Outros sites Medialivre
Notícias em Destaque
Opinião

Envelhecimento global e solvência orçamental

Embora não seja possível prever o que um futuro Congresso fará, acho difícil acreditar que a maioria votaria em reduzir o nível de benefícios em 21% ou em aumentar o nível do imposto sobre os salários pago por todos os empregadores e todos os empregados em 26%

Os programas dos governos para apoiar os pensionistas estão com problemas em todos os países, devido ao aumento da esperança média de vida e à crescente proporção de reformados em relação aos contribuintes. O problema vai piorar nos próximos anos, à medida que a tendência demográfica adversa aumentar o fardo dos contribuintes com o financiamento das pensões e cuidados de saúde.

 

O problema é diferente nos Estados Unidos, porque o sistema de "fundo fiduciário" dos Estados Unidos para financiar a Segurança Social criará uma crise quando o fundo se esgotar. Ainda que as opções nessa altura vão ser diferentes das escolhas enfrentadas por outros governos, as políticas para evitar a crise dos EUA são relevantes para outros países que enfrentam o envelhecimento da população.

 

Aqui está como funciona o sistema dos EUA: por lei, um imposto sobre o salário é dedicado exclusivamente ao financiamento de benefícios para aposentados. Empregadores e funcionários pagam 6,2% dos seus ganhos até um máximo individual de 128.000 dólares, um valor que aumenta anualmente com os salários médios. Esses fundos são depositados no Fundo Fiduciário da Segurança Social e investidos em obrigações do governo.

 

As pessoas têm direito aos benefícios de reforma aos 67 anos com base nos seus pagamentos de impostos sobre o salário, com a opção de receber benefícios actuarialmente reduzidos a partir dos 62 anos ou esperar até aos 72 anos para um aumento actuarial. Os benefícios anuais são ajustados aos rendimentos médios ao longo da vida de um indivíduo, de acordo com um calendário que faz com que o rácio de benefícios de rendimentos passados ??diminua à medida que esses rendimentos aumentam.

 

Devido ao envelhecimento da população, o nível total de benefícios está a aumentar mais rapidamente do que os impostos arrecadados. Em 2010, a receita fiscal total da Segurança Social foi de 545 mil milhões de dólares e os pagamentos de benefícios totalizaram 577 mil milhões. Como os juros sobre as obrigações anteriormente acumulados eram de 108 mil milhões, o tamanho total do fundo fiduciário aumentou em 76 mil milhões de dólares. Seis anos depois, em 2016, a receita fiscal foi de 679 mil milhões de dólares e os benefícios foram de até 769 mil milhões. O défice resultante foi de 90 mil milhões, um montante quase igual aos juros daquele ano, o que deixou o tamanho do fundo fiduciário praticamente inalterado.

 

Desde 2016, os pagamentos de benefícios excederam a combinação dos fundos e juros, fazendo com que o saldo do fundo fiduciário diminuísse. Olhando para o futuro, a Administração da Segurança Social estima que o declínio anual do fundo fiduciário continuará até que o saldo seja zero em 2034. Nesse momento, o fundo fiduciário não terá mais receita de juros. Como os benefícios só podem ser pagos pelo fundo fiduciário, terão que ser reduzidos ao valor dos impostos recebidos naquele ano.

 

Se o Congresso não mudar a lei, a Segurança Social estima que os benefícios teriam que ser reduzidos imediatamente em 2034 em 21%. Alternativamente, para evitar essa redução de 21%, o imposto teria que aumentar em 26,5%, de uma combinação de 12,4% para quase 16%.

Embora não seja possível prever o que um futuro Congresso fará, acho difícil acreditar que a maioria votaria em reduzir o nível de benefícios em 21% ou em aumentar o nível do imposto sobre os salários pago por todos os empregadores e todos os empregados em 26%

 

A alternativa mais provável seria usar a receita do imposto geral sobre os rendimentos para manter o nível dos benefícios. Isso exigiria um aumento nas taxas do imposto de cerca de 10%. Essa estratégia deslocaria o ónus do programa de Segurança Social para as famílias de rendimentos mais elevados, que pagam a maior parte do imposto sobre os rendimentos. Isso pode explicar porque é que os políticos de centro-esquerda não estão a tentar evitar a futura crise da Segurança Social.

 

A crise de 2034 poderia ser evitada com o aumento da idade normal da reforma, como fizeram os EUA em 1983. Naquela época, com as finanças da Segurança Social em apuros, o Congresso concordou em elevar gradualmente a idade da reforma dos 65 para os 67 anos. Desde então, a esperança de vida de alguém nessa idade aumentou em três anos. O Congresso poderia agora votar para aumentar gradualmente a idade da reforma em mais três anos, dos 67 para os 70. Como a esperança média de vida aos 67 anos é de 17 anos, um aumento de três anos na idade para os benefícios totais seria uma redução de 17% nos benefícios vitalícios, quase o suficiente para compensar o défice que resulta da descida da receita. Seria ainda melhor ajustar a idade da reforma todos os anos de forma a reflectir o aumento actuarial da esperança de vida.

 

Uma estratégia alternativa para lidar com o aumento do custo dos benefícios de reforma seria afastarmo-nos de um sistema "pay-as-you-go" (PAYG) puro, acrescentando uma componente baseada em investimentos. Em vez de investir a receita do imposto sobre os salários de 12,4% em títulos do governo, uma parcela significativa poderia ser investida numa carteira de acções, como fazem os sistemas corporativos. O fundo fiduciário cresceria mais rapidamente e seria evitada uma crise.

 

Embora o sistema de fundo fiduciário nos EUA crie a perspectiva de uma crise quando o fundo se esgotar, os remédios para evitar esse resultado ajudariam outros países que têm agora um sistema PAYG - aumentar a idade para os benefícios totais ou combinar o sistema existente com financiamento por capital. Quanto mais cedo essas mudanças forem feitas, mais viável será a situação orçamental e mais confiáveis os benefícios futuros.

 

Martin Feldstein, professor de Economia na Universidade de Harvard e presidente emérito do Departamento Nacional de Investigação Económica, presidiu ao Conselho de Assessores Económicos do Presidente Ronald Reagan de 1982 a 1984.

 

Copyright: Project Syndicate, 2018.
www.project-syndicate.org
Tradução: Rita Faria

Ver comentários
Mais artigos do Autor
Ver mais
Outras Notícias
Publicidade
C•Studio