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Estranha forma de Justiça

Bank of America Merrill Lynch (BofA) aceitou pagar a soma recorde de 16,65 mil milhões de dólares para não ser julgado pela venda ilegal de títulos indexados ao créditos à habitação.

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Bank of America Merrill Lynch (BofA) aceitou pagar a soma recorde de 16,65 mil milhões de dólares para não ser julgado pela venda ilegal de títulos indexados ao créditos à habitação. O número impressiona. Mas também ilude.


Os processos do Departamento de Justiça dos EUA contra a banca acabam invariavelmente num acordo em que a instituição financeira aceita passar um cheque com dez ou onze algarismos, ficando livre da acusação. As instituições financeiras já pagaram 37 mil milhões de dólares (o equivalente a 28 mil milhões de euros) só em casos relacionados com a comercialização e titularização de hipotecas durante o período anterior a 2008, quando rebentou a crise do "subprime". As contas são do New York Times.


Um dos riscos desta abordagem é a banalização destes custos legais, tornando-os em mais uma linha dos custos operacionais, como alerta Matt Levine, num artigo da Bloomberg. Não foi à toa que o segundo maior banco americano escolheu um jurista, Brian Moynihan, para o lugar de CEO em 2010. Desde esse ano que o BofA enfrenta sucessivos processos legais, uma herança das aquisições da Countrywide e da Merrill Lynch em 2008.


O acordo judicial significa também que o banco não pode voltar a ser processado sobre as mesmas práticas que constavam do processo. O que significa que acaba também por não ser apurada a responsabilidade individual pelos actos cometidos. Em suma, ninguém vai preso.


Outro ponto polémico destes acordos é a possibilidade de parte do valor poder ser usado para abater aos impostos. A associação de defesa dos consumidores US Public Interest Research Group afirma num comunicado divulgado no seu "site" que "os contribuintes vão suportar entre 4,0 a 5,8 mil milhões de dólares" com o acordo negociado com o BofA.


Uma virtude do acordo é que parte da soma - sete mil milhões - será usado para abater à dívida no crédito à habitação de famílias em dificuldades financeiras. Impacto que o banco poderá minorar pelo facto de parte das hipotecas abrangidas terem sido já vendidas.


É verdade que os lucros do BofA no trimestre poderão estar comprometidos pelo montante da indemnização. E que isso significa menos bónus para a gestão e menos dividendos para os accionistas. Há uma punição. É muito mais do que o que vemos acontecer em Portugal, onde este tipo de delitos quase sempre prescrevem. Mas será suficientemente dissuasor? Fica a sensação de que, no fundo, a Justiça tem um preço. Basta pagar o suficiente para que ela não seja feita na sua plenitude. 

 

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