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17 de Maio de 2005 às 13:59

Ou gordo ou gourmet

Não sei quanto tempo isto vai durar (também às preocupações que deviam ser permanentes se aplica a profecia worholiana dos «15 minutos de fama») mas muito teríamos a ganhar se a obesidade infantil se mantivesse como tema digno de atenção por mais alguns a

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É que não se trata de problema que se resolva de um momento para o outro, até porque envolve comportamentos, e mudar comportamentos é o que há de lento, difícil, quase improvável.

A obesidade (infantil e não só) é, em si mesma - pelo desconforto, pela estigmatização e pelo risco que oferece à própria vida de quem é gordo - um problema grave de saúde, mas, além disso, é sintoma de problemas que a antecedem e que, enquanto não forem enfrentados, não estará a ser enfrentada a própria obesidade.

Angústia engorda. As crianças obesas são, em regra, vítimas de angústia. Comem para preencher o vazio imposto pela angústia, engordam, tornam-se pesadas, mais difícil fica levantarem-se da frente da televisão, diante da qual, com olhos absortos, babam, lambem, mastigam e engolem anúncios com gente linda a lambuzar-se de chocolates, frituras e açúcares de todas as cores? e mais gordas ficam, e, estigmatizadas, angustiam-se e comem?

Primeira medida a tomar (pelos pais, antes de mais nada): ou televisão ou comida. Os dois ao mesmo tempo é que não pode ser (e, no entanto, o que vejo é a refeição associada à televisão - em Portugal, os únicos restaurantes que não têm televisões são os de luxo). Não há nenhum custo, nenhum gasto, nada que impeça que refeição e televisão se tornem excludentes entre si. Trata-se só (só?!) de mudar os comportamentos (a começar pelos pais). Daí resulta, em princípio, uma relação familiar mais intensa (é à mesa que se conversa) uma relação com a comida mais saudável, e até - se isso for possível - uma relação menos obsessiva e estúpida com a televisão. Mais convívio, mais apoio, mais proximidade, mais afecto, menos angústia, enfim.

Outra acção - que tanto pode ser profiláctica quanto curativa - é levar as crianças para a cozinha. As crianças obesas são obesas porque comem muito, não porque comem bem. E menos gordas seriam se melhor comessem. Em vez de as afastar, à força, da comida, é envolvê-las de perto com esse assunto que tanto lhes interessa: a comida, desde a sua preparação, com as suas subtilezas, artes e cuidados. A opção pode estar entre ter uma criança gorda e ter uma criança gourmet; entre a comida como vício e a comida como prazer e arte; entre a obesidade mórbida e, vá lá, uns quilinhos (poucos) a mais.
 
PS: Não pretendo mudar comportamentos colectivos quando, todos (todos!) os dias em que ocupo este espaço de divagação, refiro a indecência que há no acto de tratar passeios públicos como se estacionamentos privados fossem. Não me iludo, sei que é batalha perdida, mas não é por ser perdida que a batalha deixa de ser digna de luta.
 
PPS: A Câmara Municipal de Oeiras empregou homens, pedras e terra para restaurar os passeios junto ao centro histórico da vila (é nítida a vala fincada pelo peso dos carros nos passeios públicos - feitos para receberem o peso dos passos e só o peso dos passos) . Como morador e contribuinte fiscal de Oeiras devo pagar para calcetarem estacionamentos em lugares desenhados para o meu passeio?

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