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17 de Novembro de 2013 às 18:54

A segurança do Japão

O segundo mandato de Shinzo Abe como primeiro-ministro do Japão começa com o foco na revitalização económica do país. Esta política, apelidada de imediato de “Abenomics”, incluiu o que é chamado de três “setas”: uma política monetária audaciosa, uma postura orçamental expansionista e reformas estruturais para estimular o investimento privado. Sendo Tóquio anfitrião dos Jogos Olímpicos de 2020, uma quarta seta surgiu e abanou as infra-estruturas de investimento e as receitas do turismo nos anos que antecedem os Jogos.

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Para ser clara, depois de 15 anos de recessão deflacionista, a revitalização da economia japonesa continua longe de estar terminada. Ainda assim, os efeitos das reformas de Shinzo Abe começam a ser visíveis em áreas como o preço das acções e as taxas de câmbio.

 

Contudo, as reformas de Shinzo Abe podem representar uma ameaça ao ambiente de segurança que se vive na Ásia, continente que está numa situação tão frágil como a economia japonesa antes de este Governo chegar ao poder. De facto, o primeiro-ministro enfrenta agora muitas das questões com que se deparou no seu primeiro mandato, há sete anos. Os seus esforços foram interrompidos pela sua resignação e Shinzo Abe está agora a fazer a segunda tentativa para estabelecer um sistema de governação de segurança nacional que responda às necessidades do Japão – e dos seus aliados – do século XXI na Ásia.

 

Num discurso que fez na sessão plenária de 25 de Outubro, na Câmara Baixa do Parlamento japonês, Shinzo Abe enfatizou que, dada a actual situação de segurança na Ásia, “é essencial fortalecer as funções de comando, de forma a implementar as políticas de segurança nacional” do seu governo. Agora que a divisão entre a Câmara Baixa e a Câmara Alta do Parlamento está resolvida - os Democratas Liberais de Shinzo Abe têm um controlo forte sobre as duas Câmaras - a nova lei de segurança nacional vai certamente ser aprovada.

 

Esta lei tem por objectivo estabelecer o Conselho de Segurança Nacional do Japão, que tem por base lições de sucesso e derrotas de instituições semelhantes em outros países, como a norte-americana “National Security Council” (NSC)[i]. O Conselho de Segurança do Japão – considerado como uma medida paliativa, criada para aconselhar membros importantes do Governo e o primeiro-ministro em tempos de crise – vai ser agora reorganizado para se transformar numa organização formal.

 

Este Conselho vai passar a aconselhar apenas o primeiro-ministro, os secretários do primeiro-ministro, e os ministros dos Negócios Estrangeiros e da Defesa, bem como outros ministros relevantes numa base ad hoc. O secretário permanente do Conselho de Segurança, uma pessoa com uma experiência diplomática alargada e que vai estar instalado junto do gabinete do primeiro-ministro, vai – com mais 60 especialistas de várias áreas - delinear os fundamentos da estratégia de segurança nacional a médio-longo prazo. Esta estratégia vai depois servir de orientação para os organismos de defesa e para os diplomatas japoneses.

 

O Japão, tal como outros países, enfrentou disputas sobre competências entre política externa, defesa e agências policiais, o que dificultou a agregação e a análise de informações obtidas pelos serviços de segurança. Mas, com a criação do Conselho de Segurança, cada ministro e agência reporta as informações importantes de segurança nacional ao novo secretário, que vai posteriormente executar análises integradas e emitir relatórios para o primeiro-ministro e outros membros do Governo.

 

Claro que, tal como em outros países, a burocracia é uma criatura de hábitos. Tal como pudemos já ver, não vai ser fácil ultrapassar os obstáculos que a integração de agências e ministérios representa. A institucionalização vai exigir tempo – e a importância do seu sucesso não pode ser subestimada.

 

Por exemplo, o novo Conselho de Segurança vai ser responsável pela partilha de informações obtidas pelos serviços de segurança com outros países, incluindo os Estados Unidos, o mais importante aliado do Japão. Como resultado disso, assegurar a protecção da informação vai ser um ponto fundamental, em particular dado o hábito antigo das fugas de informação para a imprensa.

 

É por isso que o parlamento japonês está também a considerar uma lei para a protecção de informação confidencial, que impõe punições mais severas para os membros do Governo que passem informações secretas, em particular as que dizem respeito à segurança nacional. O trauma das leis restritivas, impostas à imprensa antes e durante a Segunda Guerra Mundial, resultou na eliminação de todas as restrições depois do conflito, o que fez com que o Japão se tornasse um paraíso para os espiões, com medidas de contra-informações insuficientes e pouco sigilo.

 

Além disso, o longo período de paz desde 1945 fez com que os políticos tivessem pouca consciência da necessidade de confidencialidade. Por exemplo, os jornais japoneses sempre relataram quando, onde e com quem o primeiro-ministro se encontrava para jantar na edição do dia seguinte.

 

Em oposição ao sistema de governo presidencial dos Estados Unidos, o Japão tem um regime parlamentar. Ainda assim, os objectivos de segurança nacional e de gestão de crises é o mesmo nos dois países – de facto, uma das primeiras medidas do primeiro-ministro britânico David Cameron quando chegou ao poder foi implementar uma maior coordenação política da NSC. Embora a criação de um Conselho de Segurança Nacional no Japão esteja atrasado, não é tarde para o Japão beneficiar das melhorias na coerência e na direcção que este organismo parece vir trazer. 

 

Yuriko Koike, ex-ministra da Defesa do Japão e conselheira de segurança nacional, foi presidente do Partido Liberal Democrata. Actualmente é membro da Dieta Nacional do Japão (parlamento japonês).

 

Copyright: Project Syndicate, 2013.
www.project-syndicate.org

Tradução de Ana Laranjeiro 


[i] Em português: Conselho de Segurança Nacional

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