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Michael Boskin - Economista 28 de Agosto de 2018 às 14:00

A economia dos EUA e as eleições intercalares

Depois das eleições de Novembro, a forte economia dos EUA pode ser ameaçada por uma escalada da guerra comercial ou pelo espectro de impostos mais altos.

A economia dos EUA está a crescer, a inflação atingiu finalmente a meta de 2% da Reserva Federal dos EUA e o desemprego é bastante baixo – o mais baixo de sempre para afro-americanos e hispânicos. Pela primeira vez desde que há memória, há mais vagas de emprego nas empresas americanas do que pessoas desempregadas. Estas condições costumam prenunciar um aumento dos salários reais (ajustados à inflação), o que indicaria que os trabalhadores americanos, muitos dos quais deixados para trás na recuperação anémica do pós-crise, podem finalmente colher os frutos do forte crescimento da economia.

 

Os modelos eleitorais prevêem que uma economia forte favorece o partido no poder, e que uma economia fraca o condena a perdas esmagadoras. Apesar disso, com a economia no seu melhor estado em mais de uma década, a maioria das sondagens aponta para uma liderança substancial do Partido Democrata na corrida para as eleições intercalares de 2018, que decorrerão em Novembro. Além disso, a maioria dos analistas políticos prevê que os democratas retomarão o controlo da Câmara dos Representantes. E alguns até antecipam uma "onda azul" na qual os democratas também recuperam o Senado, apesar de terem de defender muito mais assentos do que os republicanos. Em várias eleições especiais nos últimos tempos, os republicanos tiveram margens muito mais estreitas do que em eleições anteriores para os mesmos assentos no Congresso.

 

Há várias explicações plausíveis para esta anomalia. Para começar, os especialistas das sondagens  e os analistas podem simplesmente estar errados, como muitos estavam nas eleições de 2016. Ao mesmo tempo, o presidente Donald Trump pode estar a prejudicar as suas perspectivas eleitorais e do seu partido, especialmente entre as mulheres dos subúrbios, lançando ataques pessoais contra aqueles que o criticam - incluindo a popular estrela do basquetebol LeBron James. E é possível que, apesar do seu elevado nível de aprovação na condução da economia, muitos eleitores não atribuam a força da economia às políticas de Trump.

 

Outra possibilidade é a de o "efeito económico" nas eleições não se aplicar mais. Enquanto as dificuldades económicas podem prejudicar o partido que está no poder, a força económica pode não ajudar tanto como no passado. À medida que os eleitores se tornam mais ricos, mais pessoas se podem dar ao luxo de se concentrarem noutras questões.

 

Nas eleições primárias do Partido Democrata para o 14º distrito de Nova Iorque, no início deste ano, a social-democrata Alexandria Ocasio-Cortez derrotou o representante Joseph Crowley. Demasiado confiante, Crowley mal fez campanha. Desde então, Ocasio-Cortez tornou-se a menina querida dos media, aparecendo ao lado do senador de Vermont, Bernie Sanders, que perdeu por pouco a nomeação presidencial democrata em 2016. Embora grande parte da energia entre os democratas esteja na extrema-esquerda, o partido fez questão de seleccionar candidatos com hipóteses reais de ganhar em Novembro.

 

Ao mesmo tempo, nas primárias republicanas, os candidatos apoiados por Trump, ou estreitamente alinhados com ele, tenderam a prevalecer. Mas, actualmente, os republicanos não têm tanto entusiasmo como os democratas, o que pode afectar a participação dos apoiantes do partido em Novembro.

As eleições intercalares são quase sempre um referendo sobre o presidente e as suas políticas. Nas eleições intercalares de 2010 e 2014, as maiorias republicanas fortes foram vistas como uma rejeição ao presidente Barack Obama. Consequentemente, os democratas vêm enquadrando as intercalares como um referendo sobre Trump. Ao mesmo tempo, os republicanos tentaram centrar as intercalares em Nancy Pelosi, a liberal líder da minoria da Câmara dos Representantes, que provavelmente regressaria como porta-voz, se os democratas ganhassem uma maioria na Câmara. O problema é que uma potencial porta-voz é um alvo mais difícil de atingir do que um presidente em exercício, ainda mais alguém tão persuasivo nos media como Trump.

 

Por agora, está a ser dada atenção ao potencial papel da economia nas eleições. Mas depois das eleições, os resultados afectarão, por sua vez, as políticas económicas e, portanto, as perspectivas económicas. Se os republicanos mantiverem a Câmara e o Senado, as reformas fiscais e regulatórias pró-crescimento promulgadas até agora serão sustentadas e talvez até expandidas. Da mesma forma, se mantiverem o Senado, os juízes federais conservadores continuarão a ser confirmados.

 

Pelo contrário, uma maioria democrata na Câmara dos Representantes irá previsivelmente bloquear as propostas legislativas de Trump; e uma maioria democrata no Senado bloqueará nomeações judiciais conservadoras. Embora governos divididos às vezes produzam compromissos políticos e governem uma economia forte, é difícil imaginar isso a acontecer se os democratas recuperarem uma ou ambas as câmaras do Congresso.

 

Afinal, até democratas supostamente moderados inclinaram-se mais para a esquerda para afastar os adversários socialistas. E mais democratas estão a juntar-se em torno de uma agenda de aumentos expressivos dos gastos do governo e impostos mais altos (embora ainda não tenham falado muito sobre este último ponto).

 

Uma sondagem da Gallup apontou recentemente que há uma percentagem maior de democratas receptíveis ao socialismo do que ao capitalismo. Por isso, a maioria dos democratas que se está a virar à esquerda está a propor um seguro de saúde universal ("Medicare for all"), universidade gratuita e uma garantia de emprego ou rendimento básico.

 

É claro que a promulgação dessa agenda exigiria um presidente democrata e maiorias em ambas as câmaras do Congresso. E, mesmo assim, custaria dezenas de biliões de dólares. Pagar este programa exigiria um grande imposto sobre o valor acrescentado (IVA) ao estilo europeu ou um imposto sobre os rendimentos muito mais alto, o que provavelmente conduziria a uma estagnação económica ao estilo europeu.

 

Pela sua parte, os republicanos estão divididos entre conservadores tradicionais defensores do livre comércio e "nacionalistas económicos" trumpianos que querem restringir a imigração e o comércio.

Assim, depois das eleições de Novembro, a forte economia dos EUA pode ser ameaçada por uma escalada da guerra comercial ou pelo espectro de impostos mais altos. Com o crescimento a desacelerar na China, na Europa e noutros lugares, a economia global precisará que a América evite esses erros políticos perigosos.

 

Michael J. Boskin é professor de Economia na Universidade de Stanford e membro sénior da Hoover Institution. Foi chairman do conselho de assessores económicos de George H. W. Bush de 1989 a 1993.

 

Copyright: Project Syndicate, 2018.
www.project-syndicate.org
Tradução: Rita Faria

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