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Fernando Braga de Matos 19 de Novembro de 2010 às 12:06

A nossa diferença

(Onde o autor repara que, nos tempos recentes, desapareceram os PIIGS, agora reduzidos a PIG, num singular plural agregando a ditosa pátria nossa amada, a Irlanda e a Grécia, e, devido ao espírito científico com que acorda todos os dias, busca causas para a situação, porque a lei da causalidade é ainda das poucas que, com a da gravidade, ainda se aplica em Portugal, e descobre o malfeitor Sócrates e o seu mancomunado dos Santos. "Who else?").

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Nos últimos dias ocorreram mais umas vicissitudes negativas para Portugal, Irlanda e Grécia, não necessariamente de igual importância, mas seguramente distinguindo estes países com ênfase de labéu. A Grécia surpreendeu mais uma vez os seus inúmeros admiradores e até o calejadíssimo FMI com mais aldrabices estatísticas afectando a contabilidade do défice público que lá voltou a crescer no papel, num espírito de independência que alguns tendem a situar há 2500 anos atrás, mas, agora, evidenciando um grande desgaste anti-aristotélico. Com os Karamanlis ou os Papandreous, quando dá para serem todos iguais são mesmo todos iguais, não há esquerda ou direita que resista. Já a surpresa vinda da Irlanda é quase nenhuma, pois todos sabem que o Fundo de Estabilidade e o FMI estão à porta, mas agora as batidas no portão já são a murro e aqui, na urgência, reside a novidade, porque na Europa actual as coisas dificilmente se tornam desabridas mas agora os decibéis subiram de tom. As notícias são no sentido de tudo acontecer a qualquer momento, mas não pode deixar de ser apontada uma causa virtuosa para a resistência do ex-tigre celta, a saber, a manutenção da taxa de imposto às empresas nos 12,5%, em cuja suavidade o governo irlandês vinha apostando para voltar ao crescimento. O choque fiscal havia resultado maravilhosamente por 1995, mas, com o FMI, a coisa vai virar mais para o lado do choque fiscal. Portugal também não trouxe surpresa de maior, a não ser o aparente aumento do declive da tendência para a subida das taxas de juro e a rarefacção da procura dos títulos da dívida. No leilão de quarta-feira de dívida soberana a um ano, a procura desceu dum excesso de X2,2 para X1,7 em uma semana e os juros ascenderam a 4,8%, o quíntuplo de Janeiro(!), acentuando o plano inclinado e revelando que o tempo para recorrer a financiamento privilegiado já chegou ontem. Os PIG, como se vê, parecem imbuídos de espírito suicidário e rumam ao matadouro mesmo sem a ajuda pressurosa de palavras desbocadas da sra. Merkl, que demonstram como os alemães se vêm alemães para aturarem os gregos e que o cheque germânico "no questions asked" já foi chão que deu uvas.

Agora dá para perguntar por que razão estes três países se distinguem, quando o colapso de 2008 foi para todos e que ainda há pouco eram cinco? A Itália nunca esteve verdadeiramente lá, em estado crítico, mas a Espanha, não há muito litigava com "nosotros" e dizia-se aqui, teixeiramente, que ainda estavam pior. A Grécia, sabe-se muito bem que desde a sua entrada no euro "baralhava" os números e que os gregos, de tão entretidos se encontrarem na sua fraude, se enganavam a si próprios e iam comendo a própria cauda, como a cobra autofágica. A Irlanda, que ainda tem muito para gastar de excedentes da sua explosiva expansão liberal de 15 anos, caiu na embriaguez da "banca-sombra" e da inflação de activos imobiliários. Ainda agora o fogo do Anglo Irish Bank veio a revelar-se como não extinto e exigindo tal protecção que o défice do país para 2010 saltou para mais de 30%. Quanto à Irlanda, ficam assim, também encontradas as razões das suas penas. Caso interessante é o da Espanha, ela também a braços com um severo "crash" do imobiliário e problemas bancários, principalmente nas "cajas". Que se passou com eles? Dizia Luigi Speranza (nome auspicioso), explicando no "Wall Stree Journal": "As atempadas medidas de austeridade permitiram à Espanha destacar-se dos países mais afectados pela crise das dívida soberanas, ao fazerem baixar os custos dos empréstimos". Aqui, pelo contrário, tivemos o optimismo balofo e o estado de negação que deram para pensar que o PM não passa de um caso de narcisismo paranóico.

Eis-nos, pois, com a causa isolada. Portugal não teve crise de imobiliário e a banca nacional demonstrou firme sobriedade, mas a excepcionalidade do País concretiza-se, nos tempos que correm, no facto de sermos excepcionalmente mal governados.



Advogado, autor de " Ganhar em Bolsa" (ed. D. Quixote), "Bolsa para Iniciados" e "Crónicas Politicamente Incorrectas" (ed. Presença). fbmatos1943@gmail.com
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