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Virgolino Faneca expõe as entranhas do Orçamento. Pasme-se sff

A elaboração do Orçamento do Estado para 2019 foi dura. Meteu um torneio de bisca dos nove, a prática do Tetris e a extracção do senhor Vítor das Berlengas. É ler para ficar a saber mais. Ou menos.

19 de Outubro de 2018 às 17:00
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Estimado Lourenço

Como bem sabes, o Orçamento do Estado açambarcou uma semana e fez com que Mário Centeno, num só dia (uma segunda-feira), tenha calcorreado oito quilómetros no Ministério das Finanças. É claro que não é uma maratona, mas foi notada, no dia seguinte, a sua presença no sapateiro Frederico, para colocar meias solas, porque a austeridade já se foi, mas a prudência aconselha a moderação dos gastos, não vá o diabo do mercado tecê-las.

Pese embora o ministro Centeno tenha revelado ao Negócios a caminhada dos oito quilómetros, existem ainda muitos segredos que envolvem a elaboração do Orçamento, sendo esta a principal motivação da minha epístola. Por um lado, porque estou em condições de revelar uma mão-cheia dos mesmos, apesar das pressões a que foi sujeito para não o fazer, e, por outro, porque voltei a ser preterido na hora da remodelação governamental, logo agora que sonhava ser ministro sem pasta para ver se me enchia de pasta, circunstância que me accionou o modo vingança.

O que se segue são, pois, descrições que exibem as entranhas deste orçamento, através das quais é possível ter uma visão cristalina do "modus operandi" do Governo. Ei-las, caro Lourenço.

1. No sábado, dia 13, o Governo anunciou, após uma reunião de Conselho de Ministros, que o Orçamento do Estado havia sido aprovado. Na realidade, o dito conselho foi uma distracção, na medida em que na reunião apenas foi decidido que o ministro Centeno teria até à meia-noite de segunda-feira, mais coisa menos coisa, de alinhavar o documento e que todos os outros ministros aceitariam cegamente o que ele tivesse feito, sobretudo os que já sabiam que iam ser demitidos. Na dita cuja de sábado, o que se passou, efectivamente, foi a realização de um torneio de bisca dos nove, uma sugestão de Siza Vieira, que funcionou como uma acção de "team building". A competição disputou-se de forma aguerrida, mas respeitando as regras do jogo (toda a gente fez de conta que não via as renúncias do primeiro-ministro para ele não ficar azedo). No fim, ganhou António Costa (foi a sorte do jogo) e todos cantaram "Não há chefe como o nosso", usando a melodia de "There's no business like show business".

2. O ministro das Finanças (que já não quer ser tratado como o Ronaldo do Eurogrupo derivado dos acontecimentos recentes) passou o fim-de-semana a jogar Tetris com folhas de Excel, empenhando-se a fundo na tarefa e beneficiando de o Benfica não jogar, o que podia ser um factor de distracção. Lá foi pondo números numa coluna, tirando noutra, fazendo as dotações orçamentais dos ministérios com base no signo de cada um dos ministros e usando como base de trabalho as previsões semanais dos horóscopos, os quais, como se sabe, são infalíveis. No final, saíram beneficiados os ministros nativos do Sagitário, tendo-se verificado a coincidência de esse ser o signo de Mário Centeno.

3. Na segunda-feira, chegado à Praça do Comércio, o ministro Centeno chamou os seus secretários de Estado, deu-lhes uma pen contendo os jogos de Tetris e disse-lhes: está aqui o orçamento e amanhem-se que vou fazer uma caminhada nos corredores do ministério porque tive um fim-de-semana muito sedentário e preciso de queimar calorias. Acontece que nenhum dos secretários de Estado mostrou ter conhecimentos suficientes de Excel na óptica do utilizador e o técnico Vítor, que domina a coisa, tinha metido uma arreliadora folga. Foi preciso encetar uma demanda para o encontrar, o que se revelou difícil, dado que o Vítor estava à pesca e não tinha rede. Só depois da hora de almoço foi possível localizá-lo, tendo-se realizado uma extracção do local onde se encontrava, as Berlengas, usando para tal o submarino Tridente. Foi nessa altura que Centeno pediu aos serviços para avisarem Ferro Rodrigues de que o orçamento iria chegar tarde ao Parlamento, pelo que ele podia ir para a casa descansar, até porque já não está com idade para esperas prolongadas e inúteis. O Vítor pegou na pen tarde e o resto da história já é conhecida.

Sei, Lourenço, que te prometi uma mão-cheia de segredos e que tu terás pensado que seriam cinco, mas ando a aprender uns truques com o nosso primeiro, assim do género de vender gato por lebre.

Um abraço telúrico deste teu


Virgolino Faneca
 

Quem é Virgolino Faneca

Virgolino Faneca é filho de peixeiro (Faneca é alcunha e não apelido) e de uma mulher apaixonada pelos segredos da semiótica textual. Tem 48 anos e é licenciado em Filologia pela Universidade de Paris, pequena localidade no Texas, onde Wim Wenders filmou. É um "vasco pulidiano" assumido e baseia as suas análises no azedo sofisma: se é bom, não existe ou nunca deveria ter existido. Dele disse, embora sem o ler, Pacheco Pereira: "É dotado de um pensamento estruturante e uma só opinião sua vale mais do que a obra completa de Nuno Rogeiro". É presença constante nos "Prós e Contras" da RTP1. Fica na última fila para lhe ser mais fácil ir à rua fumar e meditar. Sobre o quê? Boa pergunta, a que nem o próprio sabe responder. Só sabe que os seus escritos vão mudar a política em Portugal. Provavelmente para o rés-do-chão esquerdo, onde vive a menina Clotilde, a sua grande paixão. O seu propósito é informar epistolarmente familiares, amigos, emigrantes, imigrantes, desconhecidos e extraterrestres, do que se passa em Portugal e no mundo. Coisa pouca, portanto.

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