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21 de Março de 2014 às 11:29

Um estudo, um par de estalos

Já percebemos que, de agora em diante, os equívocos vão acelerar em número e intensidade: vêm aí as eleições europeias, que prometem ser tudo menos um debate sobre a Europa, mas não necessariamente pela falta qualidade dos cabeças de lista do PS e do PSD

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Já percebemos que, de agora em diante, os equívocos vão acelerar em número e intensidade: vêm aí as eleições europeias, que prometem ser tudo menos um debate sobre a Europa, mas não necessariamente pela falta qualidade dos cabeças de lista do PS e do PSD. As legislativas futuras, combinadas com os secretos desejos de um final feliz para as presidências do Prof. Cavaco Silva vão, por osmose mediática, tomar conta do assunto para dele fazer nada, excepto som; a classe política gosta e os media agradecem.


De permeio, felizmente, "coisas" como a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico) vão lembrando ao Governo as imprudências várias cometidas ao longo deste período: no seu relatório bienal, aquela organização recomenda protecção aos mais pobres e alerta para o perigo de falta de equidade na distribuição dos efeitos da crise (na forma discricionária da sua não mutualização, bem entendido). A OCDE dá conta, agora, daquilo que todos sabemos há muito: os cortes no Rendimento Social de Inserção e o facto de serem as famílias de menores rendimentos a suportar a austeridade, são contrários à linha recomendável de políticas anti-crise. E têm custos, vejam só…


Para a Direita supostamente conservadora que está nesta coligação, a família é só para encher boca em dia de telejornal e preconceitos - em tudo mais, somos cães pela trela, adereços de um espectáculo abusador. Este é um Governo - ou um Poder, se preferirem - forjado na crise, mas germinado na ideologia. Não tem categoria para resolver a primeira - estamos sozinhos no nosso empobrecimento - nem coragem para assumir a segunda. Mas vamos ao título, que isto, como reza o título do novo álbum dos Dead Combo, é coisa de "a bunch of meninos".


Esta semana, saíram os resultados do "European Social Survey" (coordenado em Portugal pelo instituto de Ciências Sociais de Lisboa) que mede, de forma comparativa entre nações, as relações de (in)satisfação entre os europeus e as suas democracias. Como manda a inteligência, e ao invés dos equívocos forjados nos complexos de inferioridade das elites político-mediáticas, este estudo coloca cada país em perspectiva racional para com os seus congéneres, separando cientificamente, para cada dado, a "importância atribuída" da "avaliação de desempenho". Ao ler alguns dos seus números através do "Público" do passado dia 18, não podemos deixar de ouvir a chapada de dois estaladões na cara que, como as carapuças, assentam só em quem devem:


- Cai por terra o mito de que o país "é" os media e os circuitos mórbidos de popularidade e travesti democrático por eles fomentados; com pés de barro cai, também, a "inventona", tantas vezes sordidamente aproveitada, de que os portugueses não valorizam a Democracia. Com efeito, estamos acima da média europeia na importância atribuída à democracia em itens como o combate à pobreza, o fomento da igualdade, a necessidade de alternativas políticas claras ou - pasmem, oh alarves da retro-referendagem! - os direitos das minorias. Estamos também acima da média europeia na importância atribuída à democracia no fomento da igualdade. Estamos em linha com a média europeia - note-se bem o civismo implícito - no que toca à convicção da importância da existência de tribunais equitativos.


- Levanta-se bem alto um conjunto de percepções que contraria, de forma inequívoca, a noção de que a vidinha nos passa ao lado, como com os carneirinhos. Se os números acima justificam plenamente a crença numa consciência colectiva construtiva (apesar do mal-estar político que não nos deixa respirar), os que se seguem evidenciam a noção de que o país - pela democracia - se pode hoje dar ao luxo de estar mais lúcido. Avaliamos como definitivamente "subprime" os resultados de quem manda: na "avaliação de desempenho", os portugueses julgam muito abaixo da média o trabalho executado no combate à pobreza, no fomento da igualdade ou na viabilidade de alternativas credíveis; entendemos, também, em proporção inversa, que a defesa dos direitos das minorias não está à altura das exigências; sem surpresas, depois de colocarmos a justiça nos píncaros da importância atribuída, desiludimo-nos com a avaliação do seu desempenho.


Mas nem só de proporções inversas se faz a leitura cruzada entre "importância atribuída" e "avaliação de desempenho": no que toca à valorização da importância da qualidade dos media num sistema democrático, estamos abaixo da média europeia, para depois avaliarmos o seu desempenho ligeiramente acima dos nossos congéneres. Ou seja: tolda-se-nos a visão neste particular - será do barulho das luzes?…


Este estudo é um docinho de legitimidade pública e política, servido de bandeja à oposição; ao Sr. primeiro-ministro não deve servir de grande auxílio, pois o Dr. Passos Coelho acha que isto se explica entre "gestores" e "gente simples". A António José Seguro cabe a evidente tarefa de escrutinar o impulso político por detrás destas justaposições; é de aproveitar, se não querem ser corridos "ao estalo" dentro de uns anitos também.


Para já, registe-se: estamos muito acima da consciência de quem nos governa, o que, não pondo pão à mesa, não deixa de ser reconfortante, pelo menos para aqueles que acreditam que o problema luso são as elites de LED e plástico. Que par de estalos.

 

 

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