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Compreender o populismo na Europa de Leste

Com os partidos populistas a assegurarem actualmente pelo menos 20% do eleitorado em 10 países da Europa de Leste, incluindo mais de 40% na Polónia e na Hungria, há questões difíceis à espreita.

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Em 2016, o referendo no Reino Unido para a saída do país da União Europeia (Brexit), a par com a eleição do presidente Donald Trump nos Estados Unidos, criou a impressão de que o populismo ao estilo da Europa de Leste estava a dominar o Ocidente.

 

Mas essa analogia errou o alvo. Com efeito, somente no leste pós-comunista da Europa é que os populistas têm batido rotineiramente os partidos tradicionais nas eleições. De 15 países da Europa de Leste, os partidos populistas detêm o poder em sete deles, integram a coligação no poder em mais dois deles e são a principal força de oposição noutros três. No Ocidente não há partidos populistas no poder, apenas em coligação na Áustria e na Suíça.

 

E o populismo na Europa de Leste é diferente do populismo na Europa Ocidental, sob vários aspectos importantes.

 

Para começar, a Europa de Leste não tem a tradição de separação e equilíbrio de poderes que tem salvaguardado as democracias do Ocidente. Nos Estados Unidos, Donald Trump não pode ignorar as decisões judiciais que não lhe agradam, nem simplesmente assumir o controlo dos tribunais. Os líderes na Polónia e na Hungria podem e fazem-no sem qualquer hesitação.

 

Além disso, ao passo que as democracias ocidentais ultrapassaram as preocupações em torno da segurança física para abraçarem aquilo a que o sociólogo Ronald Inglehart chama de "valores pós-materialistas", as políticas da Europa de Leste são mais vulneráveis aos ataques a instituições liberais abstractas, como a liberdade de expressão ou a independência judicial.

 

Isto não deve causar grande surpresa. Afinal de contas, o liberalismo na Europa de Leste é uma importação do Ocidente. Apesar dos fenómenos Brexit e Trump, o Reino Unido e os Estados Unidos têm culturas profundamente enraizadas de liberalismo político e social.

 

E a sociedade civil na Europa de Leste não só é mais débil do que no Ocidente como também está mais focalizada em áreas como a caridade, religião e lazer do que questões sociais ou políticas.

 

Por último, o sucesso dos populistas da Europa de Leste está enraizado não só nas preocupações económicas de eleitores frustrados, como parece acontecer na Europa Ocidental, como também na necessidade do eleitorado de se organizar em torno da narrativa de um líder.

 

Para os eleitores da classe popular, o populismo satisfaz o desejo de sentido de comunidade. Para os eleitores da classe média, um líder ajuda a que se definam como estando em oposição aos que recebem o estigma de inferiores – sejam eles refugiados, elites embrutecidas ou juízes.

 

Com os partidos populistas a assegurarem actualmente pelo menos 20% do eleitorado em 10 países da Europa de Leste, incluindo mais de 40% na Polónia e na Hungria, há questões difíceis à espreita.

 

Se a política na Polónia ou na Hungria revelar ser mais semelhante à política da Rússia do que à política de França, será que as fronteiras da União Europeia estão demasiado alargadas? Será que estes países deveriam estar associados à Rússia e não à Europa Ocidental? Poderá a própria União Europeia ser impossível de manter? Espero que não.

 

Não há respostas fáceis e só os próprios europeus do Leste podem responder a estas perguntas.

 

Slawomir Sierakowski, fundador do movimento Krytyka Polityczna [Crítica Política], é director do Instituto de Estudos Avançados em Varsóvia.

 

Direitos de autor: Project Syndicate, 2018.
www.project-syndicate.org

Tradução: Carla Pedro

 

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