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O burlesco e o patético

Durante dois anos este Governo foi, apenas, ruído, inépcia e narcisismo. Emoldurado num empreendimento antisocial, tem sido uma embrulhada ideológica e um espalhafato de temperamentos, ...

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Durante dois anos este Governo foi, apenas, ruído, inépcia e narcisismo. Emoldurado num empreendimento antisocial, tem sido uma embrulhada ideológica e um espalhafato de temperamentos, nos significados que cada um destes conteúdos esclarece e dissimula. Nenhum membro do Executivo tem algo a ver com qualquer de entre eles. Não há projecto comum quando individualmente o entendimento é nulo.

Como acentua Miguel Veiga, fundador do PSD, este Governo parece uma espécie de reconciliação com o mal: não satisfaz ninguém e é uma agressão a toda a gente. Assim como muitos mais outros sociais-democratas, o grande advogado do Norte, (que é, simultaneamente, um notável homem de cultura e um espírito superior) não se cansa de considerar a participação do CDS-PP no Governo como absurda no desmedido protagonismo, e excessiva quanto ao número e à importância das pastas que administra.

O resultado das eleições deu razão às vozes protestatárias. Ao empurrar o PSD para zonas da extrema-direita, o CDS-PP, ou, melhor, o seu coriféu, Paulo Portas, através de um traço de carácter mal resolvido, precipitou a Coligação na hecatombe. Mas o protocolo deste extravagante Executivo nasceu de um desacerto inicial e de um defeito de raiz, consubstanciados numa pulsão agressora e numa desarrumação ideológica impeditivas de qualquer compromisso social lógico. A Conferência Episcopal não fez da crítica ao Governo uma metáfora amena. E tanto D. José Policarpo, como D. Manuel Martins ou D. Januário Torgal Ferreira interrogaram-se sobre a questão de saber «porquê» e com que «fim» milhares e milhares de trabalhadores são sacrificados no altar do «equilíbrio orçamental». Com afectação e sobranceria, Durão Barroso y muchachos apontaram Dona Manuela Ferreira Leite como sendo a sacerdotisa das Finanças. Agora, pedem a cabeça da sacerdotisa.

Os transes estilísticos dos tenores da Coligação variam entre o burlesco, o patético e o surreal. E querem fazer-nos passar por idiotas. Quando o primeiro-ministro se declara assaz estimulado pela hecatombe eleitoral, e reafirma prosseguir no «recto caminho» traçado pelo «programa», não sabemos do que fala, do que significa aquilo de que fala, e a que «programa» se refere.

A dinâmica de vitória do PS é uma evidência. E a queda acentuada da Coligação não é de agora. A «remodelação» (estranhamente exigida pelos socialistas, que deviam, isso sim, constituir-se como alternativa) nada vai resolver: não se «remodela» o que não tem «modelo». Fonte inesgotável de erros e de deformidades, a «presença» do CDS-PP no Governo vai ser drasticamente reduzida, primeiro sinal do seu inexorável definhamento. Sei do que falo.

APOSTILA 1 - O Canal 2 da RTP (é assim que ele se chama?) tem sido uma agradável surpresa. A organização interna da programação merece nota alta. Começa a ser o meu canal preferido. E, com algumas alterações, poderá vir a ser o canal favorito de muita gente. A informação diária é sóbria, eficaz e notoriamente equilibrada. Os comentadores não são de uma banda só. Urgente, é que o Euronews seja transmitido a horas decentes. O Magazine cultural é débil, mal estruturado, e carece de linha editorial ajustada. Precisa de controvérsia, de análise contraditória, de crítica. Mas o Canal 2 é uma agradável surpresa, repito. E apraz-me dizê-lo.

APOSTILA 2 - O semanário «Independente» tem vindo a publicar uma série notável de notáveis livros de notáveis autores. Foram escabichar em jornais, revistas e outras publicações e removeram, de páginas tumularmente esquecidas, grandes textos de gente como Agustina, Victor Cunha Rêgo, O’Neill, Sophia, José Rodrigues Miguéis, Cesariny e, à data, Manuel Hermínio Monteiro. O livro deste último («Urzes», belo título) revela um grande prosador e um espírito muito acima da média. Hermínio era um ser humano admirável de afabilidade, cortesia – além do editor incomum que animou e fez da Assírio & Alvimo o que a Assírio & Alvimo o que hoje é. O «Independente» demonstra-o escritor de coturno alto. A ler e a amar. Ah, já me esquecia: as capas levam espantosas caricaturas de André Carrilho. Uma série de colecção.

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