Opinião
Ban Ki-moon - Ban Ki-moon, vice-presidente do The Elders, foi secretário-geral das Nações Unidas de 2007 a 2016. Antes, foi ministro dos Negócios Estrangeiros da Coreia do Sul.
© Project Syndicate, 2008. www.project-syndicate.org
26 de Novembro de 2008 às 12:00
Encontrar soluções universais
O mundo não precisa que lhe lembrem a urgência do actual momento histórico. Percebemos isso diariamente nas notícias. Um dia, algum grande banco, seguradora ou fabricante automóvel anuncia uma perda recorde. No dia seguinte, chegam informações sobre o impacto nas nações e nos povos menos aptos a suportarem estes golpes os mais pobres dos pobres do mundo.
Nos últimos dois anos, lidei com muitas crises, desde Darfur à República Democrática do Congo, passando por problemas de âmbito mundial como a crise da subida dos preços dos alimentos e as alterações climáticas. Mas a crise financeira é única e potencialmente devastadora.
Aquilo que começou por ser uma crise puramente financeira tornou-se uma crise económica que se estendeu por todo o planeta. Todas as projecções de crescimento foram revistas em baixa. E apesar de existirem sinais de que as economias mais maduras estão a recuperar do pânico que congelou os mercados do crédito, não estamos ainda fora da zona de perigo – nem nada que se pareça.
A minha maior preocupação é de que a crise financeira de hoje evolua para uma crise humanitária amanhã. Se quisermos proteger os meios de subsistência e a esperança no futuro de milhões de pessoas, teremos de reconhecer aquilo a que Martin Luther King Jr. chamou de "feroz urgência do momento".
Muitos peritos financeiros diagnosticaram as causas da crise. Os responsáveis pela concepção de políticas ofereceram medidas para a solucionar. Ouvimos falar de novas regulações na banca e até de uma nova arquitectura financeira global.
Tudo isto é desejável. No entanto, apesar de eu aplaudir este debate e reconhecer a plena necessidade de se adoptarem medidas de longo prazo, estou muito consciente do tempo. Os problemas imediatos requerem respostas imediatas. Mas também não podemos permitir que a crise financeira se torne uma razão para negligenciarmos outras questões muito importantes: os inaceitáveis níveis de pobreza e fome, a crise alimentar, as alterações climáticas. Isso só iria contribuir para exacerbar a já frágil situação política e de segurança em muitos dos países mais afectados.
Na cimeira financeira do G-20, realizada há perto de duas semanas em Washington, transmiti quarto mensagens que reflectem as minhas conversas com vários países-membros das Nações Unidas.
Em primeiro lugar, precisamos de um pacote de estímulo global para dar a volta a esta crise. Recentemente, o Fundo Monetário Internacional (FMI) prognosticou que praticamente todo o crescimento mundial em 2009 provirá das economias emergentes e em desenvolvimento. Consequentemente, serão necessários fortes aumentos da despesa pública e privada em muitas regiões do mundo, de forma a responder à diminuição da procura.
Em segundo lugar, estes pacotes financeiros de apoio e de resgate não podem terminar nas fronteiras dos países mais ricos. Os mercados emergentes e outros países em desenvolvimento vão precisar de oxigénio, sob a forma de linhas de crédito e do financiamento do comércio. Além disso, devemos opor-nos ao proteccionismo. Sem um comércio aberto, o crescimento e o desenvolvimento poderão desabar por completo.
Em terceiro lugar, parte do nosso estímulo global deveria provir dos compromissos que a comunidade internacional assumiu em matéria de ajuda. No actual contexto, o cumprimento dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio (OMD) é mais do que um imperativo moral. É uma questão de necessidade económica pragmática.
Por último, a inclusão deve ser o nosso lema. No nosso mundo interdependente, estes desafios só podem ser superados através do reforço do multilateralismo – um multilateralismo justo, flexível e responsável, com líderes de todos os cantos do mundo. Apesar de as nações do G-20, cujos líderes estiveram reunidos em Washington, representem perto de 80% da produção, comércio e investimento mundial, a realidade é que mais de 170 países – que representam um terço da população do planeta – não estiveram presentes. É nossa responsabilidade escutar as suas vozes e responder às suas preocupações.
Os próximos meses serão cruciais. Muitos de nós irão reunir-se novamente, em Doha, para avaliar a evolução do financiamento destinado ao desenvolvimento. Há seis anos, o presidente George W. Bush e outros líderes adoptaram os ambiciosos objectivos que constituem o núcleo dos ODM. A História julgar-nos-á severamente se não conseguirmos honrar esses compromissos. Assim, insto todas as nações, ricas e pobres, a enviarem os seus mais altos representantes a Doha, plenamente determinados para que se faça aquilo que deve ser feito.
Em Dezembro, os nossos negociadores sobre alterações climáticas vão reunir-se na Polónia. Dispomos de um ano até que se reúnam em Copenhaga – um ano para chegarmos a um acordo que todas as nações possam aceitar. Quanto mais depressa tivermos um acordo, mais depressa teremos os investimentos e o crescimento "verde" de que tanto precisamos.
Os grandes desafios que nos esperam estão interligados: a economia global, as alterações climáticas e o desenvolvimento. Precisamos de soluções para cada um deles que sejam soluções para todos.
Aquilo que começou por ser uma crise puramente financeira tornou-se uma crise económica que se estendeu por todo o planeta. Todas as projecções de crescimento foram revistas em baixa. E apesar de existirem sinais de que as economias mais maduras estão a recuperar do pânico que congelou os mercados do crédito, não estamos ainda fora da zona de perigo – nem nada que se pareça.
Muitos peritos financeiros diagnosticaram as causas da crise. Os responsáveis pela concepção de políticas ofereceram medidas para a solucionar. Ouvimos falar de novas regulações na banca e até de uma nova arquitectura financeira global.
Tudo isto é desejável. No entanto, apesar de eu aplaudir este debate e reconhecer a plena necessidade de se adoptarem medidas de longo prazo, estou muito consciente do tempo. Os problemas imediatos requerem respostas imediatas. Mas também não podemos permitir que a crise financeira se torne uma razão para negligenciarmos outras questões muito importantes: os inaceitáveis níveis de pobreza e fome, a crise alimentar, as alterações climáticas. Isso só iria contribuir para exacerbar a já frágil situação política e de segurança em muitos dos países mais afectados.
Na cimeira financeira do G-20, realizada há perto de duas semanas em Washington, transmiti quarto mensagens que reflectem as minhas conversas com vários países-membros das Nações Unidas.
Em primeiro lugar, precisamos de um pacote de estímulo global para dar a volta a esta crise. Recentemente, o Fundo Monetário Internacional (FMI) prognosticou que praticamente todo o crescimento mundial em 2009 provirá das economias emergentes e em desenvolvimento. Consequentemente, serão necessários fortes aumentos da despesa pública e privada em muitas regiões do mundo, de forma a responder à diminuição da procura.
Em segundo lugar, estes pacotes financeiros de apoio e de resgate não podem terminar nas fronteiras dos países mais ricos. Os mercados emergentes e outros países em desenvolvimento vão precisar de oxigénio, sob a forma de linhas de crédito e do financiamento do comércio. Além disso, devemos opor-nos ao proteccionismo. Sem um comércio aberto, o crescimento e o desenvolvimento poderão desabar por completo.
Em terceiro lugar, parte do nosso estímulo global deveria provir dos compromissos que a comunidade internacional assumiu em matéria de ajuda. No actual contexto, o cumprimento dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio (OMD) é mais do que um imperativo moral. É uma questão de necessidade económica pragmática.
Por último, a inclusão deve ser o nosso lema. No nosso mundo interdependente, estes desafios só podem ser superados através do reforço do multilateralismo – um multilateralismo justo, flexível e responsável, com líderes de todos os cantos do mundo. Apesar de as nações do G-20, cujos líderes estiveram reunidos em Washington, representem perto de 80% da produção, comércio e investimento mundial, a realidade é que mais de 170 países – que representam um terço da população do planeta – não estiveram presentes. É nossa responsabilidade escutar as suas vozes e responder às suas preocupações.
Os próximos meses serão cruciais. Muitos de nós irão reunir-se novamente, em Doha, para avaliar a evolução do financiamento destinado ao desenvolvimento. Há seis anos, o presidente George W. Bush e outros líderes adoptaram os ambiciosos objectivos que constituem o núcleo dos ODM. A História julgar-nos-á severamente se não conseguirmos honrar esses compromissos. Assim, insto todas as nações, ricas e pobres, a enviarem os seus mais altos representantes a Doha, plenamente determinados para que se faça aquilo que deve ser feito.
Em Dezembro, os nossos negociadores sobre alterações climáticas vão reunir-se na Polónia. Dispomos de um ano até que se reúnam em Copenhaga – um ano para chegarmos a um acordo que todas as nações possam aceitar. Quanto mais depressa tivermos um acordo, mais depressa teremos os investimentos e o crescimento "verde" de que tanto precisamos.
Os grandes desafios que nos esperam estão interligados: a economia global, as alterações climáticas e o desenvolvimento. Precisamos de soluções para cada um deles que sejam soluções para todos.
Mais artigos de Opinião
Governar a geoengenharia
18.03.2019
Encontrar soluções universais
26.11.2008