Opinião
Revalorização de bens totalmente depreciados
Com a entrada em vigor do Sistema de Normalização Contabilística (SNC) algumas realidades contabilísticas foram alteradas
Com a entrada em vigor do Sistema de Normalização Contabilística (SNC) algumas realidades contabilísticas foram alteradas, levando a que se deva ponderar bem as situações antes de levar a cabo determinada alteração.
Atente-se no exemplo que aqui iremos explorar: a revalorização de um bem totalmente depreciado (uma viatura automóvel). Perante um bem do ativo fixo tangível que se encontra totalmente depreciado, e que por esse facto irá deixar de figurar no balanço, a primeira ideia que surge é revalorizá-lo, atribuir-lhe novamente um valor contabilístico, para que este volte a figurar na face do balanço.
A ideia, embora pareça relativamente simples, comporta particularidades que devem previamente ser analisadas.
Modelo do custo ou modelo de revalorização
Em primeiro lugar, deveremos dar atenção à norma contabilística e de relato financeiro (NCRF), que neste caso será a NCRF 7 - Ativos fixos tangíveis, que logo à partida dispõe que uma entidade deve escolher como política de mensuração dos ativos fixos tangíveis, o modelo de custo, ou o modelo de revalorização, e deve aplicar essa política contabilística a uma classe inteira de ativos fixos tangíveis.
No modelo do custo, após o reconhecimento de um bem como um ativo fixo tangível, este deve ser escriturado pelo seu custo menos qualquer depreciação acumulada e quaisquer perdas por imparidade acumuladas. Aplicando este modelo, não será possível revalorizar o bem.
Agora, imaginemos que uma entidade irá optar por aplicar o modelo de revalorização à classe (equipamento de transporte) de que faz parte a viatura automóvel.
A NCRF 7 prevê que um item do ativo fixo tangível cujo justo valor possa ser mensurado fiavelmente deve ser escriturado por uma quantia revalorizada, que é o seu justo valor à data da revalorização menos qualquer depreciação acumulada subsequente e perdas por imparidade acumuladas subsequentes.
Neste modelo, as revalorizações devem ser efetuadas com suficiente regularidade para assegurar que a quantia escriturada não difira materialmente daquela que seria determinada pelo uso do justo valor à data do balanço.
Assim, a frequência das revalorizações dependerá das alterações nos justos valores dos ativos fixos tangíveis que estão nesse processo. Apenas quando o justo valor de um ativo revalorizado diferir materialmente da sua quantia escriturada, é que é exigida uma nova revalorização, segundo refere a norma.
O justo valor deve ser determinado com base no mercado. Se tal não for possível, devido à natureza especializada do item do ativo fixo tangível ou se o item for raramente vendido, exceto como parte de um negócio em continuação, uma entidade não pode utilizar o método de revalorização. Aqui surgiria novo entrave, mas como usamos o exemplo de uma viatura automóvel, esta questão não se coloca.
Surge, entretanto, um novo problema. Se um item do ativo fixo tangível for revalorizado, toda a classe desse ativo fixo tangível deve ser revalorizada. A tarefa é facilitada se só possuirmos uma viatura automóvel, mas se tivermos numerosa frota automóvel, o trabalho é acrescido.
Quando um item do ativo fixo tangível for revalorizado, qualquer depreciação ou amortização acumulada à data da revalorização é tratada de uma das seguintes formas:
- Esta pode ser reexpressa proporcionalmente com a alteração na quantia escriturada bruta do ativo a fim de que o valor escriturado do ativo após a revalorização iguale a quantia revalorizada. Este método é muitas vezes usado quando um ativo é revalorizado por meio da aplicação de um índice para determinar o seu custo de reposição depreciado; ou
- Eliminada contra a quantia escriturada bruta do ativo, sendo a quantia líquida reexpressa para a quantia revalorizada do ativo.
Tratamento contabilístico
Imaginemos que a viatura automóvel estava registada por 25 mil euros e encontra-se agora totalmente depreciada, sendo a quantia escriturada (valor contabilístico) de zero, mas ainda possui utilidade e valor económico, e a entidade pretende adotar o modelo de revalorização. A quantia escriturada do bem irá ser aumentada para, por exemplo, cinco mil euros (justo valor que lhe foi atribuído), assim como o respetivo período de vida útil.
Para a contabilização da revalorização, e dado que a viatura se encontra totalmente depreciada, entendemos que a entidade pode adotar a metodologia do valor corrente de mercado, ou seja, eliminar as depreciações acumuladas contra a quantia escriturada do ativo, sendo a quantia líquida reexpressa para a quantia revalorizada do ativo (que ascende a cinco mil euros).
Elimina-se, então, o valor das depreciações acumuladas contra a quantia escriturada bruta do ativo (25 mil euros), debitando-se a conta onde estão registadas as depreciações acumuladas deste ativo fixo tangível e creditando-se a conta do ativo fixo tangível referente a este equipamento de transporte.
Voltamos a introduzir a viatura automóvel na contabilidade, sendo reexpressa pelo justo valor que lhe foi atribuído (cinco mil euros), debitando-se para tal a conta do ativo fixo tangível referente a equipamentos de transporte e creditando-se a conta de excedentes de revalorização de ativos fixos tangíveis e intangíveis.
Ao ter sido estimado um acréscimo no período de vida útil durante o qual se espera que a viatura esteja disponível para uso, deveremos considerar que o valor que resulta da depreciação praticada para além do período máximo de vida útil não é aceite fiscalmente.
Por outro lado, as depreciações fiscalmente dedutíveis assentam no custo histórico, pelo que o acréscimo de depreciações que resultem da aplicação do modelo de revalorização face ao seu custo histórico deverá ser acrescido (no modelo 22) aquando do apuramento do resultado tributável do período.
Assim, atendendo a que a viatura já estava totalmente depreciada, tendo tais depreciações sido relevantes para a determinação do lucro tributável, o acréscimo da vida útil que resulta da revalorização não será fiscalmente aceite.
Como tal, a revalorização, e consequente aumento da vida útil da viatura, origina um passivo por impostos diferidos, no caso concreto de aproximadamente 1 250 euros (aplicando-se uma taxa de 25 por cento de IRC). Contabilisticamente, este valor deve ser registado a débito da conta excedentes de revalorização por contrapartida da conta de passivos por impostos diferidos.
Nos períodos seguintes, a entidade deve acrescer no quadro 07 da declaração modelo 22 a depreciação futura da viatura, referente a cada exercício, assim como teria de acrescer a parte respeitante ao acréscimo nas depreciações resultantes da revalorização se o bem não estivesse ainda totalmente depreciado fiscalmente.
Note-se que, se a entidade tivesse adotado a NCRF-PE (norma para as pequenas entidades) que não obriga a impostos diferidos, ao optar pelo modelo da revalorização, como sua política contabilística, terá de reconhecer impostos diferidos, e deve aplicar essa política a uma classe inteira de ativos fixos tangíveis, que no exemplo que demos, da viatura automóvel, levaria a que fossem revalorizadas todas as viaturas que eventualmente a entidade possuísse, estando elas totalmente amortizadas, ou não.
No caso de a entidade adotar a NCM - Norma contabilística para microentidades, estará impossibilitada de usar o método de revalorização de ativos fixos tangíveis, como está patente nos seus parágrafos 7.6 a 7.8.
O exemplo que foi utilizado pode transmitir a ideia de que revalorizar um ativo é um processo simples e de rápida execução, mas se estivermos perante revalorizações a itens de natureza bastante específica ou a classes com muitos bens, o processo pode tornar-se moroso e até dispendioso, pois poderá surgir a necessidade de recorrer a entidades externas para determinar o justo valor dos bens. A decisão de utilizar o modelo de revalorização tem toda a conveniência em ser tomada pelo órgão de gestão em conjunto com o técnico oficial de contas, para que se avalie convenientemente a relação custo/benefício de toda a operação.
Texto redigido com base no novo acordo ortográfico
Atente-se no exemplo que aqui iremos explorar: a revalorização de um bem totalmente depreciado (uma viatura automóvel). Perante um bem do ativo fixo tangível que se encontra totalmente depreciado, e que por esse facto irá deixar de figurar no balanço, a primeira ideia que surge é revalorizá-lo, atribuir-lhe novamente um valor contabilístico, para que este volte a figurar na face do balanço.
Modelo do custo ou modelo de revalorização
Em primeiro lugar, deveremos dar atenção à norma contabilística e de relato financeiro (NCRF), que neste caso será a NCRF 7 - Ativos fixos tangíveis, que logo à partida dispõe que uma entidade deve escolher como política de mensuração dos ativos fixos tangíveis, o modelo de custo, ou o modelo de revalorização, e deve aplicar essa política contabilística a uma classe inteira de ativos fixos tangíveis.
No modelo do custo, após o reconhecimento de um bem como um ativo fixo tangível, este deve ser escriturado pelo seu custo menos qualquer depreciação acumulada e quaisquer perdas por imparidade acumuladas. Aplicando este modelo, não será possível revalorizar o bem.
Agora, imaginemos que uma entidade irá optar por aplicar o modelo de revalorização à classe (equipamento de transporte) de que faz parte a viatura automóvel.
A NCRF 7 prevê que um item do ativo fixo tangível cujo justo valor possa ser mensurado fiavelmente deve ser escriturado por uma quantia revalorizada, que é o seu justo valor à data da revalorização menos qualquer depreciação acumulada subsequente e perdas por imparidade acumuladas subsequentes.
Neste modelo, as revalorizações devem ser efetuadas com suficiente regularidade para assegurar que a quantia escriturada não difira materialmente daquela que seria determinada pelo uso do justo valor à data do balanço.
Assim, a frequência das revalorizações dependerá das alterações nos justos valores dos ativos fixos tangíveis que estão nesse processo. Apenas quando o justo valor de um ativo revalorizado diferir materialmente da sua quantia escriturada, é que é exigida uma nova revalorização, segundo refere a norma.
O justo valor deve ser determinado com base no mercado. Se tal não for possível, devido à natureza especializada do item do ativo fixo tangível ou se o item for raramente vendido, exceto como parte de um negócio em continuação, uma entidade não pode utilizar o método de revalorização. Aqui surgiria novo entrave, mas como usamos o exemplo de uma viatura automóvel, esta questão não se coloca.
Surge, entretanto, um novo problema. Se um item do ativo fixo tangível for revalorizado, toda a classe desse ativo fixo tangível deve ser revalorizada. A tarefa é facilitada se só possuirmos uma viatura automóvel, mas se tivermos numerosa frota automóvel, o trabalho é acrescido.
Quando um item do ativo fixo tangível for revalorizado, qualquer depreciação ou amortização acumulada à data da revalorização é tratada de uma das seguintes formas:
- Esta pode ser reexpressa proporcionalmente com a alteração na quantia escriturada bruta do ativo a fim de que o valor escriturado do ativo após a revalorização iguale a quantia revalorizada. Este método é muitas vezes usado quando um ativo é revalorizado por meio da aplicação de um índice para determinar o seu custo de reposição depreciado; ou
- Eliminada contra a quantia escriturada bruta do ativo, sendo a quantia líquida reexpressa para a quantia revalorizada do ativo.
Tratamento contabilístico
Imaginemos que a viatura automóvel estava registada por 25 mil euros e encontra-se agora totalmente depreciada, sendo a quantia escriturada (valor contabilístico) de zero, mas ainda possui utilidade e valor económico, e a entidade pretende adotar o modelo de revalorização. A quantia escriturada do bem irá ser aumentada para, por exemplo, cinco mil euros (justo valor que lhe foi atribuído), assim como o respetivo período de vida útil.
Para a contabilização da revalorização, e dado que a viatura se encontra totalmente depreciada, entendemos que a entidade pode adotar a metodologia do valor corrente de mercado, ou seja, eliminar as depreciações acumuladas contra a quantia escriturada do ativo, sendo a quantia líquida reexpressa para a quantia revalorizada do ativo (que ascende a cinco mil euros).
Elimina-se, então, o valor das depreciações acumuladas contra a quantia escriturada bruta do ativo (25 mil euros), debitando-se a conta onde estão registadas as depreciações acumuladas deste ativo fixo tangível e creditando-se a conta do ativo fixo tangível referente a este equipamento de transporte.
Voltamos a introduzir a viatura automóvel na contabilidade, sendo reexpressa pelo justo valor que lhe foi atribuído (cinco mil euros), debitando-se para tal a conta do ativo fixo tangível referente a equipamentos de transporte e creditando-se a conta de excedentes de revalorização de ativos fixos tangíveis e intangíveis.
Ao ter sido estimado um acréscimo no período de vida útil durante o qual se espera que a viatura esteja disponível para uso, deveremos considerar que o valor que resulta da depreciação praticada para além do período máximo de vida útil não é aceite fiscalmente.
Por outro lado, as depreciações fiscalmente dedutíveis assentam no custo histórico, pelo que o acréscimo de depreciações que resultem da aplicação do modelo de revalorização face ao seu custo histórico deverá ser acrescido (no modelo 22) aquando do apuramento do resultado tributável do período.
Assim, atendendo a que a viatura já estava totalmente depreciada, tendo tais depreciações sido relevantes para a determinação do lucro tributável, o acréscimo da vida útil que resulta da revalorização não será fiscalmente aceite.
Como tal, a revalorização, e consequente aumento da vida útil da viatura, origina um passivo por impostos diferidos, no caso concreto de aproximadamente 1 250 euros (aplicando-se uma taxa de 25 por cento de IRC). Contabilisticamente, este valor deve ser registado a débito da conta excedentes de revalorização por contrapartida da conta de passivos por impostos diferidos.
Nos períodos seguintes, a entidade deve acrescer no quadro 07 da declaração modelo 22 a depreciação futura da viatura, referente a cada exercício, assim como teria de acrescer a parte respeitante ao acréscimo nas depreciações resultantes da revalorização se o bem não estivesse ainda totalmente depreciado fiscalmente.
Note-se que, se a entidade tivesse adotado a NCRF-PE (norma para as pequenas entidades) que não obriga a impostos diferidos, ao optar pelo modelo da revalorização, como sua política contabilística, terá de reconhecer impostos diferidos, e deve aplicar essa política a uma classe inteira de ativos fixos tangíveis, que no exemplo que demos, da viatura automóvel, levaria a que fossem revalorizadas todas as viaturas que eventualmente a entidade possuísse, estando elas totalmente amortizadas, ou não.
No caso de a entidade adotar a NCM - Norma contabilística para microentidades, estará impossibilitada de usar o método de revalorização de ativos fixos tangíveis, como está patente nos seus parágrafos 7.6 a 7.8.
O exemplo que foi utilizado pode transmitir a ideia de que revalorizar um ativo é um processo simples e de rápida execução, mas se estivermos perante revalorizações a itens de natureza bastante específica ou a classes com muitos bens, o processo pode tornar-se moroso e até dispendioso, pois poderá surgir a necessidade de recorrer a entidades externas para determinar o justo valor dos bens. A decisão de utilizar o modelo de revalorização tem toda a conveniência em ser tomada pelo órgão de gestão em conjunto com o técnico oficial de contas, para que se avalie convenientemente a relação custo/benefício de toda a operação.
Texto redigido com base no novo acordo ortográfico
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