Opinião
Czares portugueses
No dia em que contratava numa multinacional o gestor para liderar a Galp por mais três anos, estava o Governo a dizer simplesmente que era ele próprio quem não pretendia abandonar o comando da empresa.
Manuel Pinho ambicionava, assim, ser o novo «czar da economia portuguesa», como lhe chamava ontem no Jornal de Negócios Online um dos leitores que comentam estes textos com assiduidade e usa o nome de código «Ariosto».
Czares têm sido os sucessivos ministros da Economia. E, como já vamos em sete nos últimos dez anos, o defeito não pode estar na pessoa. Deve ser problema do cargo, uma inutilidade que o ocupante se vê obrigado a justificar, da pior forma possível, porque se enfia em atalhos que não são os seus.
Esta longa novela da Galp, que já tinha revelado tudo o que de pior se encontra numa economia czarista, atingiu os limites do ridículo nos episódios conhecidos nos últimos dias.
O ministro da Economia adquiriu um importante capital político quando anunciou o seu anti-plano para o sector energético. Cada empresa que determine o seu destino - era o princípio de liberdade que o Governo defendia.
Estavamos, portanto, no domínio onde o futuro das empresas deve ser determinado: os seus accionistas. A Galp, tal como a EDP, têm maioria de capital privado. Adivinhava-se, portanto, um diálogo entre eles.
E não estava sozinho quem pensava assim. Pedro Queiroz Pereira confiou no seu amigo de infância e, como qualquer bom empresário, empenhou-se: falou com italianos, falou com investidores portugueses, falou com investidores estrangeiros, tinha, enfim, uma solução nacional. Ou, pelo menos, o início de um caminho.
Era um caminho que implicava a saída total do Estado da empresa. A resposta que obteve do Governo, do ministro, foi o silêncio absoluto. E porquê? Porque vingava a tese peregrina da pulverização.
O «czar» Pinho queria a ENI fora da empresa e não lhe bastava ter um empresário português a liderar um grupo capaz de tomar conta da situação. Não. O plano era «pulverizar». Vários pequeninos a comprar um terço da empresa às fatias.
Enquanto isso, andava alguém a trazer argelinos, russos, brasileiros, numa ciranda improvisada, lançando administradores da Galp para reuniões não preparadas, tentando convencer metade do planeta Terra a comprar algo que não nos pertencia.
Aliás, nem Américo Amorim, com um cheque assinado, podia comprar tudo. Só um bocadinho. O bocadinho que o senhor ministro decidia e a um preço impossível de negociar. E era realmente impossível, porque, como provam as declarações do senhor Scaroni, o todo-poderoso chefe da ENI, a saída dos italianos nunca esteve em negociação.
A atitude do Governo na Galp não é incompreensível, porque há muitos governos que deixámos de compreender. Não é imperdoável, porque ninguém é redentor. Nem é inqualificável, porque é surrealista. Ou seja, a Galp ministerialmente ideal nasce e morre na única cabeça que a gerou.