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28 de Dezembro de 2005 às 13:59

Euromilhões

Face às expectativas consensualmente pessimistas relativamente aos fundos comunitários, não pode deixar de se salientar que o Governo e a diplomacia portuguesa protagonizaram uma clara vitória nesta última Cimeira Europeia.

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O Acordo a que chegaram os 25 constitui um autêntico presente natalício que, com mérito, brindou o primeiro-ministro português, José Sócrates!

O desafio agora é o de fazer uma gestão adequada dos fundos comunitários num contexto em que possa existir a percepção, errada, de que somos beneficiários de um excesso de recursos financeiros! Parafraseando a publicidade relativa ao Euromilhões, há que contrariar a tendência natural para se ser «excêntrico» num país aonde há muitas fragilidades a superar.

Seria injusto não reconhecer que a nossa adesão europeia e o afluxo de fundos comunitários contribuíram, decisivamente, para dar continuidade às profundas mudanças no país iniciadas no início dos anos 1970. Tal como nos é mostrado por Maria Filomena Mónica no seu saboroso ensaio sobre a «Evolução dos Costumes em Portugal, 1960-1995», com a provável excepção da Espanha e da Irlanda, «nenhum outro país europeu conseguiu liquidar o campesinato, alterar a taxa de fecundidade, mudar os padrões de consumo, diminuir a mortalidade infantil, instaurar o sufrágio universal, transformar as relações Estado-Igreja, criar uma classe média, abrir as fronteiras a pessoas e bens, escolarizar a população, liquidar um Império, à velocidade a que o fez Portugal. Na economia como nas almas, o país está irreconhecível».

Apesar dos fundos comunitários e de muitos outros factores que induziram transformações profundas na economia e na sociedade portuguesa, existe um conjunto de desígnios que ainda não fomos capazes de alcançar: a presença expressiva de um núcleo duro de actividades económicas com vantagens competitivas na economia global, a qualificação adequada das pessoas e das instituições, a preservação da qualidade ambiental e uma estratégia clara em termos de ordenamento de território, entre outros. A superação destes constrangimentos e debilidades exige mutações substanciais na arquitectura e nos critérios de decisão públicos em matéria de fundos comunitários.

Em primeiro lugar, há que passar dos actuais 11 programas sectoriais para um número mais restrito de programas que apostem em políticas mais integradas de natureza mais transversal que valorizem a dimensão territorial. Não se trata apenas (e já não seria pouco!) de um problema de concepção. O grande desafio é pôr a funcionar «no terreno», com eficácia e eficiência, programas que apelam à cooperação entre vários ministérios. É difícil ? mas é absolutamente decisivo que tal aconteça!

Em segundo lugar, temos que ser capazes de estabelecer prioridades bem definidas e ser muito mais selectivos nas escolhas dos projectos. Esta nova postura tem implicações complexas na gestão política dos recursos públicos: É necessário passar de um quadro caracterizado pela subsídio-dependência de natureza clientelar para uma aplicação dos recursos baseada no mérito e nas escolhas políticas sufragadas pelos eleitores. É necessário ousar definir e executar uma visão estratégica para o nosso futuro comum, num país que está mais habituado a navegar à vista de costa.

Em terceiro lugar, é preciso saber superar a síndrome do novo-rico esbanjador, pateta e deslumbrado. Existe a crença de que os portugueses (e, porventura, todos os outros povos!) reagem bem quando são confrontados com níveis de exigência elevados e que, pelo contrário, se sentem menos mobilizados e são mais propensos a um certo «baixar de braços» quando vislumbram um ambiente futuro mais protector e menos desafiante. Os fundos comunitários não podem continuar a ser perspectivados como um escudo protector das nossas fragilidades mas, antes, como um trampolim para saltos qualitativos na nossa capacidade de afirmação na economia global.

Apesar de toda a dinâmica de mudança que caracterizou as últimas duas décadas, os Portugueses já não se revêem, definitivamente, na imagem de um povo simpático e acolhedor a viver num país com muito sol e boas praias! A nossa ambição aumentou! Por exemplo, já não nos satisfaz a imagem muito marcada pela presença ainda significativa de um tecido empresarial com défice de visão estratégica e sobre-especializado em actividades baseadas na utilização de baixas qualificações, pouco intensivas em inovação e de baixo nível tecnológico.

Apesar das assimetrias que continuam a caracterizar a economia portuguesa, esta imagem pode constituir uma avaliação injusta de um conjunto, cada vez mais vasto, de empresas e de centros de saber que procuram ter uma postura inovadora e adaptar-se às exigências crescentes de uma economia cada vez mais globalizada. A valorização e a motivação dos centros de excelência existentes e a criação de um ambiente propício à emergência de novos protagonistas constituem linhas de orientação promissoras para o novo ciclo de gestão dos fundos comunitários.

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