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08 de Maio de 2006 às 13:59

Sustentabilidade e Estado Social

É desejável que se promova uma reforma estrutural do sistema de segurança social capaz de assegurar a sua sustentabilidade no curto, no médio e no longo prazo.

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Segundo dados do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, em Portugal têm existido ao nível da despesa social acréscimos consideráveis: só entre 2004 e 2005, a despesa em pensões cresceu 9% e em subsídio de desemprego 7,1%. Acresce que, e de acordo com o Eurostat, entre 1994 e 2002, a despesa em benefícios de protecção social, em particular em função da velhice, mais do que duplicou (European Social Statistics, 2005). A este ritmo, a situação financeira do sistema público da Segurança Social em Portugal tornar-se-á progressivamente – e à medida em que a sociedade envelhece – preocupante.

Esta é, pois, uma razão para se uma reflicta, de forma abrangente, sobre a evolução demográfica em Portugal e sobre as políticas de emprego e a sua repercussão no sistema de Segurança Social.

E se as medidas implementadas pelo Governo em 2005 deram já bons resultados – nomeadamente a convergência dos regimes de protecção social, a revisão dos regimes especiais ou o combate à fraude e à evasão para a segurança social –, é preciso ainda ir além. É desejável que se promova uma reforma estrutural do sistema de segurança social capaz de assegurar a sua sustentabilidade no curto, no médio e no longo prazo.

Desde logo, por razões demográficas que se prendem quer com a evolução da taxa de natalidade, quer com o envelhecimento da população. De acordo com o relatório da Comissão Europeia, de 2005, intitulado Confronting demographic change, a taxa de natalidade está abaixo do valor mínimo para a renovação geracional (2,1 filhos por casal), situando-se em 1,5 filhos por casal. Ora esta taxa de fertilidade é insuficiente para a substituição da população e faz diminuir a população activa. Se há 25 anos atrás, por cada reformado por velhice havia 3,8 portugueses activos, hoje para cada reformado há apenas 2,6 activos. Mas o pior cenário está ainda para vir: é expectável que em 2050 – e considerando factores como a natalidade, a mortalidade e os fluxos migratórios – Portugal seja o quarto país da UE25 com maior percentagem de idosos. Assim se, tendencialmente, haverá cada vez menos pessoas a trabalhar para garantir o pagamento das reformas e cada vez mais pessoas a receber reformas, rapidamente o sistema público entrará em ruptura.

Ciente da gravidade do problema o Governo propõe agora, em sede de concertação social, reestruturar o sistema público de Segurança Social através de cinco eixos de propostas que considera centrais.

Em primeiro lugar, a preocupação em associar as pensões de reforma à evolução da esperança de vida. Aqui a ideia é a de facultar uma opção tripla. Os beneficiários do sistema ou optam por sujeitar o valor da sua futura pensão a um ajustamento segundo um factor de sustentabilidade - que terá em conta o aumento da esperança média de vida no momento da reforma -; ou optam por programar um reforço das suas contribuições ao longo da vida activa para que, ao atingirem a idade da reforma, não tenha que haver nenhum ajustamento no valor da pensão; ou, em alternativa, optam por prolongar a sua vida activa pelo número de meses que for necessário para anular o efeito do factor de sustentabilidade. Trata-se de uma resposta pertinente e equilibrada porque assente numa «faculdade» e não numa «imposição».

Depois, propõe a entrada em vigor da fórmula de cálculo que considera toda a carreira contributiva. Trata-se de impedir a existência de pensões desproporcionadas no que respeita ao verdadeiro esforço contributivo (alteração esta que não será aplicada aos trabalhadores com carreiras contributivas muito longas e não terá efeitos retroactivos).

Em terceiro lugar, o executivo sugere aumentos anuais de pensões que, salvaguardando o poder de compra das pensões mais baixas, sejam fixados em função do desempenho da economia (em particular considerando o crescimento do PIB e a inflação). Propõe ainda, no âmbito do sistema público, estabelecer patamares máximos para as pensões, ficando o seu valor congelado a partir de um limite superior.

Em quarto lugar, e no âmbito de uma política para a família, o Governo alvitra mais incentivos à recuperação da natalidade, em particular que a taxa contributiva dos trabalhadores varie, moderadamente, em função do número de filhos. Além do mais propõe-se estimular a (já tão desejada) efectiva de partilha do tempo de licença entre os dois progenitores, garantindo a igualdade na assunção de responsabilidades familiares.

Por fim, propõe um reforço da protecção na invalidez, na deficiência, às famílias monoparentais, às crianças e aos jovens órfãos.

Globalmente trata-se de um conjunto de medidas que, mesmo que nem sempre seja possível agradar a «gregos e a troianos», merecem elogio. Sendo pertinentes e demonstrando preocupação central com a promoção do equilíbrio inter-geracional – ou seja, com o objectivo de garantir a atribuição de pensões aos jovens, assegurando igualmente aos mais idosos a continuação da protecção social – são conduzidas através de um louvável esforço de consenso social.

O Governo dá neste assunto mostras de clarividência, de sentido de Estado e de uma preocupação em preparar o futuro do país. Firme na defesa do Estado Social, mas dialogante. E, sendo este um grande desafio para a sociedade e para a economia, deve pedir-se aos parceiros sociais convergência colectiva a fim de se garantir para o futuro um crescimento económico sustentável.

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