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Baptista Bastos - Cronista b.bastos@netcabo.pt 03 de Setembro de 2004 às 13:59

O medo no PS

Alguns dos mais notórios dirigentes socialistas são peremptórios: o medo existe no PS. Nenhum deles, porém, esclarece este mistério tenebroso: desde quando o medo habita o partido?

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Quem instilou esse eczema corrosivo no corpo daquela agremiação, presumivelmente sólido de convicções, repleto de ardentes defensores da democracia, pejado de exigências implacáveis de liberdade – quem?

Deixando a nossa malvada curiosidade em estado de alerta, todas as conjecturas são permitidas. Quais foram os secretários-gerais culpados do caviloso crime de encobrimento? Enquanto o PS invadia a História, embandeirando em arco com o propugnar da livre discussão de ideias – na sombra e no silêncio movia-se, larvar, o medo. Sendo assim, que motivos obscuros impeliram os actuais acusadores ao silêncio cúmplice? E quais as ponderosas razões que determinaram, só agora, a revelação do escândalo?

Admitindo como verdade os infaustos testemunhos, o PS, inflamado paladino das liberdades, não passa da imagem devolvida do que tem condenado, com veemente eloquência: o estalinismo. Esperemos que, nas entrevistas na SIC, o inquietante tema seja debatido. É essa base «ideológica» que pode conferir todas as dimensões às altas responsabilidades políticas do Partido Socialista. A «clarificação», a «transparência» talvez encontrem, desta vez, o ponto de largada para uma nova concepção de «partido».

Pessoalmente, não o creio. Os interesses estão demasiadamente enraizados, e ninguém parece empenhado em demonstrar como se fizeram grandes fortunas; como é que os caciques autárquicos permanecem no poder anos a fio; como é que, nos órgãos informativos estatais, as administrações e as direcções resultem da natureza anómala da «alternância»; porque é que na «gestão» das grandes empresas encontram-se ex-altos dirigentes do PS e / ou do PSD? – e por aí fora.

Devo dizer que nada tenho contra José Sócrates; mas também nada tenhoemseu favor. Vastas coisas nos separam.Nempreciso de as enumerar. E não se trata de mero problema de passado: é das infinitas dúvidas de futuro que sobre ele impendem. Quando Valentim Loureiro, esse pesadelo hilariante, elogia Sócrates, com afirmações tão ditirâmbicas como esta: «Muito gostaria que ele ganhasse as próximas eleições no partido» qualificando-o de «socialista concreto» – aí, fosse eu socialista, desconfiava da profecia, embora, claro!, descontasse a parcela de tolice que ela comporta.

O que está a acontecer no PS é o espelho do País. Dividido entre a inércia e momentos de indignação; entre cóleras platónicas e uma Esquerda que só espanta pela zombaria que provoca; entre a astúcia prevencionista dos nossos «intelectuais» que sintetizam, pelo alheamento cívico, a mediocridade generalizada; entre a detracção e a subserviência que garante a vidinha a uns tantos - o português, a olho nu, é isto: fatigado, arquejante, indiferente, porque miseravelmente traído nas suas mais asseadas esperanças.

APOSTILA 1 – Não sou frequentador habitual da revista «Visão»: é exorbitantemente óbvia, excessivamente cautelosa, seraficamente virtuosa. Não chateia, não irrita, não incomoda, não faz pensar: é o «centrão», indolor, incolor. Porém, na penúltima quinta-feira, a entrevista a Pedro Santana Lopes e a ameaça contida na «chamada» de capa, suscitaram a minha atenção. Onze páginas de um texto abaixo do medíocre, no qual o actual primeiro-ministro nada diz de novo ou de original. A culpa não é dele: as perguntas são primárias, básicas, desprovidas de qualquer interesse. «Levezinhas, fresquinhas e futeizinhas», diria o meu amigo Vítor Bandarra. Com outro interlocutor, Santana Lopes revelaria, certamente, coisas interessantes. Assim sendo, foi o que foi: perda de tempo.

APOSTILA 2 – O estimável Carlos Vaz Marques afirmou, no programa da simpática Bárbara Guimarães (SIC-Notícias), que «descobrira» Francisco Umbral há cerca de quinze anos, e acrescentou que, antes desse pessoal «achado», o escritor espanhol era desconhecido em Portugal. Afirmação impetuosa, para não dizer leviana ou imprevidente. Há mais de trinta anos Umbral era lido e comentado por vários daqueles portugueses que foram o rosto de um certo modo de ser cultural. Umbral e outros mais – «descobertos», muito depois, por pessoas tão estimáveis como Carlos Vaz Marques.

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