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Turismo hospitalar

Quando procuramos identificar um sector de actividade com taxa de crescimento superior à média da economia, o turismo é inevitavelmente citado. Se quisermos que esse sector cresça a uma taxa anual de dois dígitos temos de ser mais específicos e identifica

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Quando procuramos identificar um sector de actividade com taxa de crescimento superior à média da economia, o turismo é inevitavelmente citado. Se quisermos que esse sector cresça a uma taxa anual de dois dígitos temos de ser mais específicos e identificar um híbrido entre o sector da saúde e o do turismo.

O número de pessoas que se desloca para receber assistência hospitalar, particularmente serviços de cirurgia, eventualmente associados à convalescença em locais paradisíacos, tem vindo a crescer de forma vertiginosa.

O mais recente documentário de Michael Moore - Sicko - misto de panfleto e análise acutilante, chama a atenção para a precária situação da assistência médica de vastas camadas da população americana, particularmente ao nível da classe média.

Os elevados custos de assistência médica e hospitalar podem tornar-se proibitivos para os indivíduos que não subscreveram uma apólice de seguro desde o início da sua actividade profissional; também as empresas enfrentam, na concessão deste benefício, um factor de custo que reduz dramaticamente a sua competitividade.

O sector automóvel americano é apenas um exemplo da extrema sobrecarga que os custos com a saúde dos colaboradores podem implicar. Um conjunto de factores que vai da excessiva dependência de seguros voluntários a uma litigância exacerbada agravou os custos do sistema de saúde americano que já excede os 15% do PIB.

A globalização tardou em chegar a esta actividade mas está a operar milagres - reduz os custos de indivíduos e empresas de países com elevados custos e cria vastas oportunidades para os países com vantagens comparativas - custos de factores, incluindo instalações e recursos humanos, mais reduzidos.

Hospitais tailandeses, filipinos e de Singapura, particularmente, estão a competir activamente pela atracção de pacientes americanos e de outros países ricos. Um livro recente "Patients Beyond Borders" estima que 150.000 americanos tenham obtido intervenções cirúrgicas no exterior em 2006 e que este número duplique já este ano. Para reduzir problemas de falta de confiança, de particulares e das suas seguradoras, muitos destes hospitais obtiveram já certificação da "Joint Commission International", a estrutura internacional do regulador hospitalar americano.

Numa altura em que Portugal aposta de forma significativa no desenvolvimento da hotelaria e turismo importa reflectir sobre o nosso posicionamento num segmento emergente com este potencial.

Alguns factores são bastante positivos - a natureza hospitaleira dos portugueses é susceptível de se traduzir numa prestação de cuidados de qualidade; algumas especialidades, desde a cirurgia óptica a certos ramos da oncologia, gozam de reputação internacional; finalmente a vertente turística que pode complementar os serviços de saúde está bem oleada. No entanto pontuamos menos bem em dois elementos decisivos - a oferta de pessoal qualificado é escassa, tanto ao nível médico como de enfermagem, fruto de uma lógica corporativa que levou à definição de "numerus clausus" claramente abaixo até das necessidades domésticas de uma população cuja esperança de vida cresceu significativamente; o sector empresarial privado ainda não tem a dimensão nem a massa crítica adequadas à competição internacional que tem vindo a intensificar-se. Por outro lado, os sectores público e sem fins lucrativos, são alternativas de prestação destes serviços que ainda não conseguiram satisfazer plenamente os pacientes portugueses.

Tornar-nos-emos importadores ou exportadores líquidos de cuidados de saúde? É certo que ambos os fluxos vão crescer, mas precisamos de fazer um grande esforço para tirarmos partido do nosso potencial turístico e garantir que o saldo do turismo hospitalar se torne positivo. O desenvolvimento e expansão universitária é uma condição indispensável para o fomento da investigação, competências e prestígio do cluster nacional da saúde.

Alguns passos bem sucedidos na área da biotecnologia têm vindo a colocar Portugal na vanguarda da criação de novas terapêuticas; o aumento da oferta de profissionais qualificados (médicos e enfermeiros) permitirá reduzir os custos dos serviços hospitalares; a profissionalização da gestão dos três tipos de prestadores - público, sem fins lucrativos e privado - permitirá que a qualidade dos serviços prestados, a portugueses e estrangeiros, melhore significativamente. Esta é a minha visão optimista, que se baseia na análise do desenvolvimento do sector hoteleiro nacional e que é a mais adequada à quadra natalícia.

Se não se confirmar, o futuro dos nossos serviços de saúde também é mais risonho - mas teremos talvez de complementar os tratamentos médicos com um mergulho no mar das Caraíbas.

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