Opinião
É off ou on?
Era bom que se fizessem comunicados a pedir desculpa às pessoas de cada vez que o segredo de justiça é violado, como se fez agora, e bem, com a violação do off.
A história da divulgação das afirmações do primeiro-ministro, sobre os médicos ligados ao caso do lar de Reguengos, é difícil de perceber.
Lidos os dois comunicados do Expresso, a explicação é que, por lapso, não foi desligado o microfone interno da câmara de filmar, enquanto faziam os chamados “planos de corte”. E, depois, esses tais sete segundos foram incluídos no vídeo de promoção da entrevista enviado às televisões.
A primeira falha dizem, portanto, que foi “um lapso”; a segunda assumem que foi um erro do... Expresso.
Pergunta-se: como é que é? Ninguém viu que esses sete segundos de conversa, com as pessoas já em pé, estavam incluídos no vídeo que ia seguir para as televisões? E, então, aqui não se aplica o que se exige a quem está em cargos políticos, ou seja, retirar ilações e as devidas consequências de erros graves? Diz-se que o erro foi do Expresso. Certo. Mas de quem? De quem é a responsabilidade?
Peço a quem leia estas palavras e não me conheça que acredite que não desejo que se faça mal a alguém. Mas é bom que os profissionais envolvidos nesta situação – pelo menos eles – pensem bem no que costumam exigir a outras pessoas, com frieza e sem contemplações.
O que foi dito pelo primeiro-ministro é outra questão que tem sido abundantemente tratada estes dias. Mas, a propósito de quem exerce, em cada momento, essas funções, cabe também perguntar: aqui, “o prejudicado” foi António Costa, mas se esta história fosse com Pedro Passos Coelho, Durão Barroso, eu próprio, qual seria a reação das pessoas de direita ou do centro? Acreditariam que se tratava de um erro? Não. Diriam logo que se tratava de uma conspiração e que tinha sido uma armadilha. Neste caso, não houve esse brado. E é isso que é também curioso: quem é de direita ou de centro não fala nisso porque aconteceu a alguém que combatem. E a esquerda não fez um escândalo em torno disto, exigindo um inquérito parlamentar ou algo assim, porquê? Será porque não lhes passe pela ideia que alguém se atrevesse a fazer isso? Mas seria bom pensarem que há diferentes esquerdas, como há diferentes direitas, bem como distintos propósitos e distintas ousadias.
Aqui o ponto que quero destacar é saber se querem aproveitar este tão grande embaraço para ponderarem sobre as violações do segredo de justiça. Essas serão on ou off? Nessas situações, alguém telefona para as televisões a pedir para não passarem imagens, por exemplo, de interrogatórios judiciais cuja divulgação é proibida? Ou notícias de processos em curso que os visados, muitas vezes, desconhecem, serão off ou on? Aí alguém invoca a lei, como agora se invocou o Código Deontológico, para impedir a divulgação pública? E julgo que esses casos são mais graves e mais danosos do que este. Este, sendo grave, tem umas breves consequências políticas, os outros mancham a honra das pessoas e muitas vezes destroem vidas. Era bom que se fizessem comunicados a pedir desculpa às pessoas de cada vez que o segredo de justiça é violado, como se fez agora, e bem, com a violação do off.
É lamentável ver tantas vezes dois pesos e duas medidas em tantas situações, também, mas, não só, na aplicação de normas de segurança a festas partidárias.
Nos tempos que aí vêm, vai estar cada vez mais na ordem do dia a defesa das liberdades e dos direitos individuais. Como já aqui escrevi, o tema da privacidade digital vai estar cada vez mais, e de modo intenso, na ordem do dia. Situações como esta do off significarão pouco, face ao que aí vem no mundo, com os propósitos de aproveitamento das inovações tecnológicas que vão surgindo.