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17 de Julho de 2003 às 10:48

Sérgio Figueiredo: «A Dama e o Ferro»

A doutora Manuela Ferreira Leite é a ministra mais prestigiada deste Governo. Chegou ao Governo com uma inquestionável preparação técnica. Os adversários políticos, mesmo na discordância, sempre reconheceram a sua firmeza de carácter.

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A doutora Manuela Ferreira Leite é a ministra mais prestigiada deste Governo. Chegou ao Governo com uma inquestionável preparação técnica. Os adversários políticos, mesmo na discordância, sempre reconheceram a sua firmeza de carácter.

A tudo isto, a actual titular da pasta das Finanças alia um conjunto de virtudes de personalidade que, sem dúvida alguma, a transformaram na pessoa certa, no lugar certo e, mais importante, no momento certo.

É preciso dizer que Manuela Ferreira Leite iniciou funções da melhor maneira. Assumiu um compromisso com a verdade orçamental. Chamou o doutor Vítor Constâncio para auditar as contas do PS. Revelou a verdadeira dimensão da orgia financeira que encontrou no Estado.

Com a subtileza feminina, enfiou na gaveta a maioria das coisas que o seu primeiro-ministro andara a prometer na campanha eleitoral. Com a sua força política, submeteu o Conselho de Ministros e o país a uma verdadeira “lei marcial” financeira. Fez cortes cegos na despesa. Inventou receita. O défice não podia ultrapassar os 3%. E não ultrapassou.

O país perdoou-lhe os sacrifícios porque passou a dever-lhe o exemplo. Manuela Ferreira Leite tornou-se um símbolo da obstinação, da credibilidade, alguém em que as pessoas podem confiar. E as pessoas precisam de confiar em alguém ou em alguma coisa.

É por isso absolutamente incompreensível, seria um tremendo choque, que a doutora Ferreira Leite tivesse avalizado a “chico-espertice” na prestação das contas públicas referentes ao primeiro semestre.

E que esteja consciente da grosseira manipulação feita à evolução do défice que, a partir do empolamento dos valores de 2002, transforma o crescimento de 23,7% no défice anteontem anunciado numa derrapagem efectiva superior a 50%.

Ou seja, anda a ministra das Finanças a dizer que a despesa está controlada, andam os portugueses a acreditar e andam as organizações internacionais a confiar, quando afinal não está.

Não é necessário chamar a atenção para a gravidade da situação. E para o facto de ela, num ápice, ficar absolutamente indecifrável.

Porque a recessão justifica o descalabro na arrecadação de receitas. Porque o desemprego explicava o agravamento dos encargos sociais. Porque as medidas draconianas na função pública garantiam uma subida controlada da despesa corrente. Mas, afinal, não garantia.

E a ministra das Finanças não tem terceira saída: ou está a ser enganada; ou não está a contar toda a verdade. Num caso ou noutro, terá certamente explicações convincentes para nos dar.

O doutor Ferro Rodrigues deu uma importante entrevista à SIC Notícias/Jornal de Negócios, porque conseguiu demonstrar que não tem alternativa à actual política económica.

Aliás, o secretário-geral do PS está cada vez mais empenhado em demonstrar que, ele próprio, jamais será a alternativa. Tal como a ministra das Finanças, ao líder da oposição é reconhecida seriedade. Mas falta-lhe preparação.

Porque Ferro Rodrigues sabe o que foi o “totonegócio”, o esquema Partest, a esdrúxula Lei das Finanças Locais, a outra ruinosa Lei das Finanças Regionais, o violento descontrolo na função pública, a proliferação dos institutos públicos, a despesa corrente fora do Orçamento, o fartar vilanagem nas empresas públicas.

Mas, para ele, o grande pecado orçamental dos socialistas foi a redução do IRS. O homem até é sério, mas a sua atitude não. Tal como as contas apresentadas pelas Finanças. A dama é de ferro e o líder da oposição também. A confiança do homem comum é que não.

Por Sérgio Figueiredo
Director do Jornal de Negócios
Publicado no Jornal de Negócios

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