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A balança de pagamentos existe

? As necessidades líquidas de financiamento externo da economia portuguesa (défice da balança corrente e de capitais), voltaram a aumentar em 2005.

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Eram 4,0% do PIB em 2003 e passaram para 5,7 % em 2004 e 8,1% em 2005. Desde 1996, ano que parece marcar o arranque imparável para os valores actuais, que este défice foi multiplicado por 5. Caminhamos claramente para o valor simbólico de 10%.

Nas omnipresentes questões de conjuntura, os problemas relativos à balança de pagamentos são praticamente omitidos. Tirando alguns teimosos, à direita do governo, que a medo vão chamando a atenção para o assunto, este não atrai grande interesse.

Ainda recentemente, aquando da divulgação do último relatório do Banco de Portugal, apesar dos números desastrosos que se evidenciaram sobre a Balança de Pagamentos, aqueles foram tomados como se fossem elementos irrelevantes.

É como se o próprio conceito de balança de pagamentos tivesse deixado de existir.

Porém, a balança de pagamentos ainda existe, nas estatísticas do Eurostat e do Banco de Portugal, mas, sobretudo, na incontornável realidade económica.

O argumento para desvalorizar a importância do agregado é este: numa zona monetária, como a zona do euro, o significado da balança de pagamentos de Portugal é o mesmo que a «balança de pagamentos» do Alentejo tinha no tempo do escudo.

Esta concepção (1) está muito arreigada entre nós e é causa de muitos dos nossos problemas. De facto, foi com esta ideia que muitos aceitaram os apertos do período imediatamente anterior à entrada em funcionamento do euro. Os sacrifícios eram suportados com a ideia de que, a seguir, tudo nos seria permitido, uma vez desaparecidos os constrangimentos monetários externos. E, na verdade, foi assim que o país se comportou. A balança corrente e de capitais abalou, imparável, rumo aos 10% do PIB.

É certo que se concede, por vezes, que existe alguma preocupação, dado que o défice da balança de pagamentos representa um vaga falta de competitividade, sobre a qual pouco ou nada se poderá fazer a curto prazo.

Não tendo o país obrigações externas de cumprimento de objectivos relativos à balança de pagamentos, a sua irresponsável tranquilidade deriva do facto de se ter a certeza de que ninguém nos virá meter na ordem - como em tempos ocorreu com o FMI – e como está a ocorrer agora relativamente ao défice público. Cumpre-se assim o nosso destino: só efectuamos reformas quando obrigados do exterior; não conseguimos enxergar os nossos interesses, se estes não coincidirem com os de alguém do exterior que se encarregue de nos pressionar num determinado sentido.

O problema da balança de pagamentos assume significados diferentes, consoante o contexto monetário em que se insere. No caso actual da situação portuguesa, inserida numa zona monetária, o problema do défice da nossa balança só a nós diz respeito.

O funcionamento da economia encarrega-se de encontrar remédio para o défice da balança corrente e de capitais. Este, indica que se gasta mais do que se produz. Ora, isto só é possível através da acumulação de dívidas ou da venda de activos nacionais ao estrangeiro, registados na balança financeira. Dito de outro modo, o défice da balança corrente e de capitais é a expressão da acumulação de dívidas face ao exterior e/ou de perda de propriedades para o estrangeiro.

O défice da balança corrente e de capitais poderia ser virtuoso, se tivesse como contrapartida na balança financeira uma grande parcela de investimento directo externo. Não é esse o caso, como se sabe, estando o IDE estagnado e representando parte diminuta da balança financeira do país.

Mas este défice revela apenas uma parte da gravidade da situação. A acumulação de dívidas e a transferência de propriedade para o exterior representará, no futuro, um novo agravamento da balança corrente e de capital, através do pagamento de juros, dividendos e outros rendimentos da propriedade perdida. De início, esta situação é pouco perceptível. Mas, no futuro, os rendimentos saídos engrossarão e levarão a um verdadeiro «crowding out» das importações de bens e serviços e à real redução do consumo.

A balança de Pagamentos existe e, no final, nenhuma União Monetária nos livrará dos credores.

(1) A raiz desta concepção deriva da crença na Teoria da Zonas Monetárias Óptimas que nos levou à ideia absurda de que os benefícios da concorrência só se verificam nos mercados de bens e serviços e não existiriam na esfera monetária. Nesta, o euro permitiria realizar o esplendor do monopólio à escala europeia. Ficamos assim, paralisados com a ideia da bondade do União Monetária. Hoje sabemos que há uma a história mal contada na Teoria das Zonas Monetárias Óptimas. A concretização deste modelo, nestes últimos sete anos de União Monetária Europeia, já permitiu verificar que várias das supostas vantagens do euro são pura ilusão, embora nos custe ainda acostumarmo-nos à ideia. O próprio pai da teoria das Zonas Monetárias Óptimas, Robert Mundell, já reviu as ideias antigas.

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