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Luís Marques Mendes 18 de Abril de 2021 às 21:15

Sócrates é “um dos maiores alimentos da extrema-direita” e "não explica as suspeitas de corrupção"

No seu habitual comentário semanal na SIC Notícias, Marques Mendes analisa o desconfinamento, a vacinação, a entrevista de Sócrates, O pós Ivo Rosa e as listas autárquicas do PSD

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O DESCONFINAMENTO

 

  1. Vamos ter amanhã um desconfinamento a três velocidades. Não é a solução ideal mas é a solução possível. A novidade é a "guerra" com o Governo, por parte dos autarcas cujos municípios não beneficiaram deste desconfinamento. Todos têm as suas boas razões:
Primeiro, os autarcas: as suas críticas eram esperadas e são compreensíveis. Esperadas porque estamos em ano de eleições. Compreensíveis porque ninguém gosta de ficar para trás e seguramente que os autarcas não são nem os responsáveis nem os culpados por esta situação. Fizeram tudo o que estava ao seu alcance para que os números de incidência da Covid fossem outros.

Depois, o Governo: não tinha alternativa. Está a cumprir as regras que definiu e que todo o país conhecia. Está a fazer um desconfinamento nacional porque os números de incidência de novos casos a nível nacional o permitem. Está a fazer confinamentos locais porque os números elevados nalguns concelhos a tal obrigam. Nada disto é um castigo ou uma punição. É tratar de forma diferente o que é diferente. De forma proporcional, adequada e equilibrada.

 

  1. A partir de agora, alívio e risco são cada vez maiores. O alívio de mais gente na rua. O risco de mais contactos e contágios. É inevitável. A esse respeito, devia ser obrigatório ler o notável testemunho do Prof. Daniel Sampaio no Expresso.
  • Um depoimento impressionantede verdade, humildade e humanidade. Daniel Sampaio descuidou-se, apanhou Covid, esteve às portas da morte e só sobreviveu pela excelência do SNS e pela sua própria força de vontade.
  • Vale a pena ler. Facilitar e relaxar pode ser sinónimo de sofrimento e até de morte. Uma grande lição de vida.

 

O PROCESSO DE VACINAÇÃO

 

Apesar da confusão que se instalou na Europa sobre as vacinas, há notícias bastante positivas em Portugal. Vejamos:

  1. Balanço actual da vacinação:
  • Lares – 94% de vacinação
  • Pessoas com mais de 80 anos – 95%
  • Pessoas dos 50 aos 80 anos com comorbidades – 93%
  • Profissionais de saúde – 96%
  • Serviços essenciais (militares, bombeiros, forças de segurança) – 99%
  • Escolas – 87%

 

  1. Objectivo próximo a alcançar: vacinar até ao fim de Maio todas as pessoas com idades acima dos 60 anos. Este objectivo é essencial por uma razão simples: 96,4% das mortes por Covid 19 desde Janeiro até hoje ocorreram em pessoas acima dos 60 anos. Vacinando estas faixas etárias, o risco de morte por Covid está substancialmente afastado.

 

  1. Há vacinas suficientes para atingir este objectivo? Segundo as autoridades, esse problema não se coloca:
  • Primeiro, se a vacina da Janssen for confirmada na próxima terça-feira na EMA, este objectivo até pode ser alcançado mais cedo. Porque, entretanto, houve um reforço das doses da Pfizer.
  • Segundo, se, por hipótese, a vacina da Janssen fosse "suspensa" por decisão da EMA, o reforço da Pfizer "compensava" a "falha" da Janssen.
  • Finalmente, tudo indica que a EMA vai confirmar a vacina da Janssen. O que será uma excelente notícia.

 

  1. Vacinação por faixas etárias – Neste momento estão a ser vacinadas sobretudo as pessoas entre os 70 e os 80 anos. A estimativa das autoridades é que as pessoas entre os 60 e os 70 comecem a ser vacinadas na primeira semana de Maio.

 

 

A ENTREVISTA DE SÓCRATES

 

  1. Na entrevista à TVI, Sócrates esteve igual a si próprio: egocêntrico; violento; fazendo-se de vítima; com uma relação sempre difícil com a verdade. Tem, sobretudo, um momento que o "mata" politicamente. Uma vez mais não explica as suspeitas de corrupção.
  • Ele não explica o dinheiro (como é que vivia à grande e à francesa, acima dos rendimentos declarados); a dependência de um amigo "lobista", o que é inadmissível num PM; o recebimento de dinheiro em notas (que gera suspeitas sérias); a linguagem cifrada nas conversas telefónicas (o que só reforça as suspeitas).
  • Estes é que são os factos que geram a suspeita de corrupção. Sócrates não os explica porque não tem explicação. E, não explicando, está a auto-incriminar-se. Está indirectamente a declarar-se culpado. Não é preciso ser-se jurista para se perceber as suspeitas de corrupção.
  • Além de não explicar, foge àquela que é a maior ficção criada pelo Juiz Ivo Rosa: a de que Santos Silva era o corruptor e não o testa de ferro. Alguém acredita que Ricardo Salgado transferia 30 milhões de euros para um consultor como Carlos Santos Silva? Nem 3 milhões, que fará 30? Uma quantia destas dá-se a quem decide, a quem tem poder real, a um decisor com muito poder. Não a um consultor. O que faz de Santos Silva um testa de ferro, não um corruptor activo. Só a ingenuidade de um juiz não permite perceber isto.

 

  1. Os ataques ao PS são outra falha de Sócrates. Ele não tem qualquer razão:
  • Primeiro: estamos perante um processo judicial. Os partidos não existem para se meterem em processos judiciais. Se há erros no processo, eles resolvem-se nos tribunais, através de recursos, e não nas sedes partidárias ou por via de discursos políticos.
  • Segundo: o PS, como a generalidade dos portugueses, está incomodado com os comportamentos de Sócrates. Como é que o PS pode vir defender uma pessoa que teve estes comportamentos inaceitáveis? Só se quisesse suicidar-se.
  • Terceiro: a única crítica que se poderia fazer ao PS era exactamente a crítica contrária: por que é que o PS esteve tanto tempo calado? Por que é que não faz uma auto-crítica?
  • Medina disse bem: o comportamento de Sócrates corrói a vida democrática. Sócrates, pelo seu mau exemplo, além de activo tóxico, é um dos maiores alimentos da extrema-direita em Portugal.

 

 

O PÓS IVO ROSA

 

  1. A decisão de Ivo Rosa foi um arraso na confiança dos cidadãos na justiça. Diz António Barreto: "depois desta decisão, a confiança nas instituições da justiça está no nível mais baixo de sempre." Apesar disso, o silêncio dos responsáveis políticos e dos dirigentes da justiça foi muito notado. PR, PM, MJ, Presidente do STJ não abriram a boca. Esta semana o silêncio ainda se compreende. Evitaram reagir a quente. Mas nas próximas semanas é obrigatório que os principais responsáveis políticos falem. Não sobre o processo judicial em concreto. Mas sobre a crise da justiça e sobre a forma de restaurar a confiança no sector. Têm essa obrigação democrática.

 

  1. Uma petição popular anda a circular pedindo o afastamento do Juiz Ivo Rosa. É uma verdadeira tontice. Ivo Rosa, na ânsia de fazer ajustes de contas com o PM e com a seu colega Carlos Alexandre, cometeu erros enormes. Só que num Estado de Direito os erros dos juízes corrigem-se com recursos para outros juízes. Não com petições populares ou com pressões políticas.

 

  1. A Associação Sindical dos Juízes apresentou uma proposta de melhoria da lei sobre declarações de rendimentos de titulares de cargos públicos.
  • Não é um sucedâneo do enriquecimento ilícito. É uma forma de combater tentações de ocultação da riqueza ou até promessas de riqueza futura.
  • É uma proposta sensata, equilibrada, construtiva e positiva. Apesar disso, vejo o Governo e o PSD a torcerem o nariz à ideia. Só faltava mesmo isso para cavar ainda mais o descrédito. Afinal, todos falam em reformas, mas quando chega a hora da verdade todos fogem como o diabo da cruz.

 

 

LISTAS AUTÁRQUICAS DO PSD

 

  1. Nas listas que o PSD apresentou, percebem-se três apostas fortes: Lisboa, com Carlos Moedas; Coimbra, com José Manuel Silva; Funchal, com o actual vice-presidente do Governo Regional, Pedro Calado. Mesmo assim, para um partido que "quer dar a volta" ao mau resultado de há quatro anos, esperava-se mais ambição, sobretudo nos maiores municípios do país.

A propósito, o semanário NOVO – que saiu pela primeira vez esta sexta-feira – publicou a primeira sondagem sobre Lisboa. Não é brilhante para Carlos Moedas. É certo que ainda falta muito tempo. Mas deixar consolidar tendências pode ser um erro fatal.

 

  1. Além da falta de ambição, há vários erros desnecessários. O maior de todos é a escolha da candidata à Amadora, Susana Garcia.
  • Susana Garcia é, na prática, uma pessoa identificada com o Chega. Isso vê-se na linguagem, nas ideias, nas propostas. É uma espécie de André Ventura do sexo feminino.
  • Um líder moderado, responsável e no centro político como Rui Rio, não devia acolher no seu seio uma candidatura que em tudo é igual ao Chega. Só perde com isso. Perde no país sem ganhar nada na Amadora.
  • Claro que o PSD diz: é uma candidata autárquica. Se fosse candidata a deputada tudo seria diferente. Essa é uma explicação burocrática que não colhe. Politicamente, a percepção pública que fica é esta: o PSD não faz formalmente coligações com o Chega, mas depois acolhe no seu seio pessoas radicais e extremistas identificadas com o Chega. São sinais contraditórios. É assim que se perde credibilidade.

 

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