Margarida Marques trabalhou na Comissão Europeia e, na recta final, representou o Executivo comunitário em Portugal. Por ela passou a estratégia de comunicação de uma instituição central da União Europeia e membro da troika, a quem os partidos com que o PS hoje se alia frequentemente atribuem a causa maior dos males do país.
Alguma vez foi questionada pelos seus pares sobre o europeísmo do Governo, uma vez que depende do apoio de partidos hostis à UE?
Acho que Portugal não é menos europeu por isso, e as políticas europeias não fazem parte do acordo que o Governo estabeleceu com o BE, o PCP e os Verdes.
Mas os parceiros do Governo dizem, por exemplo, que não há mais devolução de rendimentos porque a Europa não deixa, não porque a situação financeira do país seja precária, e o PS não se demarca desse discurso de que "a culpa é da Europa".
Esse é um discurso que infelizmente ouvimos em toda a Europa, que passa por os governos desculparem-se com as exigências da UE, e em Portugal tivemos uma agenda de austeridade que ficou, de facto, ligada às exigências europeias. O que é fundamental perceber é que não há uma via única. Ou seja, há regras para cumprir, e nós cumprimos, há restrições, e nós sabemos quais elas são, mas dentro delas cabe a cada país definir as políticas para atingir os objectivos.
O que não podemos é, em quaisquer circunstâncias, justificar as boas políticas como iniciativas dos governos e as políticas incómodas como imposições de Bruxelas.
Acha que o Governo está a seguir essa linha?
Acho que está a conseguir fazer esse equilíbrio, e a prova é que está a conseguir seguir uma agenda diferente da austeridade que o anterior Executivo nos impôs.
Uma agenda de austeridade diferente…
Não. Este Governo mostrou que é preciso uma agenda diferente. É claro que há restrições, como em qualquer família. Nós temos o Orçamento, as receitas e o crescimento que temos. Mas este Governo toma opções políticas orientadas para a satisfação de condições de vida melhores. Ainda a propósito da cimeira de Atenas, o próprio primeiro-ministro disse claramente que ela servia também para provar que é possível uma agenda diferente à da austeridade.
Portugal está a desacelerar mais do que UE e aqui ao lado, Espanha, que é o nosso maior cliente e fornecedor, há um ano com um governo de gestão, é dos países que mais cresce. Como explica a diferença?
Espanha tem uma economia diferente, sempre foi um país particular, no meio da crise também, chegou a ter 50% de desemprego entre os mais jovens. Hoje, a maior parte dos 28 países da UE está com crescimentos anémicos. Tomara fosse, mas o fraco crescimento português não é excepção.
O anfitrião da cimeira de Atenas, Alexis Tsipras, reclama há muito a reestruturação da dívida, o BE voltou a falar nisso nesta semana. O Governo português vai levantar esta questão em Bruxelas?
A reestruturação da dívida será uma questão europeia e terá de ser colocada ao nível europeu. Não é uma questão que nenhum país deva colocar individualmente. No momento que for oportuno, a UE terá necessariamente de discutir essa questão.
Não foi mencionada nesta cimeira do Sul, em Atenas?
Não me parece...