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29 de Novembro de 2017 às 23:00

Belmiro e a elite

A possibilidade de uma elite que não nasce, vive e sobrevive à sombra do Estado é um dos maiores legados que Belmiro nos deixa.

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Belmiro de Azevedo foi seguramente o empresário português mais importante do pós-25 de Abril. Pela obra que construiu, quase do zero, e que hoje atravessa sectores tão diferentes como o retalho, as telecomunicações, o turismo ou a comunicação social, e se espalha por 70 países. Pelo impacto que teve na gestão em Portugal.

A morte presta-se a consensos e ao endeusamento. Belmiro de Azevedo criou o "Homem Sonae", mas como qualquer homem o seu percurso não foi impoluto. A forma como capturou a Sonae da família Pinto de Magalhães foi polémica e arrastou-se nos tribunais, ainda que hoje seja inquestionável que foi Belmiro quem fez do grupo o que ele é. Em Portugal, ninguém como ele soube usar a bolsa para financiar os seus negócios, não sem provocar dissabores a muitos accionistas inexperientes. A cultura de exigência do grupo desafiou por vezes a fronteira do abuso. Teve desaires nos negócios, o Brasil foi o maior deles.

Nada disso impede que a sua seja uma biografia inspiradora. Bem pelo contrário. A sua origem humilde, o trabalho e o mérito nos estudos, o espírito empreendedor, a imensa dedicação, a frugalidade, o pensamento livre e incómodo para os poderes públicos. Dava tudo um cancioneiro.

É quase impossível sair à rua em Portugal e não dar de caras com uma das muitas marcas que da sede da Sonae no Porto chegaram a todo o país. Mas há outra herança, intangível, mas de igual valor: o impacto na gestão.

O Homem Sonae é um homem de valores. Essa ficará como uma das suas marcas: a importância dos valores dentro de uma organização, aquilo a que chamava um "cimento" da Sonae e foi uma chave do sucesso do grupo.

Entre esses valores estava, desde cedo, a preocupação constante com a valorização individual, com a formação. Aquilo que hoje é um lugar-comum, consagrado na legislação laboral, era há várias décadas um princípio no grupo Sonae.


Numa sociedade habituada à cunha, a Sonae impôs a lei do mérito. O facto de até os filhos terem tido de provar as suas capacidades para herdar o leme ficará na lenda.


A 25 de Maio de 1985 escreveu, num texto sobre a "Cultura Sonae", que "uma elite de dirigentes modernos tem de o ser por mérito, por reconhecimento dos subordinados, dos superiores, dos pares, da comunidade em que se insere. As elites verdadeiras não têm privilégios. Privilégio está conotado com favoritismo, nepotismo, favores de heranças, etc.".


A possibilidade de uma elite que não nasce, vive e sobrevive à sombra do Estado é um dos maiores legados que Belmiro nos deixa

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