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Opinião
12 de Abril de 2005 às 13:59

Os intrépidos

Era a morte de um Papa. Justificava-se o compartilhar da emissão por dois pivots – um no estúdio de Lisboa outro na rua do Vaticano, com a Basílica de São Pedro ao fundo.

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O pivot de Lisboa pede ao do Vaticano que faça o seu testemunho pessoal sobre aquilo que foi a aventura de furar a fila de 18 horas, enfrentada por todos os milhares e milhares de peregrinos que a isso se dispunham para ver o corpo morto do Papa. O pivot do Vaticano abre um sorriso radiante:

– Exactamente, não só eu como toda a equipa da TVI conseguimos entrar por uma porta lateral – e aqui o sorriso do pivot parecia o de um miúdo de 9 anos a contar como conseguiu espiar a vizinha nua a tomar banho – entrámos, assim, à portuguesa, he-he.

E ainda houve tempo para sabermos que os senhores da TVI, frustrados por não poderem parar diante do corpo morto do Papa, conseguiram dar a volta, entrar outra vez pela tal porta lateral, e, «à portuguesa», passar duas (duas!) vezes diante do corpo morto do Papa.

Terá sido, quem sabe, o ponto alto das suas carreiras. E, com o próprio triunfo, elevaram bem alto o nome de Portugal («à portuguesa», fizeram questão de dizer e repetir, com a humildade dos grandes conquistadores, que, em vez de abarcarem, ciumentos, todos os louros, repartem-nos com os da sua raça). Edificante.

Ainda inchado de tanto orgulho, passei os dias seguintes num zapping frenético, à procura da repercussão internacional de tamanha proeza. E, no entanto, nada: nem BBC nem CNN nem sequer a vizinha TVE, nada, nenhuma emissora de TV deu publicidade ao feito da equipa da TVI que, «à portuguesa», conseguiu passar duas (duas!) vezes diante do corpo morto do Papa. Na imprensa escrita também nada – sequer na nacional, onde julguei que o orgulho pátrio suplantaria as naturais invejas do sucesso alheio – nem nela vi uma referência sequer ao feito dos nossos intrépidos repórteres que – não uma, mas duas (duas!) vezes – mostraram ao mundo aquilo que se consegue alcançar quando é «à portuguesa» que se faz a coisa. Sequer a Igreja, que vendeu o canal da TVI com a expectativa de continuar a ver nela uma cobertura religiosa (católica) considerável, nem a Igreja pareceu sensibilizar-se com o feito daquela equipa tão portuguesa, tão católica, tão peregrina.

Eis-me aqui, então, a corrigir, no limite das minhas possibilidades, a injustiça. Aquilo é que é jornalismo, aquilo é que é fé, aquilo é que é ser português. Uma vergonha.

PS: O PSD escolheu, em Congresso, o seu novo líder. Não me lembro de algum dia ter tido à minha mesa alguém filiado ao PSD? nem ao PS? nem ao Bloco de Esquerda? a nenhum partido. Lembro-me, vagamente, de, n’algum dia ainda próximo do 25 de Abril de 74, me ter – eu próprio – filiado ao PS (porque aquele punho cerrado era muita giro), e aí (tinha eu 11 anos) esgota-se a minha proximidade com algum partido político. E depois queixo-me?

PPS: O meu partido é o dos passeios públicos (PPP). Nunca concorreu mas todas as eleições perdeu.

PPPS: Há instituições que apodrecem. A Polícia do Rio de Janeiro, de onde saíram os autores da chacina de 30 pessoas escolhidas ao calhas (mataram em protesto contra a prisão de uns colegas que foram filmados a deixar uma cabeça decapitada no quartel a que serviam) está podre.

PPPPS: No Rio de Janeiro a Polícia faz vista grossa a carros estacionados em cima do passeio.

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