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31 de Julho de 2022 às 21:26

Marques Mendes: "O défice vai ficar bem abaixo do previsto. Talvez entre 1,2% e 1,4% do PIB"

No seu espaço de opinião habitual na SIC, o comentador Marques Mendes fala sobre os problemas de segurança e os impostos do Estado, entre outros temas.

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OS PROBLEMAS DE SEGURANÇA

 

  1. Voltou à agenda política o tema da segurança. Acontece de tempos a tempos. Claro que há sempre problemas de segurança no país. Desde logo temos agentes das forças de segurança mal pagos, designadamente na PSP e GNR. E temos também, com os Governos de António Costa, menos polícias na PSP e na GNR. Houve uma diminuição real.
  • Mesmo assim não devemos exagerar. Somos um país seguro. Um dos Países mais seguros do mundo.
  • E, quando tomamos decisões, convém evitar precipitações. A ideia de criar esquadras móveis que algumas horas depois de inauguradas já estão avariadas mata de ridículo qualquer decisor ou governante.

 

  1. Mas, caso se queira discutir a sério a questão da segurança, é preciso ir á questão de fundo: será que temos policias a menos? Ou será que temos policias dentro das esquadras, mas que deviam estar na rua? Como estamos na comparação com os 27 da UE? Vejamos:
  • Temos um rácio de 443 polícias por 100 mil habitantes. Estamos muito melhor que países como a Itália, Espanha, França e Alemanha. E muito acima da média europeia. Logo, estamos bem quantitativamente.
  • No conjunto dos 27, só três países têm um rácio melhor (Chipre, Grécia e Croácia). E em matéria de gastos públicos com segurança também estamos acima da média da UE (1,9% do PIB)
  • Mal, mesmo mal, só mesmo em número de mulheres nas forças de segurança. Aí somos o pior país da UE.

 

  1. Como se vê, o nosso grande problema na Segurança é o mesmo da Saúde, da Justiça ou da Educação. É um problema de má organização. Temos recursos, mas estão mal distribuídos. Aqui está um bom desafio para o MAI: colocar mais polícias na rua e pôr funcionários civis a fazer trabalhos administrativos.

 

ESTADO COBRA MAIS IMPOSTOS

 

  1. Está a acontecer em Portugal uma situação inédita: um crescimento anormal das receitas do Estado. Um crescimento muito acima do que o próprio Governo previa. Fruto de um crescimento económico maior que o esperado e sobretudo de uma alta inflação. O Estado ganha com a inflação. Vejamos três exemplos:
  • Receita do IVA: o Governo previa este ano um crescimento de 10,7%. Até junho, a receita do IVA está a crescer 26,9% (mais do dobro);
  • Receita do IRS: o Governo previa um crescimento de 4,7%. Até junho, o crescimento é de 12,3% (quase três vezes mais);
  • Receita total: o Governo previa um crescimento de 6,7%. Até meio do ano, o crescimento é de 29,7%. Em valores absolutos mais de 4 mil milhões de Euros de receita cobrada.

 

  1. Aqui chegados, há que sublinhar três coisas importantes:
  2. Primeiro: não vamos ter superavit orçamental, mas o défice vai ficar bem abaixo do previsto. Talvez entre 1,2% e 1,4% do PIB. O que é bom. Défice baixo em tempo de turbulência dá-nos segurança junto dos mercados.
  3. Segundo: a dívida pública em percentagem do PIB vai ficar abaixo dos 120% do PIB, muito próximo do valor da dívida espanhola e do valor pré-pandemia (116,9%). Outra boa notícia. A divida é a nossa grande vulnerabilidade.
  4. Terceiro: mesmo assim, há "folga" para aprovar apoios sociais às famílias mais pobres, às empresas mais frágeis e aos pensionistas, antecipando eventualmente para 2022 uma parte do aumento previsto para 2023.
  5. Finalmente: a questão do apoio às famílias e empresas é a mais urgente. Ainda hoje, uma grande empresa de energia fala de um aumento de 40% na factura de eletricidade em Agosto. Claro que o ministro desmente. Mas se isto suceder é uma calamidade.

 

FAZEM SENTIDO NOVOS IMPOSTOS?

 

  1. A propósito dos lucros de vários bancos e empresas de energias, voltou esta semana a falar-se de novos impostos para "taxar" lucros extraordinários. A ideia é sedutora. É do género populista: os ricos que paguem a crise.

 

  1. Mas, em boa verdade, seria uma ideia completamente contraproducente.
  • Primeiro, se as empresas têm mais lucros, ainda bem. Pagam mais impostos ao Estado e têm mais condições para fazerem novos investimentos, gerando mais riqueza e mais emprego.
  • Segundo, imagine-se que mais tarde essas empresas têm prejuízos. Será que, mantendo a coerência, o Estado lhes vai dar um subsídio ou uma compensação? Claro que não. Seria um absurdo!
  • Terceiro, seria um mau sinal para os investidores. Portugal já tem a segunda taxa mais alta de IRC na UE (a seguir a Malta). Os nossos principais concorrentes na atração de investimento têm taxas mais baixas. Se agravarmos ainda mais o IRC, damos um sinal errado. Vejamos:

- O IRC em Portugal tem uma taxa máxima (incluindo derramas) de 31,5%. A média na UE é de 22%.

- E os países de Leste, nossos concorrentes directos, têm taxas abaixo dos 20%.

 

  1. Em conclusão: a solução não é lançar novos impostos. A solução é levar as empresas, designadamente as de energia, a reinvestirem os lucros extraordinários que têm em vez de distribuírem dividendos pelos accionistas.

 

PEDOFILIA NA IGREJA?

 

  1. Primeiro, uma excelente investigação do jornal Observador: um trabalho sério e muito profissional. Depois, uma explicação absolutamente tardia do Patriarcado de Lisboa: a Igreja tarda em perceber que, nestas matérias, tem o dever de esclarecer, com verdade e prontidão. Finalmente, uma situação inaceitável: um padre abusou sexualmente de uma criança, não foi investigado e fica impune porque não foi denunciado às autoridades.

 

  1. Esta situação é grave. Mas a culpa é bem conhecida. A culpa é das regras erradas e injustas que a Igreja teve até 2020. Até há dois anos, um caso de abuso sexual não era denunciado às autoridades. Muito mal. Afinal, a lei é igual para todos, padres ou não padres. Ninguém está acima da lei. Ainda bem que o Papa Francisco teve a coragem de mudar as regras.
  • José Policarpo, em 1999, ao tomar conhecimento do caso, devia tê-lo denunciado aos tribunais. Era nesse momento e não em 2019 que a denúncia devia ter sido feita. E devia ter colocado fora da Igreja o padre abusador. Um padre que abusa sexualmente de uma criança não merece ser padre. Mas essas não eram então as regras da Igreja. Infelizmente.
  • Manuel Clemente, em 2019, não se pode dizer que escondeu o caso. Se o cardeal o quisesse esconder, não teria tomado a iniciativa de falar com a vítima. E ele tomou por duas vezes essa iniciativa. Quem quer esconder alguma coisa não tem esse comportamento. É certo que mesmo assim podia ter participado às autoridades. As regras nesse ano já estavam em mudança. Mas, em 2019, já não tinha qualquer efeito prático. O caso estava prescrito. E a vítima pedira o anonimato.

 

  1. Em conclusão: há uma vítima que merecia atenção e respeito. Afinal, a missão da Igreja é proteger as crianças e não violentá-las. E há um abusador que devia ser investigado, mas que "se safa" só porque é padre. É por estas razões que muitos cidadãos perdem a fé e se indignam com a Igreja Católica.

 

CHEGA E SANTOS SILVA EM CONFLITO

 

  1. Mais uma semana de perfeito "teatro político" entre o Chega e Santos Silva. Este conflito só interessa mesmo à bolha política e mediática. Não diz nada ao povo. É tudo artificial. É tudo cheio de cinismo.

Claro que há sempre quem lucre com estas manobras teatrais:

  • O Governo, em primeiro lugar. Enquanto se discute o "sexo" dos anjos, tentam desviar-se as atenções dos problemas reais do país – os problemas da Saúde e da inflação, por exemplo.
  • O Chega, em segundo lugar. Tenta mostrar que faz muita oposição. Mas, no fundo, faz uma má oposição.

 

  1. Veja-se o exemplo dos imigrantes. O ataque do Chega aos imigrantes é o maior disparate e a maior injustiça do mundo.
  • Primeiro, precisamos de imigrantes porque nos falta mão-de-obra para trabalhar. Basta ouvir os empresários, de norte a sul do país.
  • Segundo, precisamos de imigrantes para reforçar a Segurança Social, porque somos dos países do mundo que mais população está a perder.
  • Terceiro, temos comunidades de imigrantes que são absolutamente exemplares. Pensemos na vasta comunidade de brasileiros que estão em Braga e noutras cidades do país. São simplesmente notáveis em termos de integração. Pensemos na comunidade cabo-verdiana. É um excelente exemplo de trabalho e profissionalismo. Pensemos na comunidade ucraniana. Outro fantástico exemplo na sociedade portuguesa.
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