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Opinião
12 de Maio de 2011 às 10:16

Trabalho infantil artístico

Infelizmente, nem todas as crianças têm oportunidade de gozar uma infância de felicidade e liberdade. Estima-se que mais de 200 milhões crianças sejam exploradas e limitadas nos seus direitos.

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Brincar é o trabalho das crianças, pois é através da brincadeira que as crianças, de forma espontânea e agradável, desenvolvem a sua capacidade criativa, experimentam e treinam novos papéis e aprendem a regular socialmente os seus comportamentos e emoções.

Infelizmente, nem todas as crianças têm oportunidade de gozar uma infância de felicidade e liberdade. Estima-se que mais de 200 milhões de crianças sejam exploradas e limitadas nos seus direitos. Trata-se de uma prática ancorada sobretudo em condições de pobreza e questões culturais que apenas durante o século XIX começou a ser questionada e mereceu regulação.

Na Grã-Bretanha, a Factory Acts introduziu a medida pioneira de restrição à contratação de menores de 14 anos e limitou a jornada de trabalho, para menores de 18 anos, ao máximo de 12 horas diárias. A partir daí, com maior expressão durante os últimos 20 anos, numerosas instituições tais como a Organização Internacional do Trabalho, a UNESCO e a Organização das Nações Unidas têm desenvolvido um meritório trabalho no sentido de eliminar a exploração do trabalho infantil.

Em Portugal, em resultado de mudanças económicas, sociais e culturais, ocorridas nos últimos anos, verificou-se um significativo afastamento das crianças do mercado de trabalho, possibilitando, através da permanência no sistema de ensino, que estas se tornassem adultos mais saudáveis e produtivos.

O actual Código do Trabalho (aprovado pela Lei n.º 07/2009, de 12 de Fevereiro) prevê expressamente que só pode ser admitido a prestar trabalho o menor que tenha completado 16 anos, tenha concluído a escolaridade obrigatória e disponha de capacidades físicas e psíquicas adequadas ao posto de trabalho, salvo algumas excepções legalmente previstas.

Note-se que, entre outras excepções legalmente previstas, o menor com idade inferior a 16 anos e que tenha concluído a escolaridade obrigatória apenas pode legalmente prestar trabalhos se o empregador comunicar às autoridades laborais a admissão do menor nos oito dias subsequentes e desde que se tratem de trabalhos leves e que "consistam em tarefas simples e definidas que, pela sua natureza, pelos esforços físicos ou mentais exigidos ou pelas condições específicas em que são realizadas não sejam susceptíveis de prejudicar no que respeita à integridade física, segurança e saúde, assiduidade escolar, participação em programas de orientação ou de formação, capacidade para beneficiar da instrução ministrada ou ainda ao seu desenvolvimento físico, psíquico, moral, intelectual e cultural". Note-se, ainda, que em casos de empresas familiares, os menores com idade inferior a 16 anos devem trabalhar sob a vigilância e direcção de um membro de maior idade do seu agregado familiar.

Curiosamente, tem vindo a emergir nos últimos tempos, com alguma expressão nacional, a referenciação de trabalho infantil artístico, cultural ou publicitário. Com efeito, tal fenómeno encontra-se, actualmente, regulado em legislação específica.

Este tipo de actividade só poderá ser exercida em condições especiais de contexto e duração, sendo apenas admitido que o menor participe em espectáculos que envolvam animais desde que tenha pelo menos 12 anos e a sua actividade, incluindo os ensaios, decorra sob a vigilância de um dos progenitores, representante legal ou irmão maior. O menor, independentemente da idade, não poderá participar em espectáculos que envolvam qualquer substância ou actividade perigosa que possa constituir risco para a segurança ou saúde do menor.

Acresce que a participação de menor, incluindo ensaios e/ou outros actos preparatórios, em espectáculos ou outra actividade de natureza cultural, artística ou publicitária, designadamente como actor, cantor, dançarino, figurante, músico, modelo ou manequim não pode exceder os horários legais estabelecidos e que variam consoante a idade do menor, sendo que durante o período de aulas a actividade do menor não deve coincidir com o horário escolar, nem impossibilitar de qualquer modo a participação em actividades escolares. Por outro lado, deve ser respeitado um intervalo mínimo de uma hora entre a actividade e a frequência das aulas e deve a actividade ser suspensa pelo menos um dia por semana, coincidente com o dia de descanso durante o período de aulas. Existem, ainda, outras restrições, nomeadamente, relativas ao período de férias, período de trabalho nocturno e pausas que não podem ser descuradas.

A participação de menores nas referidas actividades está, ainda, sujeita a autorização ou comunicação, sendo que esta última só pode ter lugar no caso de participação que decorra num período de 24 horas e respeite a menor com, pelo menos, 13 anos de idade que não tenha participado, nos 180 dias anteriores, nas actividades acima referidas.

A Comissão de Protecção de Crianças e Jovens (CPCJ) é a entidade competente para a aludida autorização e para receber a comunicação. A autorização será obtida após audição do menor (sempre que possível), desde que acompanhada pelos elementos legalmente exigidos e o tipo de participação e o correspondente número de horas por dia e por semana respeitarem os limites legalmente estabelecidos e não prejudicarem a segurança, a saúde, o desenvolvimento físico, psíquico e moral, a educação e a formação do menor.

Tal autorização deve ser proferida no prazo de 20 dias, sendo competentes para dar parecer sobre o pedido, as seguintes entidades: (i) qualquer sindicato representativo da actividade a exercer pelo menor que tenha celebrado uma convenção colectiva que abranja a actividade promovida pelo requerente; (ii) qualquer associação de empregadores em que a entidade promotora esteja inscrita ou que tenha celebrado convenção colectiva que abranja a actividade promovida pelo requerente.

A autorização apenas será válida pelo período da participação do menor na actividade a que respeita, no máximo de 9 meses, devendo ser renovada sempre que a participação for de duração superior.

Não obstante o exposto, não se pode olvidar que para além do regulado, situações existem muitas vezes integradas em esquemas de economia paralela, em que as crianças estão ainda limitadas no seu direito à infância e à educação estando sujeitas a verdadeira exploração infantil.



Tome nota
1. Brincar é o trabalho das crianças. O pleno gozo da infância é condição para se tornarem adultos mais saudáveis e produtivos;
2. A legislação portuguesa restringe a idade para o inicio de actividade laboral aos 16 anos, salvo algumas excepções legalmente previstas;
3. Em empresas familiares, os menores com idade inferior a 16 anos devem trabalhar sob a vigilância e direcção de um membro de maior idade do seu agregado familiar;
4. Legislação específica prevê e regula a actividade de natureza artística, cultural ou publicitária praticada por menores;
5. A Comissão de Protecção de Crianças e Jovens (CPCJ) é a entidade competente para autorizar trabalho infantil artístico;




*Associada da Teixeira de Freitas, Rodrigues e Associados
claudia.torres@tfra.pt

** Docente Universitária
acsd.duarte@gmail.com
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