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O martelo

Num futuro muito próximo os imigrantes serão o nosso petróleo. Sem eles Portugal não tem futuro. Perante isto deixar andar como até aqui não é definitivamente uma solução viável.

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A Presidente da Câmara de Vila do Rei confrontada com a desertificação humana no seu concelho da Beira Baixa decidiu agir. Foi ao Brasil, abriu concurso com regras claras, recebeu candidaturas e escolheu segundo os seus próprios critérios um conjunto de cidadãos brasileiros com vontade de trabalhar e viver em Portugal. Deu com isto uma lição a muitos dos seus colegas autarcas em semelhante situação que não passam da lamúria e da exigência de medidas aos outros. Deu também uma lição ao governo que continua a tratar a imigração como um mero caso de polícia e deu acima de tudo uma grande lição aos portugueses em geral porque mostrou como esta questão pode ser encarada de forma civilizada.

A imigração é um problema das sociedades avançadas. Apesar das crises económicas e de muito desencanto o ocidente mantém um nível de vida muito acima daquele que se encontra na maioria do restante mundo. A atracção de grandes massas desesperadas é por isso natural, com todo o conjunto de tristes peripécias que daí advêm. Desde a vida clandestina, à repressão policial, à exploração, à degradação existencial. Os imigrantes raramente conseguem sair da situação de párias do mundo. Rejeitados pelos seus países de origem continuam a ser rejeitados nos locais onde depositaram tantas e tão infundadas esperanças. É uma tragédia com um dimensão monumental.

Contudo esta história tem um reverso. A Europa envelhecida e decadente precisa de sangue novo, sem o qual não consegue manter o seu elevado nível económico. A imigração é vital para a Europa. Tal como o foi e continua a ser por exemplo para os Estados Unidos, de que tivemos recentes e muito esclarecedores relatos com a crise dos latino-americanos.

Acontece que no caso português a questão da imigração é ainda mais decisiva, pois sem ela o país extingue-se. O baixo nível de natalidade e o envelhecimento da população não colocam só problemas à segurança social, mas representam uma efectiva ameaça à viabilidade de Portugal. Já hoje é evidente que uma boa parte da crise estrutural que nos afecta deriva de termos uma população tão diminuta. Por cá, aos negócios, cultura e ciência, falta quantidade populacional e massa crítica para se poder evoluir. Para mais estamos num canto da Europa com acrescidas dificuldades de exportação e diminuta circulação de viajantes.

É por tudo isto que não se entende a forma ligeira como a classe política, todos os partidos incluídos, encaram o problema. Uns insistindo num nacionalismo inconsequente face à realidade do mundo, outros metendo a cabeça na areia e alguns buscando dividendos de curto prazo com discursos xenófobos e criação de inimigos de ocasião.

A política de imigração em Portugal tem sido de uma enorme irresponsabilidade. Todos sabem que no dia em que a economia começar a crescer vai ser preciso «importar» milhares de imigrantes sem os quais tudo estagnará. A situação faz lembrar a conhecida frase de Abraham Maslow: se só temos um martelo todos os problemas se parecem com um prego. E em Portugal cada governo só parece empenhado em arranjar um martelo ainda maior que o anterior.

É por tudo isto que a iniciativa da Presidente de Câmara de Vila do Rei me parece tão inovadora. Ela mostra como se pode olhar o problema sem ver nele imediatamente um prego onde há que bater. Sendo certo que Portugal precisa de imigrantes, e muitos, é melhor ter-se uma atitude pró-activa em vez de deixar as coisas correr ao sabor dos dramas da clandestinidade. Duas coisas parecem urgentes. Primeiro há que desmontar o racismo impregnado que afecta classe política, media e população em geral. Há gente, boa, medíocre e má em toda a parte. E, já agora, Portugal tem objectivamente mais medíocres do que bons senão não tinha chegado ao estado lastimoso em que se encontra. Pretender que os imigrantes são um foco de problemas, crime e até que tiram o lugar a portugueses, é não só mentira como um pensar repugnante naquilo que representa de generalização e xenofobia. Dar visibilidade aos imigrantes, às suas vidas e contributos para a sociedade, é por isso fundamental. Em segundo lugar é evidente que a política de imigração tem que mudar radicalmente. O actual sistema não funciona e só favorece a clandestinidade. Portugal tem que adquirir capacidade de escolha dos seus imigrantes, procurar aptidões específicas e oferecer-lhes condições de vida.

Em conclusão. Num futuro muito próximo os imigrantes serão o nosso petróleo. Sem eles Portugal não tem futuro. Perante isto deixar andar como até aqui não é definitivamente uma solução viável.

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