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29 de Dezembro de 2004 às 15:41

China - a potência económica do século XXI (I)

No comércio internacional e na economia global, estão a emergir um conjunto de novos e dinâmicos players, nomeadamente os que englobam os chamados BRIC’s (Brasil, Rússia, Índia e China).

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1. A Dinâmica do Comércio Internacional e a Emergência da China

No comércio internacional e na economia global, estão a emergir um conjunto de novos e dinâmicos players, nomeadamente os que englobam os chamados BRIC’s (Brasil, Rússia, Índia e China).

Destes BRIC’s é de salientar os casos especiais da Índia e da China. A manterem-se as actuais taxas de crescimento, a China ultrapassaria os EUA em 2041 como maior economia mundial e a Índia ultrapassaria o Japão em 2032.

Os BRIC’s têm actualmente cerca de 15% do PIB do G6. Segundo os economistas da Goldman Sachs, o PIB em dólares dos BRIC’s ultrapassará em 2039 o do G6 - França, Alemanha, Itália, Japão, Reino Unido e EUA. Se assim acontecer, daqui a 50 anos apenas os EUA e o Japão, dos actuais G6, estarão entre as 6 maiores economias mundiais.

Contudo, em termos de rendimento per capita, mesmo daqui a 50 anos, ele ainda será menor que o do actual G6, dado o elevado peso demográfico destas novas potências económicas.

2. Os Modelos de Desenvolvimento Económico da Índia e da China

A China começou o seu "takeoff" por volta dos anos 1980. A China usou a sua enorme poupança interna para construir a sua infra-estrutura e recorre ao investimento directo estrangeiro (IDE) para construir fábricas e para ganhar a expertise necessária. A ideia de Deng Xiaoping era revitalizar o comunismo chinês injectando-lhe doses limitadas de capitalismo, vendo o IDE como um expediente útil para subir o nível de vida do povo e impulsionar a estatura mundial da China. Só que o remédio provou ser mais potente do que o previsto...

Temos então um fenómeno comparável à queda do muro de Berlim mas demograficamente mais potente: um quinto da humanidade entrou na economia de mercado e na economia mundial.

A Índia começou a sua descolagem económica 10 anos depois da China, estando a transformar-se num grande centro de competências à escala mundial, nas indústrias baseadas na economia do conhecimento, tais como software e serviços de alta tecnologia. Contudo, a qualidade das infra-estruturas - estradas, ferrovias, água, electricidade, ainda é fraca e o IDE é inferior ao caso chinês.

Assim, os dois modelos de desenvolvimento são diferentes: o chinês resultou duma estratégia intencional do Estado, ao passo que na Índia aconteceu mais pelas forças de mercado. Bem se poderá dizer que com a China e a Índia se repete a história dos dois modelos de capitalismo descritos pelo economista francês Michel Albert no seu livro "Capitalismo contra Capitalismo"

A Índia segue o modelo de capitalismo anglo-saxónico com um governo menos intervencionista ao passo que a China alinha com o modelo de capitalismo renano - próprio da Alemanha e do Japão - em que o Estado é mais intervencionista na economia, dirigindo a actividade económica, investindo nas infra-estruturas e decidindo muitas vezes quais as companhias que vão receber fundos públicos e que se podem financiar nos mercados de capitais locais, onde o governo intervêm. Pelo contrário, a menor intervenção estatal indiana abre mais o espaço para os empresários e para o florescimento do empresariado local feito por novos "players".

Tudo isto explica o tipo de empresas que florescem numa e noutra economia.

Nem todas as indústrias terão vantagens comparativas na China. A Índia tem vantagens em segmentos que não requerem grandes infra-estruturas físicas e que não são travados por pesadas regulamentações e restrições governamentais, tais como:

- serviços de software;

- concepção e design:

- call-centers;

- serviços de auditoria e contabilidade.

Aqui, com a ajuda de recursos humanos fluentes em inglês, a Índia tem claramente vantagem. Mas actividades manufactureiras de processo just-in-time que necessitem de estradas e ferrovias eficientes não terão vantagens na Índia.

Tudo isto é particularmente evidente no sector automóvel. O sector desenvolveu-se na China como resultado do Investimento Directo Estrangeiro (IDE), ao passo que na Índia tal foi feito pelo empresariado local com concepção e design próprios que possibilitaram o desenvolvimento duma indústria automóvel nacional que tem também componentes electrónicos e mecânicos de alto valor. Assim, a Índia tem uma produção que depende mais do know-how do que de infra-estrutura física.

Em suma, embora os chineses não tenham falta de espírito empreendedor e de capacidade empresarial, tal é prejudicado ainda por mercados de capitais ineficientes, um sistema bancário com muito crédito mal parado e pela regulação e intervenção governamental em que muitas vezes os burocratas, em vez das forças de mercado, decidem quem é financiado.

3. O Crescimento Económico Chinês e o Peso da China no Comércio Internacional

Tem-se assistido na China a:

- Criação de riqueza em pouco tempo num ciclo inédito de crescimento económico na história da Humanidade;

- Crescimento económico de ordem dos dois dígitos nos últimos 20 anos; 9.7% em 2004;

- Crescimento sem preocupações ambientais e com grandes desigualdades sociais. A China que foi uma das sociedades mais igualitárias a nível mundial, tem hoje um dos maiores "gaps" entre ricos e pobres.

Esse crescimento está a redesenhar os fluxos económicos mundiais: energia, matérias-primas, moedas, sistemas de transportes marítimos e logística à escala mundial.

A China começa assim a fazer pelo lado da procura uma grande pressão nos preços da energia e das matérias-primas, como a indústria ocidental e europeia já está a sentir (Portugal inclusive).

4. China, a Fábrica do Mundo

A China será então a grande plataforma manufactureira do século XXI, devido à dotação de trabalho disponível mas avançará simultaneamente para produtos mais sofisticados baseados na escala de produção e intensidade de conhecimento. Estaremos na fase preliminar de uma das maiores revoluções industriais da história económica mundial.

A China irá superar o tradicional trade-off entre salários baixos e trabalhadores e engenheiros qualificados.

A China transforma-se assim rapidamente na "fábrica do mundo" e indubitavelmente num sério "player" em todas as industrias globais.

A China está assim a afectar as capacidades competitivas de todas as empresas multinacionais devido ao baixo custo de manufactura em preços internacionais, tenham ou não tenham operações com a China.

A China desenvolveu um mix poderoso entre:

- força de trabalho disciplinado e de baixo custo;

- oferta abundante de pessoal técnico habilitado. A China graduou um milhão de técnicos e engenheiros em 2001 e dois milhões em 2002;

- incentivos fiscais e não fiscais para atrair o IDE;

- boas infra-estruturas para suportar a operação de exportação de base manufactureira (rodovias, ferrovias, telecomunicações, electricidade e água).

A China tornou-se o nº1 mundial na produção industrial de têxteis, calçado (53,3% da produção mundial), televisores (30% da produção mundial), frigoríficos (17% da produção mundial), brinquedos (75% da produção mundial), câmaras, bicicletas a motor e sem motor, desktops dos PC’s, DVD’s (41% da produção mundial), cigarros, telefones (50% da produção mundial), máquinas de lavar (23% da produção mundial) e ar condicionado (30% da produção mundial).

Cerca de ¾ das exportações de electrónica vêm de empresas estrangeiras e cerca de 50% das exportações industriais vêm de produtos que foram montados e embalados na China a partir de componentes importados.

As vantagens competitivas da China fazem dela plataforma ideal para a exportação para o resto do mundo. Mas esta plataforma situa-se num ambiente de rápida mudança e ainda com muitos riscos operativos que têm frustrado as possibilidades de lucros de muitas empresas.

A China espera manter as suas vantagens de custos baixos através da migração de população do interior.

A China acredita que vai desenvolver nichos competitivos em novas áreas como:

- Hardware para computadores

- Biotecnologia

Várias empresas chinesas estão a tornar-se competitivas nos mercados globais:

- Haier nos electrodomésticos

- TCL nos televisores

- Lenovo nos PC’s

- Galanz nos microondas

- Huawei nas telecomunicações

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