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O Orçamento que podia ir mais além

É urgente a redução da complexidade e do número de benefícios e exceções fiscais na procura de uma fiscalidade mais simples, algo que não se vislumbra nesta proposta de Orçamento. Isto porque uma elevada complexidade fiscal só prejudica as PME portuguesas, as quais possuem menos recursos para navegarem nas centenas de benefícios e exceções existentes.

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No passado dia 10 de outubro foi conhecida a proposta de Orçamento do Estado para 2025. Em vários fóruns referi que este foi desenhado para que fosse aprovado pelo Partido Socialista, algo que se veio a confirmar, após a Comissão Política deste partido se ter reunido a 22 de outubro e confirmado a proposta de abstenção efetuada por Pedro Nuno Santos.

Esta minha posição foi baseada no facto de a proposta de Orçamento do Estado para 2025 ser, em grandes números, equilibrada, pois prevê um crescimento económico de 2,1%, reduz a carga fiscal para particulares e empresas, prevendo, simultaneamente, um excedente orçamental de cerca de 800 milhões de euros (0,3% do PIB) e, como tal, a redução da dívida pública para 93,3% do PIB.

É um Orçamento mais focado nos jovens e nas empresas. Quanto ao IRS Jovem, a extensão dos benefícios até 10 anos e o alargamento a todos os jovens até aos 35 anos são medidas positivas. Quanto às empresas, destaco a aposta na melhoria da sua competitividade através da redução da taxa efetiva de IRC, algo conseguido através da redução da taxa geral de IRC e das taxas de tributação autónoma (esta última medida talvez seja a que tem maior impacto em sede de IRC); o facto de os prémios de produtividade ficarem isentos de IRS e de TSU; e ainda a possibilidade de as empresas deduzirem 100% dos aumentos salariais (com algumas regras). A criação de um programa com a administração pública para pagamento a fornecedores em 30 dias é também muito importante, nomeadamente para as PME.

Há também medidas sociais relevantes a salientar: nos transportes, com o passe social a ser alargado a todo o país e gratuito para portugueses com menos de 23 anos e com a criação do Passe Ferroviário Verde; e no ensino superior, com o reforço da oferta de alojamento, algo fundamental para reduzir a pressão sobre o orçamento das famílias cujos filhos vão estudar para longe de casa.

Contudo, a proposta do Orçamento do Estado para 2025 podia ir mais além. Desde logo, embora seja um orçamento com riscos significativos, fruto do contexto internacional de enorme incerteza – e que pode levar, na sua execução, a um défice orçamental – há alguma folga que poderia ser aproveitada, associada ao aumento dos impostos indiretos via descongelamento da taxa de carbono sobre os combustíveis (que ficou suspensa com a crise dos combustíveis em 2022), e à eliminação gradual da isenção de impostos sobre produtos energéticos.

Ainda assim, em termos fiscais, onde o Orçamento devia ir mais longe é na estabilidade e na simplificação fiscal. É urgente a redução da complexidade e do número de benefícios e exceções fiscais na procura de uma fiscalidade mais simples, algo que não se vislumbra nesta proposta de Orçamento. Isto porque uma elevada complexidade fiscal só prejudica as PME portuguesas, as quais possuem menos recursos para navegarem nas centenas de benefícios e exceções existentes.

Adicionalmente, o Orçamento prevê uma medida que pode ter um efeito oposto do desejado: a isenção de IMT e de imposto de selo na primeira casa. À primeira vista, a medida parece muito interessante, porém tem um potencial negativo. Num contexto em que o mercado de habitação está claramente com um problema de oferta insuficiente, esta medida pode contribuir para o excesso de procura que já temos, refletindo-se no aumento do preço das casas e agravando ainda mais o problema deste mercado.

Além disso, numa outra perspetiva, nesta proposta de orçamento estão ausentes medidas focadas na flexibilização da legislação laboral, na (re)qualificação, na fixação e atração do talento e no apoio à natalidade. Nota-se também a ausência de medidas robustas que apoiem o financiamento e a capitalização das empresas, nomeadamente para as que acelerem a transição para uma economia mais sustentável. Finalmente, não se vislumbram medidas eficazes que possam fomentar processos de fusão e aquisição empresarial, para que o importante aumento da dimensão das empresas e o consequente aumento dos níveis de produtividade, seja uma realidade.

Assim, resta-nos esperar que a discussão do Orçamento na especialidade permita introduzir ajustamentos que respondam aos desafios aqui identificados.

 

É urgente a redução da complexidade e do número de benefícios e exceções fiscais na procura de uma fiscalidade mais simples, algo que não se vislumbra nesta proposta de Orçamento.
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