Opinião
Petróleo, renováveis e sobrecustos
Na electricidade e gás natural há as chamadas tarifas binómias
Na electricidade e gás natural há as chamadas tarifas binómias: uma parte variável, que reflecte os custos variáveis da energia consumida, e outra fixa, que reflecte as tarifas (portagens) de acesso às redes de transporte e distribuição, custos estes que estão relacionados com os investimentos (CAPEX) feitos nessas redes.
Acontece que em Portugal no sistema eléctrico têm vindo a ser encaminhadas para essa parte fixa outros custos, os chamados Custos de Interesse Económico Geral (CIEG), o que é uma aberração porque tal afecta a transparência da formação dos preços e falsifica os sinais dados à operação do sistema. É esta parcela que está a crescer de forma impressionante e não os custos variáveis da energia!
A recente polémica sobre os aumentos dos preços de electricidade e a posição da DECO sobre os CIEG vêm finalmente chamar a atenção para o que tínhamos escrito no Manifesto para uma Nova Política Energética apresentado a 7 de Abril de 2010.
Nos CIEG estão os sobrecustos das energias renováveis e da cogeração, os custos da convergência tarifária das Ilhas com o Continente em que os consumidores continentais pagam a diferença entre os custos insulares mais elevados e os custos no continente para que os insulares paguem os mesmos valores do continente pelos custos de transporte e distribuição, as rendas pagas aos municípios onde passam as redes, os chamados Custos de Manutenção de Equilíbrio Contratual das Centrais Térmicas que anteriormente vendiam à rede através dos Contratos de Aquisição de Energia (CAE) e ainda os sobrecustos das Centrais que ficaram nos CAE.
Neste contexto de total falta de transparência, é pertinente explicar que quando um produtor eólico, ao abrigo do preço político fixado para a Produção em Regime Especial (PRE), vende a electricidade a cerca de 90€/MWh à EDP Universal, o chamado comercializador de último recurso, duas situações existem:
a) A energia produzida é consumida: então o consumidor paga sempre esse preço político da PRE, o qual, para efeitos de contabilidade tarifária, é separado em duas componentes: 1) PG: Preço no mercado grossista corresponde à estimativa do preço médio do mercado grossista (50€/MWh, valor estimado pela ERSE para 2010); 2) Sobrecusto da PRE em relação ao preço no mercado grossista (PG) corresponde pois ao diferencial positivo entre o preço político da PRE e o preço de mercado grossista; esta parcela é incluída nos CIEG e é distribuída por todos os consumidores de electricidade quer os sujeitos à tarifa regulada, quer os que estão em mercado livre (embora com maior peso para os consumidores domésticos, tendo até agora a indústria sido aliviada deste imposto encoberto).
b) A energia produzida é excedentária em relação ao consumo: quando a produção excede o consumo sujeito à tarifa regulada, o Comercializador de Último Recurso, a EDP Serviço Universal, é forçada a revender esse excesso de energia em mercado spot. Esse excedente é então colocado no mercado grossista ao preço de fecho nesse momento desse mercado (Preço Spot), o qual é normalmente muito baixo, tendencialmente zero. É normalmente essa a situação quando se exporta para Espanha a preço zero e que é depois objecto de grande destaque na imprensa. Tendo nós consumidores que pagar essa energia aos produtores ao preço da PRE, vamos recuperar no ajustamento tarifário do ano seguinte essa pequena receita obtida pela EDP Serviço Universal ao vender a energia a esse preço tendencialmente nulo e portanto acabamos por pagar nos CIEG praticamente o preço da PRE! Por isso é que quanto mais exportamos para Espanha mais o consumidor português paga!
O consumidor paga pois sempre (mesmo quando não consome essa energia…), mas o que acontece é que o sobrecusto da PRE em relação aos preços no mercado grossista (PG) vem dissimulado nos CIEG!
Os CIEG atingem em 2011 os 2 500 Milhões de euros e se virmos o seu aumento impressionante ao longo dos últimos anos, constata-se que os custos que aumentam exponencialmente são os sobrecustos da Produção em Regime Especial, basicamente a produção que beneficia de preços políticos determinados pelo Governo como a eólica, a fotovoltaica, a micro-geração e a co-geração, havendo também aumentos nos CMEC e nos sobrecustos dos CAE, derivados de facto de as centrais térmicas sujeitas aos CMEC e aos CAE estarem actualmente a trabalhar menos horas do que estava previsto quando essas centrais entraram em funcionamento, em que foram projectadas para produzir como centrais de base durante a quase totalidade das horas.
Os CMEC e os sobrecustos dos CAE aumentam porque vão pagar justamente a diferença entre o que iriam facturar como centrais de base e o que facturam hoje, remetidas para um mero apoio às eólicas e às solares, quando não há vento ou sol, pois que essas renováveis têm, porque assim foi determinado por imperativo legal, prioridade no acesso à rede.
Assim sendo, quanto mais renováveis intermitentes forem introduzidas no sistema, mais os CMEC e os sobrecustos dos CAE sobem! Poder-se-ia pensar que, uma vez que a sua produção diminui na proporção inversa do crescimento da energia renovável, estas centrais térmicas se estariam a tornar dispensáveis e que a sua equilibragem contratual seria injustificada, tendendo no limite essas centrais a desaparecerem, e com elas esses sobrecustos. Porém, tal não acontece porque o carácter intermitente das renováveis da moda exige a disponibilidade permanente dessas centrais, as únicas capazes de suprirem a falta de vento, de chuva ou de sol quando essa falta ocorre.
No fundo, as renováveis da moda gerando um mix de produção desequilibrado é que são responsáveis pelos sobrecustos das centrais térmicas!
O CEO da EDP vem agora tentar desligar-se do problema, dizendo que não tem nada a ver com os CIEG pois aqui a EDP limita-se a cobrar para depois entregar a receita. Não é bem assim pois que: (1) houve uma mediática joint-venture Pinho-Mexia (frutuosa para os dois!) na "venda" deste produto (as renováveis da moda); (2) a EDP também recebe do CIEG, quer nas suas renováveis (sobrecusto das PRE) quer nas suas térmicas (CMEC)!
Até agora, através duma subsidiação cruzada, o Governo tinha conseguido evitar que este sobrecusto fosse passado para a actividade produtiva, empresas e grandes consumidores, ficando confinado aos domésticos, às microempresas e à iluminação pública. Mas era fácil de prever que com estes aumentos impressionantes nos CIEG, tal teria de ser passado às empresas, como aconteceu agora agravando fortemente a sua competitividade como tínhamos previsto no nosso Manifesto!
Outra falácia é a redução da importação de petróleo devido às renováveis da moda - eólica e fotovoltaica! Aqui a volatilidade do governo é tão grande quanto a volatilidade do vento! Com efeito, o primeiro-ministro em Setembro 2010 afirmava nos EUA que tal poupança seria de 100 milhões de euros/ano, em 22 de Outubro explicava que essas renováveis poupariam 700 milhões de euros anuais de importação de petróleo e por último no fim de Novembro dizia que as renováveis permitiam poupar nos primeiros seis meses do ano 600 milhões de euros na importação de combustíveis fósseis.
Por sua vez, o secretário de Estado Zorrinho dizia em Abril que a poupança anual seria de 500 milhões de euros, tendo emendado em Novembro para 800 milhões de euros. Também a ministra do Ambiente vinha acrescentar "valor" a estes "statements" governamentais, dizendo que as 10 novas barragens iriam poupar a Portugal a importação de 3,3 milhões de barris de petróleo para as centrais termoeléctricas! (só a velha Central de Setúbal é que utilizava petróleo, as actuais usam carvão e gás…).
Ora é preciso que os nossos distintos jornalistas económicos percebam que as renováveis (barragens inclusive) que produzem electricidade não poupam um único barril de petróleo importado pois que: (1) já não utilizamos petróleo na produção de electricidade; (2) o consumo de petróleo é basicamente no sector dos transportes e só quando houver massificação dos veículos eléctricos, o que infelizmente ainda vai levar muito tempo, é que a electricidade substituirá o petróleo.
O INE mostra-nos que de Janeiro a Outubro de 2010, comparado com o período homólogo de 2009, houve um aumento de importações de combustíveis de 1 400 milhões de euros. As renováveis da moda não nos reduzem a dependência aflitiva do petróleo e vamos continuar a importar carvão e gás natural pois continuaremos a precisar das centrais térmicas quando não há sol ou vento! Até Novembro de 2010 houve 15,556 GWh de produção termoeléctrica contra 22,009 GWh no período homólogo de 2009, o que significará então, devido às renováveis, uma poupança de importação apenas de cerca de 174 milhões de euros em gás natural e carvão o que contrasta com um sobrecusto da Produção em Regime Especial bem superior!
A única forma de reduzirmos a importação de petróleo seria a aposta nos biocombustíveis mas esta renovável foi esquecida pelo Governo!
Em suma, com esta política centrada nas renováveis da moda, geraram-se terríveis sobrecustos para a economia e a dependência do petróleo mantém-se intacta!
Quando é que entraremos no realismo energético? Quando é que abandonaremos a mera propaganda política e começaremos a tratar da energia seriamente? Quando é que perceberemos que a eólica e a fotovoltaica só conseguem representar cerca de 3% do consumo total de energia primária? Quando é que perceberemos que discutir a Política Energética não se pode confundir com o apoio às renováveis da moda, com custos demasiados elevados para um País pobre como o nosso?
Engenheiro e Economista
Acontece que em Portugal no sistema eléctrico têm vindo a ser encaminhadas para essa parte fixa outros custos, os chamados Custos de Interesse Económico Geral (CIEG), o que é uma aberração porque tal afecta a transparência da formação dos preços e falsifica os sinais dados à operação do sistema. É esta parcela que está a crescer de forma impressionante e não os custos variáveis da energia!
Nos CIEG estão os sobrecustos das energias renováveis e da cogeração, os custos da convergência tarifária das Ilhas com o Continente em que os consumidores continentais pagam a diferença entre os custos insulares mais elevados e os custos no continente para que os insulares paguem os mesmos valores do continente pelos custos de transporte e distribuição, as rendas pagas aos municípios onde passam as redes, os chamados Custos de Manutenção de Equilíbrio Contratual das Centrais Térmicas que anteriormente vendiam à rede através dos Contratos de Aquisição de Energia (CAE) e ainda os sobrecustos das Centrais que ficaram nos CAE.
Neste contexto de total falta de transparência, é pertinente explicar que quando um produtor eólico, ao abrigo do preço político fixado para a Produção em Regime Especial (PRE), vende a electricidade a cerca de 90€/MWh à EDP Universal, o chamado comercializador de último recurso, duas situações existem:
a) A energia produzida é consumida: então o consumidor paga sempre esse preço político da PRE, o qual, para efeitos de contabilidade tarifária, é separado em duas componentes: 1) PG: Preço no mercado grossista corresponde à estimativa do preço médio do mercado grossista (50€/MWh, valor estimado pela ERSE para 2010); 2) Sobrecusto da PRE em relação ao preço no mercado grossista (PG) corresponde pois ao diferencial positivo entre o preço político da PRE e o preço de mercado grossista; esta parcela é incluída nos CIEG e é distribuída por todos os consumidores de electricidade quer os sujeitos à tarifa regulada, quer os que estão em mercado livre (embora com maior peso para os consumidores domésticos, tendo até agora a indústria sido aliviada deste imposto encoberto).
b) A energia produzida é excedentária em relação ao consumo: quando a produção excede o consumo sujeito à tarifa regulada, o Comercializador de Último Recurso, a EDP Serviço Universal, é forçada a revender esse excesso de energia em mercado spot. Esse excedente é então colocado no mercado grossista ao preço de fecho nesse momento desse mercado (Preço Spot), o qual é normalmente muito baixo, tendencialmente zero. É normalmente essa a situação quando se exporta para Espanha a preço zero e que é depois objecto de grande destaque na imprensa. Tendo nós consumidores que pagar essa energia aos produtores ao preço da PRE, vamos recuperar no ajustamento tarifário do ano seguinte essa pequena receita obtida pela EDP Serviço Universal ao vender a energia a esse preço tendencialmente nulo e portanto acabamos por pagar nos CIEG praticamente o preço da PRE! Por isso é que quanto mais exportamos para Espanha mais o consumidor português paga!
O consumidor paga pois sempre (mesmo quando não consome essa energia…), mas o que acontece é que o sobrecusto da PRE em relação aos preços no mercado grossista (PG) vem dissimulado nos CIEG!
Os CIEG atingem em 2011 os 2 500 Milhões de euros e se virmos o seu aumento impressionante ao longo dos últimos anos, constata-se que os custos que aumentam exponencialmente são os sobrecustos da Produção em Regime Especial, basicamente a produção que beneficia de preços políticos determinados pelo Governo como a eólica, a fotovoltaica, a micro-geração e a co-geração, havendo também aumentos nos CMEC e nos sobrecustos dos CAE, derivados de facto de as centrais térmicas sujeitas aos CMEC e aos CAE estarem actualmente a trabalhar menos horas do que estava previsto quando essas centrais entraram em funcionamento, em que foram projectadas para produzir como centrais de base durante a quase totalidade das horas.
Os CMEC e os sobrecustos dos CAE aumentam porque vão pagar justamente a diferença entre o que iriam facturar como centrais de base e o que facturam hoje, remetidas para um mero apoio às eólicas e às solares, quando não há vento ou sol, pois que essas renováveis têm, porque assim foi determinado por imperativo legal, prioridade no acesso à rede.
Assim sendo, quanto mais renováveis intermitentes forem introduzidas no sistema, mais os CMEC e os sobrecustos dos CAE sobem! Poder-se-ia pensar que, uma vez que a sua produção diminui na proporção inversa do crescimento da energia renovável, estas centrais térmicas se estariam a tornar dispensáveis e que a sua equilibragem contratual seria injustificada, tendendo no limite essas centrais a desaparecerem, e com elas esses sobrecustos. Porém, tal não acontece porque o carácter intermitente das renováveis da moda exige a disponibilidade permanente dessas centrais, as únicas capazes de suprirem a falta de vento, de chuva ou de sol quando essa falta ocorre.
No fundo, as renováveis da moda gerando um mix de produção desequilibrado é que são responsáveis pelos sobrecustos das centrais térmicas!
O CEO da EDP vem agora tentar desligar-se do problema, dizendo que não tem nada a ver com os CIEG pois aqui a EDP limita-se a cobrar para depois entregar a receita. Não é bem assim pois que: (1) houve uma mediática joint-venture Pinho-Mexia (frutuosa para os dois!) na "venda" deste produto (as renováveis da moda); (2) a EDP também recebe do CIEG, quer nas suas renováveis (sobrecusto das PRE) quer nas suas térmicas (CMEC)!
Até agora, através duma subsidiação cruzada, o Governo tinha conseguido evitar que este sobrecusto fosse passado para a actividade produtiva, empresas e grandes consumidores, ficando confinado aos domésticos, às microempresas e à iluminação pública. Mas era fácil de prever que com estes aumentos impressionantes nos CIEG, tal teria de ser passado às empresas, como aconteceu agora agravando fortemente a sua competitividade como tínhamos previsto no nosso Manifesto!
Outra falácia é a redução da importação de petróleo devido às renováveis da moda - eólica e fotovoltaica! Aqui a volatilidade do governo é tão grande quanto a volatilidade do vento! Com efeito, o primeiro-ministro em Setembro 2010 afirmava nos EUA que tal poupança seria de 100 milhões de euros/ano, em 22 de Outubro explicava que essas renováveis poupariam 700 milhões de euros anuais de importação de petróleo e por último no fim de Novembro dizia que as renováveis permitiam poupar nos primeiros seis meses do ano 600 milhões de euros na importação de combustíveis fósseis.
Por sua vez, o secretário de Estado Zorrinho dizia em Abril que a poupança anual seria de 500 milhões de euros, tendo emendado em Novembro para 800 milhões de euros. Também a ministra do Ambiente vinha acrescentar "valor" a estes "statements" governamentais, dizendo que as 10 novas barragens iriam poupar a Portugal a importação de 3,3 milhões de barris de petróleo para as centrais termoeléctricas! (só a velha Central de Setúbal é que utilizava petróleo, as actuais usam carvão e gás…).
Ora é preciso que os nossos distintos jornalistas económicos percebam que as renováveis (barragens inclusive) que produzem electricidade não poupam um único barril de petróleo importado pois que: (1) já não utilizamos petróleo na produção de electricidade; (2) o consumo de petróleo é basicamente no sector dos transportes e só quando houver massificação dos veículos eléctricos, o que infelizmente ainda vai levar muito tempo, é que a electricidade substituirá o petróleo.
O INE mostra-nos que de Janeiro a Outubro de 2010, comparado com o período homólogo de 2009, houve um aumento de importações de combustíveis de 1 400 milhões de euros. As renováveis da moda não nos reduzem a dependência aflitiva do petróleo e vamos continuar a importar carvão e gás natural pois continuaremos a precisar das centrais térmicas quando não há sol ou vento! Até Novembro de 2010 houve 15,556 GWh de produção termoeléctrica contra 22,009 GWh no período homólogo de 2009, o que significará então, devido às renováveis, uma poupança de importação apenas de cerca de 174 milhões de euros em gás natural e carvão o que contrasta com um sobrecusto da Produção em Regime Especial bem superior!
A única forma de reduzirmos a importação de petróleo seria a aposta nos biocombustíveis mas esta renovável foi esquecida pelo Governo!
Em suma, com esta política centrada nas renováveis da moda, geraram-se terríveis sobrecustos para a economia e a dependência do petróleo mantém-se intacta!
Quando é que entraremos no realismo energético? Quando é que abandonaremos a mera propaganda política e começaremos a tratar da energia seriamente? Quando é que perceberemos que a eólica e a fotovoltaica só conseguem representar cerca de 3% do consumo total de energia primária? Quando é que perceberemos que discutir a Política Energética não se pode confundir com o apoio às renováveis da moda, com custos demasiados elevados para um País pobre como o nosso?
Engenheiro e Economista
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