Opinião
Notas da semana de Marques Mendes no Negócios
A análise de Luís Marques Mendes ao que marcou a última semana da vida nacional e internacional. Os principais excertos da sua intervenção na SIC, nos temas escolhidos pelo Negócios.
35 HORAS PODEM SER INCONSTITUCIONAIS
1. É a lei mais perigosa e absurda que o Governo aprovou nestes seis meses. É um sinal errado em todas as direcções.
- É um sinal errado perante a Europa. Na UE há 14 países com 40 ou mais horas na função pública. Há 11 países com horário entre as 35 e as 40 horas. E só três países - França, Irlanda e Portugal - passam a ter um horário de 35 horas. Ou seja, países mais desenvolvidos que nós trabalham mais tempo. Nós, que precisamos de crescer, trabalhamos menos. É um absurdo.
- É um sinal errado para os portugueses. Porque transmite a ideia de que temos dois países. O país do sector privado trabalha mais. O país do sector público trabalha menos. Parece que entre os trabalhadores portugueses há filhos e enteados. Outro absurdo.
- É um sinal errado dentro da própria função pública. Os trabalhadores com vínculo à função pública passam a trabalhar 35 horas. Os que têm contrato individual de trabalho, continuam a trabalhar 40 horas. Ou seja, trabalhadores com as mesmas funções a praticarem horários diferentes. Mais um absurdo.
2. Última questão, ainda não suscitada por ninguém. Esta lei, se for ao Tribunal Constitucional, provavelmente é declarada inconstitucional. A razão é simples:
- Nos termos do art.º 167 nº 2 da Constituição, os Deputados não podem apresentar e aprovar leis que, no ano económico em curso, impliquem aumento de despesa. É a chamada lei travão.
- Ora, esta lei é da iniciativa dos Deputados e não do Governo.
- Ora, esta lei potencialmente tem aumento de despesa (ou implica admitir mais gente ou, pelo menos, fazer horas extraordinárias).
- Logo, é flagrantemente inconstitucional.
CATIVAÇÕES DE DESPESA EM CURSO
1. Os dados divulgados pelo INE e as previsões feitas pela OCDE são más notícias para a economia . Portugal não vai seguramente atingir a meta de crescimento do PIB prevista pelo Governo (1,8%); o investimento está parado e as exportações desaceleram.
2. De quem é a responsabilidade?
a) Em primeiro lugar é da conjuntura internacional que é adversa.
A economia mundial não está bem e a economia europeia não arranca.
b) Mas a acção do Governo também não tem ajudado. O Governo cometeu três pecados capitais:
- Primeiro, imprudência. Quando a economia não ajuda, impõe-se prudência. E o Governo não tem sido prudente. Exemplos: a lei das 35 horas e a reposição rápida de rendimentos. Isto significa mais despesa com menos receita. Por isso, o Governo já está a fazer cativações de despesas, incluindo despesa com salários do pessoal.
- Segundo, perda de confiança para investir. Decisões como as reversões nos transportes e as alterações no IRC não favorecem o investimento. Rasgar contratos celebrados e compromissos assumidos é rasgar a confiança.
- Terceiro, incerteza. Vamos ter medidas adicionais no Orçamento? Vai haver Orçamento Rectificativo? O imposto sucessório vai voltar? Os escalões do IRS vão ser mudados? Enquanto estas incertezas existirem não há clima para investir.
3. E aqui chegamos ao ponto nevrálgico: na política, os truques e as habilidades podem dar sucesso; mas na economia não há milagres. Tudo o que António Costa tem de dar ao PCP e ao BE para se aguentar no Governo é exactamente tudo aquilo que prejudica a economia.
MAIS 4 MIL MILHÕES PARA A CGD?
1. Acerca das decisões sobre a CGD há a dizer o seguinte:
a) Primeiro, um Presidente bem escolhido e os nomes já conhecidos são igualmente boas escolhas.
b) Segundo, importa explicar bem se são mesmo necessários quatro mil milhões Euros para reforçar o capital da Caixa. É muito dinheiro. Uma explicação cabal é indispensável, até para evitar suspeitas de "concorrência desleal" com os bancos privados.
2. Mas há uma outra questão de fundo a abordar: será que não se justifica um Inquérito Parlamentar à CGD, tendo em conta o "buraco" existente, o dinheiro envolvido, as responsabilidades e os responsáveis desta situação?
- No BPN houve um Inquérito Parlamentar; no BES houve um Inquérito Parlamentar; no Banif decorreu um Inquérito Parlamentar. Tudo Bancos onde o Estado meteu muito dinheiro.
- Então e na Caixa, onde o Estado já meteu em capital 2,4 mil milhões (desde 2009) e ainda vai meter mais quatro mil milhões? De quem é a responsabilidade? Quem são os responsáveis? Onde está o dinheiro perdido? Fica tudo escondido?
- Não se investiga a acção da Caixa porquê? Porque é um Banco do Estado? Se é do Estado, se tem dinheiro público e se dispõe de gestores públicos, mais uma razão para ser investigada.
- Por que é que o PS tem medo de um inquérito à CGD? Para esconder a acção de Armando Vara e outros? E o PSD, que receio tem? É para proteger algum gestor ou amigo?
- Será que o Bloco Central de Interesses tem mais força que a verdade e a coerência?