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13 de Julho de 2011 às 13:18

As novas ondas de inovação

A posteriori, as decisões de investimento parecem claras e evidentes mas em tempo real há muitas considerações a ter em conta, nomeadamente as perspectivas macroeconómicas e geopolíticas.

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É aqui que eu penso que a análise do cenário é muito útil para avaliar o possível impacto dos potenciais resultados nos fundos pela gestão dos quais sou responsável e nas empresas em que invisto. É importante reavaliar continuamente as suas probabilidades e ter flexibilidade para alterar a análise do cenário quando os acontecimentos o exigem. Num mundo em mudança, estas probabilidades estão sempre a variar, embora nunca o tenham feito tanto como actualmente.

Nos últimos cinco meses, os mercados deram uma reviravolta, passando do recearem uma deflação para preverem que a inflação se torne um problema. Os acontecimentos no Médio Oriente desencadearam uma escalada dos preços do petróleo, os mercados emergentes já não são o investimento predilecto uma vez que os investidores regressaram à familiaridade do mundo desenvolvido e o Japão foi assolado pelo pior terramoto, tsunami e crise nuclear de sempre.

Neste cenário, a minha avaliação macroeconómica evoluiu e subscrevo agora as seguintes probabilidades para os diferentes resultados. Penso existir uma possibilidade em dez de uma convulsão geopolítica - guerra, ou de uma séria agitação social na China semelhante àquela a que assistimos no Médio Oriente.

Subscrevo uma possibilidade em cinco de existir um erro significativo de política que leve a um endurecimento monetário demasiado rápido por parte dos bancos centrais devido a preocupações acerca da inflação, causando um regresso à deflação.

É muito provável que no curto prazo, existam cerca de 40% de possibilidades de haver um problema inflacionário decorrente da depreciação da moeda. Este poderá ser agravado pela subida acentuada do preço do petróleo como consequência de uma escalada dos problemas no Médio Oriente para um país produtor mais importante, tal como a Arábia Saudita ou o Irão. Isto poderia levar a um cenário de recessão/estagflação para a economia mundial.

Na minha opinião, existe uma probabilidade de aproximadamente 30% de o ritmo de recuperação económica acelerar, impulsionado pela estabilização e depois pela melhoria do mercado habitacional norte-americano e do aparecimento de uma nova onda de inovação na tecnologia / cuidados de saúde / energias alternativas. Felizmente, esta é a evolução mais positiva e, por não ser largamente aceite, não está actualmente descontada pelos mercados.

Estas probabilidades não se excluem mutuamente. Duas destas evoluções mais prováveis são possíveis em sequência, com o mundo a enfrentar primeiro o problema da inflação, antes de passarmos para um ciclo positivo de inovação. A subida dos mercados de matérias-primas tende a acabar com uma super escalada (pela qual ainda não passámos neste ciclo) e por essa razão ainda estou tacticamente positivo no que se refere às matérias-primas.

A boa notícia é que a inflação ajudará a clarificar os problemas da dívida que afectam o mundo ocidental e em certa medida a pôr as suas finanças em ordem (afinal de contas, a inflação, dada a diferença nos cabazes de consumo e o facto de o Oriente deter dívida do Ocidente, é efectivamente uma transferência de riqueza do Oriente para o Ocidente).

No longo prazo, os mercados e os consumidores ajustar-se-ão à nova normalidade e, na minha opinião, os mercados emergentes continuarão a ser o motor do crescimento global e, consequentemente, o destino predilecto do investimento.

Para os investidores, o horizonte temporal é crucial. Os investidores a curto prazo estarão mais interessados na alta das matérias-primas, apesar de este "trade" de vários anos (que saiu da recessão em 2003) estar a perder o ímpeto. O perigo é que a maioria das pessoas perde dinheiro nesta fase do ciclo das matérias-primas porque não consegue sair na altura certa (recorde-se a bolha tecnológica de 1999-2001).

No entanto, quanto maior for o horizonte temporal, maior será a probabilidade do ciclo de inovação. A história mostra que os avanços tecnológicos seguem-se muitas vezes a períodos de crise geopolítica ou financeira, com os choques dos preços do petróleo da década de 70 a levarem ao boom dos computadores pessoais e com a crise asiática dos finais da década de 90 a preceder o desenvolvimento da internet e dos smart phones da última década.

No contexto actual, penso que os preços elevados das matérias-primas podem ser o catalisador para uma inovação renovada, em parte devido à necessidade, com vista a combater o aumento dos custos, e em parte como consequência das novas tecnologias estarem pela primeira vez a tornar-se comercialmente viáveis como resultado do novo paradigma de fixação de preços.

Por exemplo, o custo elevado da energia incentiva a inovação em áreas tais como a armazenagem de energia eléctrica em baterias e as energias renováveis. A actual crise nuclear do Japão só pode acelerar o desenvolvimento que possa tornar as fontes de energia renovável viáveis sem a necessidade de subsídios do governo.

A inovação será igualmente impulsionada pela viragem na economia chinesa de uma economia que tem o investimento como motor para um modelo mais baseado no consumo e nos serviços. Os responsáveis chineses continuam centrados em efectuar esta mudança, dados os desafios demográficos que a China enfrenta nos próximos 15 anos como resultado da política de um só filho. Até agora, o Japão e os EUA têm sido os principais emissores de patentes mas prevejo que a China desafie esta posição de liderança, sobretudo à medida que a sua crescente riqueza e a abundância de oportunidades encorajar a etnia chinesa, por exemplo nos EUA, a regressar ao país.

As pessoas que tiverem trabalhado em empresas do tipo da General Electric e da Siemens terão uma mentalidade completamente diferente daquela que ainda prevalece nas grandes empresas públicas da China. Uma mentalidade mais inovadora conjugada com uma mão-de-obra altamente qualificada será uma combinação muito forte.

Tendo já em grande parte construído as infra-estruturas de que necessita, a China precisará também uma nova geração de software e outras tecnologias. Esta é a evolução lógica do boom das matérias-primas a que assistimos. Se olharmos para qualidade das infra-estruturas da China, é cem vezes melhor do que a de quaisquer outras que vemos no resto do mundo emergente.

Numa economia globalizada, um aspecto interessante destas novas ondas de inovação é o facto de alguns dos beneficiários serem empresas domésticas e de outros serem empresas estrangeiras. Entre estas últimas, as que vão beneficiar com esta tendência vão desde multinacionais como a SAP, Oracle e IBM, que têm as tecnologias, até às empresas de bens de consumo de luxo como a LVMH, Richemont, PPR, BMW e Daimler, que têm as marcas que os consumidores emergentes desejam possuir.

Felizmente, do ponto de vista do investidor global, a distinção é mínima. Daí que o meu trabalho de investimento continue a estar centrado em descobrir empresas que operem nas partes mais interessantes da cadeia de valor, onde o poder de fixação de preços é maior e mais sustentável.

De facto, avaliar as empresas é mais do ter capacidade para lhes atribuir um preço. Tem a ver com o poder da marca e com demonstrar a capacidade de fabricar a baixo custo e ser líder de mercado. O poder de fixação de preços nas empresas tecnológicas, por exemplo, é detido pelas que são capazes de inovar e baixar os preços, uma vez que isto aumenta a acessibilidade e alarga a dimensão do mercado a que se dirigem.

Numa altura em que existem preocupações significativas acerca das perspectivas macroeconómicas e geopolíticas, esta pode parecer uma opinião excessivamente optimista do futuro, mas períodos anteriores de progresso inovador também surgiram de cenários tão pouco promissores como o actual. * Gestor de carteira na Equipa de Acções Mundiais

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