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06 de Maio de 2014 às 15:14

Os riscos das histórias para a economia mundial

As flutuações nas economias mundiais são influenciadas, em larga medida, pelas histórias que ouvimos e contamos sobre elas. Essas narrativas populares e emocionalmente relevantes levam-nos, muitas vezes, a sair e a gastar, a criar empresas, a construir novas fábricas e edifícios de escritórios, a contratar funcionários; noutros momentos, levam-nos a ter medo e a permanecer quietos, a poupar os nossos recursos, a reduzir os gastos e o risco. Tanto estimulam o nosso "espírito animal" como o abafam.

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De visita ao Japão, fico impressionado com o impacto positivo que as histórias relacionadas com a economia têm sobre o pensamento e o comportamento das pessoas, e com a fragilidade que envolve essas mudanças. Desde que o primeiro-ministro Shinzo Abe assumiu o cargo, em Dezembro de 2012, e lançou o seu programa de estímulo monetário e fiscal e de reformas estruturais, os efeitos sobre a confiança dos japoneses foram profundos. De acordo com o Fundo Monetário Internacional, a diferença entre o PIB real e potencial diminuiu de -3,6% em 2011 para -0,9% em 2013.

 

No resto do mundo não existe uma narrativa tão abrangente e de fácil compreensão acerca das mudanças positivas, como a que envolve o "Abenomics". A diferença entre o PIB real e potencial da maioria das economias avançadas continua a ser decepcionante, situando-se em

-3,2%, em 2013, quando em 2009, o pior ano da crise financeira global, a diferença era de -5,3%.

 

Parece que estamos à mercê das nossas narrativas. Desde 2009, a maioria das pessoas só está à espera de alguma história capaz de encher os nossos corações com esperança e confiança - e revigorar as nossas economias.

 

Pensemos na história do "boom" imobiliário nos Estados Unidos e em outros países, na primeira metade da década de 2000. Foi a história, não de uma "bolha" mas do triunfo do empreendimento capitalista num novo milénio.

 

Essas histórias foram muito poderosas porque um enorme número de pessoas estava psicologicamente - e financeiramente – envolvido nelas. A maioria das famílias possuía uma casa, pelo que estava, automaticamente, a participar no "boom". E muitos proprietários, ansiosos para participar ainda mais nesse "boom" e sentirem-se capitalistas experientes, compraram casas mais caras do que normalmente fariam.

 

Com o fim abrupto do crescimento em 2006, essa história de aumento de ego também acabou. Afinal de contas, não erámos todos génios do investimento. Era só uma bolha, aprendemos nós. A nossa confiança em nós mesmos e no nosso futuro levou um rombo, desencorajando a tomada de riscos.

 

Em seguida, eclodiu a crise financeira, o que assustou o mundo inteiro. A história que era de oportunidades e riqueza transformou-se numa história de credores hipotecários corruptos, instituições financeiras superalavancadas, especialistas ignorantes e reguladores inertes. A economia estava a cambalear como um navio sem leme, e os operadores perspicazes que nos levaram a entrar a bordo – digamos, 1% - estavam a escapar nos poucos botes salva-vidas existentes.

 

No início de 2009, a queda dos mercados de acções em todo o mundo atingiu o seu ponto mais crítico, e o medo de uma depressão profunda, de acordo com o índice que mede o sentimento

Com o fim abrupto do crescimento em 2006, essa história de aumento de ego também acabou. Afinal de contas, não erámos todos génios do investimento. Era só uma bolha, aprendemos nós. A nossa confiança em nós mesmos e no nosso futuro levou um rombo, desencorajando a tomada de riscos. 
 

económico dos consumidores, da Universidade do Michigan, estava no nível mais alto desde a segunda crise do petróleo no início da década de 1980. As histórias da Grande Depressão da década de 30 emergiram das nossas memórias mais profundas - ou das memórias dos nossos pais e avós - e foram recontadas.

 

Para entender porque a recuperação económica (e se não mesmo a do mercado de acções) se manteve tão fraca desde 2009, precisamos identificar quais as histórias que têm vindo a afectar a psicologia popular. Um exemplo é a rápida evolução dos smartphones e tablets. O iPhone da Apple foi lançado em 2007, e os telemóveis com Android do Google, em 2008, na altura do começo da crise, mas grande parte do seu crescimento tem-se registado desde então. O iPad da Apple foi lançado em 2010. Desde então, esses produtos entraram na consciência de quase todos; vemos as pessoas a usá-los em toda parte - na rua e em lobbies de hotéis, nos restaurantes e nos aeroportos.

 

Esta deveria ser uma história de aumento da confiança: tecnologias surpreendentes estão a surgir, as vendas estão a crescer, e o empreendedorismo está vivo e de boa saúde. Mas o efeito de confiança que se viveu no início do "boom" imobiliário foi muito mais poderoso, porque atingia directamente muito mais pessoas. Desta vez, a história do smartphone/tablet está associada a uma sensação de mau agouro, porque a riqueza que esses dispositivos geram parece estar concentrada num pequeno número de empresários de tecnologias que, provavelmente, vivem num qualquer país distante.

 

Essas histórias despertam os nossos medos de sermos ultrapassados por outros na escala económica. E, agora que os nossos telefones falam connosco, (a Apple lançou, em 2010, o Siri, a voz artificial que responde às nossas perguntas nos iPhones) alimentam os nossos receios de que cheguem um dia a substituir-nos, da mesma forma que ondas anteriores de automação tornaram obsoleto tanto capital humano.

 

Tive o prazer de me encontrar com Abe nesta viagem. Ele é fiel ao guião e conta uma história sobre executar acções agressivas e definitivas contra um mal-estar económico que tem atormentado o Japão nas últimas décadas. Ele inspira confiança; eu senti-o imediatamente.

 

Diz-se também que Abe revive o patriotismo nacional, e até mesmo o nacionalismo. Ainda que não me tenha dito nada nesse sentido, creio que poderá ser, realmente, uma parte importante da sua história. No fim de contas, o nacionalismo está intrinsecamente ligado com a identidade individual. Cria uma história para cada membro da nação, uma história sobre o que ele ou ela pode fazer como parte de um país bem-sucedido. Algumas das acções mais controversas de Abe, como a visita ao Santuário Yasukuni, apesar das objecções chinesas e coreanas, apenas aumentam o impacto da história.

 

Ainda assim, não é fácil para os líderes nacionais, mesmo para aqueles com o talento de Abe, gerir essas histórias, tal como é difícil para os produtores de cinema fazerem, de todas as vezes, um êxito de bilheteira. Nenhum líder consegue moldar constantemente as narrativas que afectam a economia. Mas não quer dizer que não precisem de tentar.

 

Robert J. Shiller, prémio Nobel da Economia e professor de Economia na Universidade de Yale, é coautor, juntamente com George Akerlof, de "Animal Spirits: How Human Psychology Drives the Economy and Why It Matters for Global Capitalism".

 

Direitos de Autor: Project Syndicate, 2014.

www.project-syndicate.org

Tradução: Rita Faria

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