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24 de Junho de 2002 às 15:09

«...como uma bola colorida...»

… "entre as mãos de uma criança"… lembram-se do poema e da música? …

José Pedro Soeiro, Deloitte Consulting

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… "entre as mãos de uma criança"… …lembram-se do poema e da música? …

… nunca o poema fez tanto sentido para mim como nos tempos de hoje. Se bem se recordam, o Poeta descreve os feitos do Homem ao longo da sua História, em que constantemente se reinventou e com isso moveu o Mundo, com uma fórmula mágica: "o sonho que comanda a vida".

A "depressão comportamental" que progressivamente nos tem afectado como Povo, já produziu incontáveis números de artigos de opinião, inquéritos a personagens famosas, etc. … ..."são incultos", dizem uns, "é bem feito" dizem outros, "somos pequeninos…" outros dizem…

Deixem-me tentar pôr de lado as fórmulas mágicas para a saída do nosso actual "estado de alma", assente em teorias macroeconómicas e aspectos técnicos de produtividade, aumentar despesas com o investimento, e afins. Deixem-me ainda tentar pôr de lado os velhos "desígnios nacionais", e o conformismo do "somos-assim-porque-somos-assim-e-como-eu-sozinho-não mudo-nada-o-melhor-é-estar-quieto-e-dizer-"é-a-vida!!!" "

Vamos olhar para NÓS. NÓS como indivíduos, como Pessoas e observemos as atitudes e comportamentos que cada um tem.

Comecemos pelo nosso comportamento em sociedade. Quantos de nós se lembram dos nossos pais e avós praticarem frequentemente (e com gosto) actividades colectivas na sua vila, aldeia ou cidade? Quer fosse num rancho folclórico, num grupo coral, no colectivo de ir à missa, na bancada do clube de futebol, ou no café da esquina a jogar à bisca…

… "!!!!Folclore?, Grupo Coral?, Missa? … eu não tenho tempo", dizemos hoje com uma facilidade impressionante…

… e nas raras excepções que aceitamos algum convívio social, procuramos a exclusividade… no lugar cativo na bancada VIP de um clube de Futebol, ou no clube de beneficência, mas de pessoas exclusivas …

E em relação aos nosso vizinhos? Quantos de sabemos quem são? E os nosso filhos, brincam com os deles? Ou então, será que já nos oferecemos para ficar com os filhos deles, quando fosse necessário? Já nos aconteceu alguma vez corremos para apanhar o elevador mais depressa para evitarmos, simplesmente, falar com eles?

… não é por acaso que a procura de condomínios fechados em Portugal tem crescido exponencialmente… "é por causa da crescente insegurança" dizem uns…

E em casa? Quantos filhos tiveram os nossos pais e avós e quantos temos nós?… "é o dinheiro", dizem uns, "a vida que hoje temos não o permite" dizem outros…

Deixando de lado a parte pessoal, vamos fazer uma viagem até ao mundo do nosso local de trabalho… lembram-se de como os nosso pais e avós viviam face ao trabalho? Emprego para toda a vida… estável, mal pago, mas tranquilo… chefe era chefe… "colegas eram colegas" …

…as coisas foram mudando, a sociedade começou a privilegiar a competência e o mérito como factores de crescimento, mas em meu entendimento, seguimos, por vezes, por caminhos menos correctos … …stock options; bónus individual; sala fechada e reservada no escritório… tudo a privilegiar o desejo de alcançar com base no mérito INDIVIDUAL, privilegiando pouco a conquista colectiva…

… curioso como às vezes nos soa tão mal a palavra "colega".

Recordo-vos que, por exemplo, na cultura tradicional Japonesa, a pessoa mais importante numa empresa não é aquela que tem o maior gabinete fechado, mas aquela que está no MEIO de uma enorme sala, rodeada pelos seus colaboradores. Estar perto da janela, significa ter ainda um longo caminho ainda a percorrer… estar fechado numa sala… significa que já nos perdemos no caminho… Curioso, não? Fomenta-se e potencia-se a sapiência individual, colocando as qualidades individuais ao serviço de todos.

… deixemos a cultura Japonesa e apanhemos um avião até Nova Iorque. Conseguimos ficar indiferentes a tamanho gigantismo, a tamanha força, a tamanha prova de orgulho colectivo? … eu não…

Mas por outro lado, se por acaso estivermos a passar pelo Mosteiro dos Jerónimos e encontrar-mos um americano usando uma T-Shirt com uma bandeira do seu País, seria com facilidade que olharíamos para ele e pensávamos: "pois…, é americano!, …é um inculto, só pensa no Basebol, no McDonalds… …nós não! Nós até já fomos muito bons!!! Até temos os Jerónimos!!!, que quando foi feito, ainda eles andavam atrás dos búfalos!!!"…

… uma vez mais curioso, não? Admiramos as conquistas colectivas dos Americanos, e individualmente temos a imediata tendência de nos sentirmos "superiores culturalmente"… a realidade, é que apesar dos objectivos individuais do Povo Americano serem semelhantes aos nossos (sucesso financeiro, escritório individual enorme num 101º andar em "Down Town"), o seu sentido colectivo permite-lhes potenciar o sonho colectivo.

… Dois modelos de comportamento completamente distintos (o Japonês e o Americano), mas que chegam a um objectivo final comum…

… e por cá?… talvez tenhamos um modelo explosivo, diria eu… individuais na nossas células familiar e social, individuais na nossa célula empresarial…

… e isto até funciona bem quando os períodos são positivos, … a empresa vai bem, o ordenado e afins até engordam com o passar dos anos… … o problema é que nem sempre é a crescer…, e quando desce, meus caros, o castelo de areia desmorona-se com tanta facilidade, tanta facilidade, … que, de repente, nós que fomos habituados a vencer individualmente, a sermos vistos pelos outros como super-homens, de repente, corporizamos individualmente o insucesso e somos incapazes de dizer "eu sozinho não consigo!!!! por favor ajuda-me!" (o problema é que fomos ensinados ao longo do tempo que esta frase é sinal de fraqueza… e a fraqueza não se perdoa…).

Estou claramente convencido que as Pessoas e as Empresas que vão vencer no futuro são aquelas que percebam claramente que este modelo de comportamentos está esgotado, e que quem fomentar a criatividade, o desenvolvimento comportamental de atitudes não individuais e a humildade no crescimento, estas Empresas e suas Pessoas estarão mais preparadas para progredirem como a tal "bola colorida, entre as mãos de uma criança".

Os ingredientes estão todos dentro de cada um de nós (somente um pouco adormecidos), e é claramente uma questão de sobrevivência a prazo. Sonhar, procurar a mais valia de cada um, potenciar o sucesso em colectivo, dizer "errámos" quando erramos e pensar o porquê, "ganhámos" quando ganhamos… …voltando a acordar de manhã e dizer com verdadeiro sentido "hoje vou crescer um pouco mais. BOM DIA MUNDO!"

A vida é mesmo muito curta. Quando um dia tivermos que fechar os olhos, o que nos vai sobrar, são as sensações de tudo o que vivemos. Temos duas escolhas: ou ficamos com as sensações cinzentas, ou com as coloridas… a escolha é de cada um de nós.

Um abraço e façam o favor de serem felizes.

José Pedro Soeiro

Senior Manager

jpsoeiro@dc.com

 

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