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O fim do emprego

Fala-se do desemprego como espécie de borrasca que logo irá passar. A curva que por estes dias se assemelha ao monte Evereste, voltará a descer até às planícies do pleno emprego.

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Fala-se do desemprego como espécie de borrasca que logo irá passar. A curva que por estes dias se assemelha ao monte Evereste, voltará a descer até às planícies do pleno emprego. Passos Coelho não se cansa aliás de prometer que depois dos sacrifícios os portugueses regressarão ao trabalho e ao enriquecimento. Já pelas bandas da oposição exigem-se soluções imediatas sob a forma das chamadas "políticas de emprego" e, sobretudo, através do investimento em Obras Públicas que dá trabalho a muitos trolhas e a uns quantos engenheiros.

Infelizmente a realidade é outra. O emprego acabou. As novas tecnologias, cada vez mais acessíveis, velozes e produtivas, associadas à emergência de gigantescas massas financeiras que governam o mundo numa lógica de acumulação e não de produção, estão a destruir os empregos que restam e a criar vastas multidões de desocupados. A componente humana da produtividade é cada vez menos relevante. Os processos e as máquinas são determinantes.

Assim, os muitos milhares de portugueses que nestes últimos anos "caíram" no desemprego, salvo raras exceções, nunca mais encontrarão outro. Terão de se contentar com subsídios, estágios, rendimentos mínimos, caridade e, de vez em quando, um ou outro serviço precário e mal pago. Os jovens também não terão melhor sorte. Nasceram na transição entre uma sociedade do pleno emprego para uma sociedade da ocupação intermitente.

Esta visão pode parecer exagerada, mas os dados estão aí. Veja-se o caso português. A estratégia da direita de desmantelamento da economia portuguesa está, de facto, a "limpar" o ambiente daquilo que é obsoleto, atrasado e pouco produtivo. A maioria das falências dá-se em pequenas e médias empresas incapazes por razões financeiras, má gestão ou pura ignorância, de se modernizarem e adaptarem ao novo mundo das tecnologias avançadas. São elas que lançam todos os dias milhares de portugueses no desemprego. Gente pouco preparada e habituada a um tipo de trabalho de baixa produtividade. Ninguém os quer, nem vai mais querer.

Esta situação pressiona as empresas que subsistem a se reestruturarem e modernizarem. O que significa introduzir mais tecnologia e, portanto, diminuir drasticamente a componente humana. Existe uma clara correspondência entre a produtividade e a redução do número de trabalhadores. As fábricas mais produtivas são geralmente as que empregam menos gente.

Quando Passos Coelho diz que a austeridade vai gerar empresas mais competitivas e inovadoras e, com isso, criar mais empregos, está a ver mal. Não vai. O número de empregos criados pelas empresas modernas será sempre muito inferior ao número de desempregos que a economia arcaica vai provocando.

Por outro lado, as chamadas "políticas de emprego", defendidas por todos e sobretudo pela esquerda, mais não são do que subsídios de desemprego mascarados. Nuns casos na forma de injeções de liquidez nas empresas, noutros enquanto senhas de formação. Sendo certo que a formação é a única coisa que pode "salvar" uma pessoa do verdadeiro tsunami civilizacional que estamos a viver, o que é oferecido pelo estado e pelas empresas do ramo é invariavelmente mal concebido e inútil. A formação assente num modelo de repetição e especialização depressa se vê ultrapassada pela evolução vertiginosa das tecnologias e do conhecimento. Porque, convenhamos, o trabalho repetitivo pode sempre ser substituído com vantagem por uma máquina. No campo da atividade produtiva vamos assim tendo, de um lado, uma elite que controla os meios tecnológicos de produção, e, do outro, enormes massas de biscateiros precários.

Em suma, insistir no modelo do crescimento constante e do pleno emprego é perder tempo. E é enganar as pessoas. Melhor seria começar a pensar seriamente na sociedade sem trabalho assalariado para a qual vamos caminhando. É que há muitas ideias. Desde uma melhor distribuição da riqueza, que urge, a novas ocupações fazendo uso das tecnologias avançadas, a um investimento massivo na ciência e na cultura ou, o que também não está mal visto, irmos todos de férias para a vida e deixar os robôs a trabalhar, como sugere Marshal Brian.



Este artigo de opinião foi escrito em conformidade com o novo Acordo Ortográfico.

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