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Governo pode ditar estado de calamidade no Algarve a partir de junho se seca continuar

Num eventual estado de calamidade no Algarve no segundo semestre de 2024, por causa da seca, o Governo poderá autorizar a Águas do Algarve a usar captações de entidades públicas ou privadas e declarar o estado de emergência ambiental previsto na Lei da Água.

A situação de seca em Espanha é a mais grave desde que há registos.
Albert Gea/Reuters
20 de Fevereiro de 2024 às 10:55
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O Governo publicou esta terça-feira em Diário da República a resolução do Conselho de Ministros que "reconhece a situação de alerta na região do Algarve por motivo de seca e aprova um quadro de medidas de resposta" à falta de água no sul do país, autorizando as diferentes entidades a gastar os montantes já autorizados - num total de mais de 26 milhões de euros - para travar a situação e garantir que há água nas torneiras dos algarvios em 2024 e 2025. 

As medidas de poupança de água decididas pelo Governo devem entrar desde logo em vigor e estarão ativas até "ao final do corrente ano hidrológico, que termina no dia 30 de setembro de 2024". 

A resolução determina que a Agência Portuguesa do Ambiente (APA), a CCDR Algarve e a Comunidade Intermunicipal do Algarve  apresentem ao Governo até 1 de junho de 2024 "um relatório com o ponto de situação sobre a implementação e eficácia das medidas", que deve também "incluir recomendações para o prolongamento das medidas até 31 de dezembro de 2024, bem como medidas adicionais caso não estejam garantidas as reservas mínimas para o serviço de abastecimento público para 2025".

"Não se pode afastar a possibilidade de serem tomadas medidas adicionais mais gravosas, num grau mais elevado de contingência, em resultado de uma reavaliação da situação em junho de 2024 [...] O Governo reserva-se o direito, caso as medidas agora adotadas se revelem insuficientes, de, ao abrigo da Lei de Bases da Proteção Civil, declarar a situação de calamidade", alerta a resolução, explicando que isso permitirá limitar usos de água não essenciais e até racionalizar o abastecimento de água.

Num eventual estado de calamidade no Algarve no segundo semestre de 2024, por causa da seca,o Governo poderá autorizar a Águas do Algarve a usar captações de água de entidades públicas ou privadas e declarar o estado de emergência ambiental previsto na Lei da Água.

Descrevendo a situação na região mais a sul do país como "particularmente crítica", o Governo avisa desde já que se for mantido o mesmo uso de água nos níveis atuais, sem a aplicação de medidas extraordinárias, "o fornecimento de água para consumo humano na região do Algarve ficará severamente comprometido". Ou seja, sem poupança e sem cortes no consumo, vai mesmo faltar água na região, avisa o Executivo, que quer - pelo menos - "garantir as necessidades da época do verão e terminar o ano de 2024 com reservas para 2025".

Neste contexto, foram já anunciados cortes de 15% no setor urbano (incluindo usos domésticos e não domésticos) onde se inclui o setor turístico, cortes de de 25% no setor agrícola e cortes de 18% no setor do golfe. Isto face aos volumes consumidos no período homólogo de 2023.

Desde logo, os algarvios que não cumprirem estes cortes pagarão tarifas adicionais pelo uso excessivo de água. Ou seja, Governo vai criar "uma componente tarifária adicional" que será aplicada a quem ultrapasse um consumo equivalente a 85% do que foi registado em 2023. Esse "excesso" será calculado e cobrado pela Águas do Algarve, enquanto concessionária do sistema multimunicipal de abastecimento de água e saneamento, sendo que as regras serão ainda definidas por despacho do secretário de Estado do Ambiente. O valor desta penalização que surgirá na fatura da água que gaste água demais será usado para financiar medidas de eficiência hídrica e reforço da resiliência dos sistemas de abastecimento público de água na região do Algarve. 

Estas são as medidas que quem vive no Algarve terá de enfrentar 

As famílias passam a ter menos pressão para tomar banho e lavar a louça e não podem lavar o carro com água da rede. Quem consumir pouca água poderá manter os preços da água que são cobrados agora, mas o regulador do setor (ERSAR) está já a falar com os municípios para fazerem aprovar novos tarifários que vão aumentando à medida dos escalões de consumo. 

No abastecimento público, são estas as regras ditadas pelo Governo: 
  1. Redução da pressão de água na rede de abastecimento de água pública em condições operacionais adequadas até aos níveis mínimos essenciais que não afetem a qualidade de serviço;
  2. Suspensão da utilização de água da rede pública ou de água potável extraída de outras origens de água natural para rega de espaços verdes e jardins públicos, com ressalva das exceções necessárias para assegurar sobrevivência de árvores de caráter singular ou monumental;
  3. Proibição da utilização de água da rede pública ou de água potável extraída de outras origens de água natural para rega de jardins e espaços relvados sitos em propriedade privada, com ressalva das exceções necessárias para assegurar sobrevivência de árvores de caráter singular ou monumental;
  4. Utilização de água de origens alternativas, como seja água para reutilização, para a rega de espaços verdes e jardins públicos, bem como de jardins e espaços relvados sitos em propriedade privada, que somente poderá ocorrer em horas de menor radiação solar, entre as 20h00 e as 8h00;
  5. Proibição da utilização de água da rede pública e de água extraída de outras origens de água natural em fontes ornamentais, lagos artificiais e outros elementos de uso estético de água;
  6. Proibição da lavagem de pavimentos, logradouros, paredes e telhados com água da rede pública ou com água extraída de outras origens naturais;
  7. Proibição da utilização de água de rede pública e água extraída de outras origens naturais para compactação de vias rodoviárias (caminhos ou base de estradas) e controlo de poeiras de caminhos em obras públicas ou privadas, sempre que esteja disponível ApR a uma distância inferior a cinco quilómetros;
  8. Utilização de água de origens alternativas para usos não potáveis urbanos, como lavagens de ruas, pavimentos, veículos e equipamentos de entidades públicas e contentores de resíduos urbanos, devendo ser reduzida a periodicidade das lavagens;
  9. Suspensão, entre 1 de junho e 30 de setembro de 2024, da utilização da água da rede pública para lavagem de veículos (ligeiros ou pesados), motociclos, quadriciclos, trotinetes ou similares, exceto se for efetuada em estabelecimentos licenciados para a atividade comercial e que tenham sistemas de recirculação de água ou utilização de esponja e balde fora dos estabelecimentos comerciais;
  10. Suspensão do fornecimento de água da rede pública através de contadores de usos de água que não geram águas residuais (vulgo «contadores de rega»);
  11. Criação ou reforço dos piquetes de emergência para monitorização e reparação de ruturas nas redes de distribuição de água, assegurando a disponibilidade 24 horas por dia, sete dias por semana;
  12. Avaliação e, caso necessário, implementação de soluções complementares extraordinárias para transporte e disponibilização de água para abastecimento público, nomeadamente unidades móveis de dessalinização e transporte de água por diferentes vias;
  13. Revisão das tarifas de abastecimento de água em baixa, para utilizadores domésticos e não-domésticos, bem como para usos que não geram águas residuais, de acordo com as orientações da ERSAR;
  14. Aplicação da recomendação tarifária dos serviços de águas da ERSAR, visando o aumento da eficiência em situação de contingência;
No que diz respeito ao turismo, o Governo quer: 

  1. Implementação de medidas de eficiência hídrica nos empreendimentos turísticos, nomeadamente a instalação de dispositivos para redução de pressão ou recirculação de água;
  2. Suspensão do abastecimento da água da rede pública para rega de campos de golfe;
  3. Redução da rega dos campos de golfe com água natural superficial até uma dotação máxima de 1,3 hm3 (1hm3 Sotavento e 0,3 hm3 Arade);
  4. Redução da taxa de renovação de água das piscinas públicas, sem comprometer a saúde pública;
  5. Encerramento de chuveiros e lava-pés nas zonas balneares, exceto nos casos que utilizam, em exclusivo, água do mar;
  6. Implementação de um selo de eficiência hídrica aplicável aos empreendimentos turísticos, que ateste a efetiva redução do consumo de água e o compromisso das empresas com a implementação de medidas de eficiência hídrica que contribuam para a poupança e gestão sustentável da água
Quanto à agricultura, a resolução do Conselho de Ministros estabelece as seguintes medidas, já amplamente criticadas pelos profissionais do setor: 

  1. Definição, pela Direção-Geral de Agricultura e Desenvolvimento Rural (DGADR), de valores de referência para a rega de sobrevivência para culturas permanentes, no prazo máximo de três meses, para efeitos de, se necessário, rateio por parte dos utilizadores dos perímetros de rega;
  2. Atualização dos planos de contingência nos regadios coletivos para situações de seca, designadamente prevendo a suspensão de inscrição de novas áreas regadas em relação ao ano anterior;
  3. Avaliação e implementação do aproveitamento do volume morto da albufeira do Arade para a rega agrícola;
  4. Controlo dos volumes atribuídos para 2024 nos regadios coletivos, garantindo o cumprimento dos compromissos assumidos na presente resolução;
  5. Autorização de captações subterrâneas requeridas em articulação com a associação de regantes da área do perímetro de rega do Sotavento para rega de sobrevivência, até ao limite máximo de 2,5 hm3/ano, com possibilidade de aumento para 4,5 hm3/ ano desde que salvaguardado o abastecimento para consumo humano;
  6. Autorização de captações subterrâneas requeridas em articulação com a associação de regantes da área do perímetro de rega do Alvor para rega de sobrevivência, até ao limite máximo de 0,5 hm3/ano;
  7. Autorização de uma captação subterrânea coletiva no setor Poente requerida pela associação de regantes da área do perímetro de rega do Alvor para reforço do perímetro do Alvor, para rega de sobrevivência, até ao limite máximo de 0,5 hm3/ano.

O Governo decidiu ainda suspender a atribuição de novos títulos de utilização de recursos hídricos (TURH) relativos a captações nas 22 massas de água subterrâneas da região do Algarve, sendo que os atuais títulos terão também limitações que vão até um total de 50%.

Na barragem da Bravura, a água poderá apenas ser usada abastecimento público, "ficando suspensos temporariamente os  títulos para outros usos". Nesta albufeira e também em Odeleite e Odelouca passará a ser aproveitado também o volume morto das barragens. 

Fundo Ambiental dará "fatia de leão" de 13,3 milhões para combater seca no Algarve


Quanto a apoios financeiros, o Governo atribuiu uma "dotação orçamental indicativa de 26,65 milhões de euros": 12,4 milhões para medidas de abastecimento público de água, 10 milhões para o turismo, 2,9 milhões para a gestão, monitorização e fiscalização dos recursos hídricos e 350 mil euros para a agricultura. Deste valor, 13,3 milhões virão do Fundo Ambiental. 

O Executivo autoriza a APA a gastar em 2024 e 2025 2,9 milhões do Fundo Ambiental para reforçar os sistemas e infraestruturas de monitorização e fiscalização, contratar equipas externas e reforçar meios, realizar intervenções urgentes para garantir as condições de exploração e segurança da barragem do Funcho, elaborar estudos de avaliação das disponibilidades hídricas e de apoio à gestão da seca e para promover campanhas de informação e sensibilização.

Já a Águas do Algarve pode gastar nestes dois anos 10,9 milhões de euros com a construção do sistema de captação do volume morto da barragem de Odelouca, incluindo fiscalização e colocação em serviço; realização de novas captações de águas subterrâneas e a reabilitação de captações públicas estratégicas existentes para reforço do sistema multimunicipal de abastecimento público de água; reforço temporário de equipas, entre outras medidas. 

Por seu lado, os 16 municípios da região receberão já em 2024 1,5 milhões do Fundo Ambiental para controlar fugas de água da rede e reabilitar captações públicas existentes. 

Os 350 mil euros da agricultura serão canalizados para a DGADR ou a Associação de Regantes e Beneficiários de Silves Lagoa e Portimão para reforçar as condições de captação na barragem do Arade.

O apoio extraordinário às empresas do setor do turismo será feito através Turismo de Portugal, "com recurso ao saldo deste instituto, pelo valor global de 10 milhões de euros, para apoio a candidaturas a apresentar pelas empresas do setor do turismo para implementação de medidas de eficiência hídrica", refere a resolução. 

Serão ainda constituídos cinco grupos de trabalho para coordenar a implementação das medidas, sob coordenação geral da APA, Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Algarve e da Comunidade Intermunicipal do Algarve.

a) Agricultura - DGADR e CCDR Algarve

b) Turismo e Golfe - Região do Turismo do Algarve

c) Abastecimento Público - Águas de Portugal e Águas do Algarve

d) Comunicação e sensibilização ambiental - Região de Turismo do Algarve

e) Fiscalização - APA
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