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19 de Dezembro de 2005 às 13:59

A reforma aos 67 anos?

Este mês tem sido discutido nalguns países da União Europeia (UE) – e a propósito da publicitação do «relatório Turner» solicitado por Tony Blair com vista à revisão da Segurança Social inglesa – o aumento da idade de reforma para os 67 anos.

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Actualmente a generalidade dos países da UE confrontam-se com o problema da sustentabilidade financeira do sistema público de Segurança Social. São, sobretudo, duas as razões principais para este problema: em primeiro lugar, a evolução demográfica das sociedades europeias; em segundo, a orientação imprimida a algumas políticas de emprego adoptadas até aqui.

Os países europeus enfrentam hoje uma inédita mudança demográfica, devido quer à diminuição da taxa de natalidade, quer ao aumento da esperança média de vida. Acresce que nalguns países a taxa de fertilidade é insuficiente para a substituição da população, fazendo diminuir a população activa.

Paralelamente a esta diminuição da natalidade e ao aumento da esperança de vida, algumas das políticas de emprego recentemente promovidas têm também contribuído para o desequilíbrio financeiro dos sistemas públicos de segurança social. Na verdade, na última década foram reforçadas as políticas de redução da procura de emprego que promovem quer o retardar do acesso ao trabalho – através do prolongamento da escolaridade obrigatória e da elevação da idade mínima legal de acesso ao trabalho –, quer a antecipação da idade de reforma (para os 60 ou para os 55 anos). Estas políticas têm, simultaneamente, diminuído a população activa e tornado (de forma precoce) parte significativa da população beneficiária das prestações da Segurança Social.

Além disso, recentemente, um novo dado veio agudizar ainda mais a gestão financeira do regime público: o aumento do desemprego nos países mais desenvolvidos da UE (por exemplo, o aumento súbito do desemprego registado em Portugal desde 2002 representa um peso não negligenciável sobre o orçamento global do sistema).

Ora o relatório de Adair Turner propõe, justamente como solução para o reequilíbrio financeiro da Segurança Social, numa primeira fase e até 2020, o alongamento da duração do trabalho para os 67 anos e, posteriormente, para os 68 anos. Muito aguardado, este relatório responde quer a um problema geral (dos países europeus) que se prende com a diminuição da taxa de natalidade e o aumento da esperança de vida acompanhado de um envelhecimento da população, quer também a um problema específico inglês pois neste país, actualmente, cerca de 12 milhões de trabalhadores ou não contribuem ou pagam contribuições muito baixas, sujeitando-se no futuro a contar apenas com uma reforma mínima do Estado. 

 Aquando da sua apresentação Turner salientou que, se de momento grande parte dos reformados gozam de reformas «confortáveis», existem uma série de problemas no sistema público que não podem (nem devem) avolumar-se, requerendo uma revisão imediata do sistema. De acordo com este especialista – que exerce, entre muitas outras, a actividade de professor da London School of Economics e é presidente da UK Low Pay Commission e da UK Pensions Commission – a reforma assegurada pelo sistema público devia ser indexada aos salários, única forma de constituir uma base segura e estável para a poupança. Para atingir este propósito, admite que será preciso quer prolongar a idade de reforma quer aumentar a despesa pública nos próximos vinte anos (prevendo-se que a despesa do Estado passe dos actuais 6,2 % do PIB para os 7,5% do PIB). Paralelamente, o relatório sugere a criação de um plano de poupança nacional – o National Pensions Saving Scheme – no qual os trabalhadores serão automaticamente inscritos, podendo no entanto, quem assim o entender, solicitar que sejam afastados desse plano.

E não é só no Reino Unido que se equaciona a possibilidade de retardar a idade de reforma. Em Espanha, o governo de José Luis Zapatero procura também prolongar agora a vida activa dos espanhóis propondo aos parceiros sociais restringir a aplicação do regime das reformas antecipadas. Anunciada como uma medida de grande amplitude – uma vez que se prevê que o sistema público seja deficitário a partir de 2015 – a solução poderá também aqui passar pelo prolongamento da vida activa para os 67 anos. Igualmente na Alemanha, no início deste mês, Angela Merkel anunciou a necessidade de se estabelecer a idade da reforma aos 67 anos (em 2012), salientando ainda que encorajará a possibilidade de os trabalhadores «idosos» continuarem a trabalhar se assim o desejarem. E em Itália, o governo de Sílvio Berlusconi procede a uma reforma idêntica, que se prevê entre em vigor já em Janeiro de 2008. 

Em Portugal, e de forma muito oportuna, a Resolução do Conselho de Ministros n.º 102/2005, de 24 de Junho propôs um conjunto de medidas para a consolidação das contas públicas e o crescimento económico, de entre as quais, a sustentabilidade da Segurança Social. Reflectindo a preocupação em garantir que o sistema seja sustentável a longo prazo, o governo pretendeu com este diploma, entre outras, promover a convergência de regimes (da CGA e da segurança social) e promover o envelhecimento activo, designadamente através da revisão do regime de reformas antecipadas (introduzido com o Decreto-Lei n.º 9/99, de 8 de Janeiro) e a revogação do regime de excepção previsto no Programa de Emprego e Protecção Social. E, nesta linha, o Decreto-Lei n.º 125/2005, de 3 de Agosto, suspendeu o regime de flexibilização da idade de acesso à pensão de reforma por antecipação e revogou o regime de antecipação da idade da reforma para os trabalhadores desempregados.

Os exemplos comparados que mencionei esboçam uma tendência convergente nas respostas a dar a fim de garantir a sustentabilidade do sistema de segurança social. Um aspecto será decisivo: é necessário proceder, periodicamente, à avaliação das medidas relativas à idade de reforma e, independentemente das soluções que possam vir a ser encontradas conjunturalmente, será fundamental que se realizem também, de forma planeada, antecipada e periódica, estudos prospectivos que ajudem a definir uma política estruturada de Segurança Social para Portugal.

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