Opinião
Trump já ganhou. A dobrar
Donald Trump pode até perder as eleições presidenciais norte-americanas, mas lamentavelmente já ganhou. A dobrar. Ganhou a nível pessoal e no plano dos valores que representa.
A nível pessoal ganhou porque a marca Trump sai valorizada deste embate político. O candidato republicano, aliás, conhece de há muito a importância da notoriedade pública. Tomou-lhe o gosto com o seu divórcio de Ivana, um festim para as publicações de bisbilhotice que ele foi alimentando com desvelo.
Foi graças a esse lastro que consolidou mediaticamente o seu apelido e conseguiu evitar a bancarrota, fazendo dele um activo que negociou com os credores. Posteriormente foi o "reality show", "The Apprentice", que lhe conferiu uma aura de homem de negócios bem sucedido - o contrário da sua história enquanto empresário - quando no fundo a sua matriz é a de um vendedor exímio.
Para Trump, não existe boa uma má publicidade. O que importa é que falem dele. Por isso, a sua natureza controversa garante-lhe com muita frequência um lugar no centro das atenções, um bem valioso, ao qual a sua candidatura presidencial oferecerá uma generosa longevidade e a respectiva rentabilidade financeira.
O outro plano, o dos valores que representa, é bem mais sinistro. Trump mente, é autoritário, humilha minorias e joga com o medo para acicatar ódios. Pertence a uma linhagem que vem fazendo o seu percurso na Europa, com Le Pen em França e Putin na Rússia. Não por acaso, Trump é apoiado pela maioria dos órgãos de comunicação social que o apresentam como um lutador anti-sistema, sistema este que é protagonizado por Hillary Clinton.
Os valores que Trump representa ganharam adeptos, porque os políticos se distanciaram dos eleitores e se fizeram reféns de lóbis variados. A democracia tem vindo a tornar-se cada vez mais pobre e isso aumentou o distanciamento dos cidadãos, que se transformaram em meros espectadores desta realidade, abdicando progressivamente do seu poder reivindicativo. A popularidade de Trump é um alerta vermelho e um mal que só pode ser combatido com a regeneração do sistema político.
É por isso que o fenómeno Trump, mesmo derrotado nas urnas, não pode ser menosprezado e muito menos esquecido. Porque os valores que ele representa e arregimentam cada vez mais adeptos são um risco para a democracia.