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23 de Janeiro de 2022 às 21:31

Marques Mendes: Ganhe quem ganhar, vai acentuar-se a ideia de governação ao centro

No seu espaço de opinião habitual na SIC, o comentador Marques Mendes fala sobre as medidas sobre a pandemia, o balanço dos debate e as sondagens, entre outros temas.

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PANDEMIA/VACINAÇÃO

  1. Pico da pandemia. Segundo um relatório do Instituto Superior Técnico a que tive acesso, o pico desta pandemia deve dar-se ligeiramente mais tarde do que o mesmo tinha previsto. A nova previsão do IST é: pico entre 6 e 12 de fevereiro. Razão deste ligeiro adiamento: a campanha eleitoral e as escolas. Segundo os especialistas do IST, uma campanha eleitoral "à antiga", com ajuntamentos populares, não tinha entrado nas previsões iniciais. E a verdade dos factos é que a campanha está a provocar contágios.

  1. Mas não vale a pena dramatizar: um pico mais tardio não trás complicações acrescidas dentro dos hospitais. Comparando o Portugal de hoje com o Portugal de há um ano, a situação está bem mais controlada actualmente: temos três vezes menos internados; quatro vezes menos doentes em UCI; e sobretudo cinco vezes menos óbitos do que no mesmo período de 2021.

 

  1. Vacinação: já fomos os melhores do mundo. Só que não há bela sem senão. Hoje a realidade é outra: em matéria de dose de reforço, já não somos o melhor país da União Europeia. É certo que estamos acima da média da União. Mas estamos num modesto décimo segundo lugar. Causa: começámos com um mês de atraso o processo de vacinação com a dose de reforço.

 

  1. Vacinação dos maiores de 60 anos, com dose de reforço: esta é a boa noticia. Aqui, na população mais idosa e mais vulnerável, estamos num honroso terceiro lugar no ranking da EU, com 90% de vacinação com a dose de reforço. Ou seja, naquela  que é a faixa prioritária da vacinação, com 60 ou mais anos, estamos francamente bem. Melhor do que nós na UE só a Dinamarca e  Irlanda.

 

 

 

RUI MOREIRA ABSOLVIDO

 

  1. Rui Moreira foi absolvido. Uma boa notícia para o próprio e para a democracia.
  • Rui Moreira "ganhou" bem este processo. Não ganhou por razões formais ou acessórias. Ganhou pelo fundo da questão: não houve provas de ter cometido qualquer ilegalidade. E teve um comportamento exemplar: discordante do MP mas sempre respeitador da justiça. Apesar dos prejuízos políticos que esta acusação sem sentido trouxe para a sua imagem pública, em particular nas eleições autárquicas, onde perdeu a maioria absoluta.
  • A democracia também ganhou. É sempre bom saber que um político não viola a lei e não comete um crime.

 

  1. Para o MP tudo isto é um desastre. Só no espaço de um mês, em processos mediáticos, são três derrotas do MP. Fora as derrotas que já vêm de trás. Começa a ser tempo de exigir ao MP uma explicação.
  • Perder em tribunal de vez em quando é normal. Uma acusação não pode dar sempre em condenação. Mas acumular derrotas a seguir a derrotas passa a ser um problema sério para a imagem da justiça.
  • O MP adora investigar e acusar políticos. Investigar está certo. Ninguém está acima da lei. Agora, acusar só mesmo quando há provas.
  • É que para ter sucesso em tribunal não chega ter uma narrativa atraente e boa imprensa. Para ter sucesso em tribunal é preciso ter provas.
  • Passadas as eleições, vai ser tempo de PR, AR e Governo – qualquer que ele seja – exigirem explicações ao MP.

 

 

 

PS E PSD PRÓXIMOS NAS SONDAGENS

 

  1. Há uma semana, PS e PSD estavam distantes nas sondagens. Agora, estão próximos um do outro. Porquê esta aproximação? Três razões essenciais:
  • Primeira e principal razão: o desgaste de seis anos de governo. Este é o maior adversário de António Costa. Em 2019, o primeiro-ministro estava em alta. Agora, o cansaço em relação ao governo e ao primeiro-ministro é grande. E as sondagens começam a mostrá-lo agora. À medida que os indecisos começam a diminuir.
  • Segundo: arrogância e desconfiança de uma maioria absoluta. António Costa começou a pedir a maioria absoluta. É um caminho legítimo. Só que o povo de esquerda, sobretudo depois de Sócrates, não gosta de maiorias absolutas. Até acha que um pedido destes é um gesto de arrogância. Lembram-se do tempo em que o PS comparava maioria absoluta a poder absoluto.
  • Terceiro: a campanha de Rui Rio. É uma campanha simples mas eficaz. Tem três preocupações: por um lado, multiplicar confiança e simpatia; por outro, evitar exageros ou euforias para não gerar anti-corpos ou permitir agitar o "papão" do regresso da direita; finalmente, mostrar união interna e aproveitar-se dos erros do adversário.

 

  1. Posto isto, reafirmo o que digo desde dezembro: está tudo em aberto. Tanto pode ganhar o PS como o PSD. O número de indecisos é ainda tão grande que a balança pode pender para qualquer dos lados. Estas são as eleições mais incertas e imprevisíveis desde 2002. Ganhe quem ganhar, a diferença será pequena.

 

 

ÚLTIMA SEMANA DA CAMPANHA

 

  1. A última semana vai ser tensa e intensa. O que vamos ter?
  2. Primeiro: o reforço da bipolarização entre PS e PSD, com um apelo ainda maior por parte de Rio e Costa ao voto útil (um problema para os pequenos partidos).
  3. Segundo: à esquerda, o PS vai dramatizar o discurso contra o PSD, para tentar inverter a dinâmica das sondagens. O discurso de maioria absoluta já caiu. Agora, o objectivo é não perder.
  4. Terceiro: à direita, o PSD vai fazer-se de morto o mais tempo possível, sem introduzir temas de fractura ou clivagem, porque as coisas lhe correm bem e só quer manter a dinâmica eleitoral que foi criada.
  5. Quarto: ambos, PS e PSD, vão evitar cometer erros. Quem menos erros cometer mais hipóteses tem de sucesso. Para já, no campeonato dos erros, o PS vai ligeiramente à frente. O exemplo da votação do Orçamento da Câmara Municipal de Lisboa é um erro enorme. Quem perde deve ter humildade democrática.

 

  1. No meio destas mudanças vamos ter uma grande incógnita: quem mais vai ser afectado pela abstenção Covid? Vamos ter milhares de pessoas a abster-se por causa da Covid. Ou porque estão isoladas e não querem votar. Ou porque, não estando isoladas, têm medo do contágio e não vão votar. Quem é que mais vai ser afectado com esta abstenção? Só mais tarde se saberá.
  • Uma coisa é certa: esta abstenção podia ter sido evitada. Se, em novembro, antes da dissolução, o Governo e os partidos tivessem mudado a lei eleitoral para fazer o óbvio: dois dias de votação. No sábado, dia 29, votavam os isolados; no domingo, dia 30, votavam os outros.

 

O QUE VAI MUDAR DEPOIS DAS ELEIÇÕES?

 

  1. Ganhe quem ganhar, é possível antever, desde já, três mudanças importantes:
  2. Primeiro: vamos voltar à normalidade política. Ou seja: não se repetirá o cenário de 2015. Na altura, ganhou um partido e governou outro. Agora será diferente: quem tiver mais um deputado vai governar; quem tiver menos um deputado vai ser oposição.
  3. Segundo: volta a reduzir-se o arco da governação. PCP e BE vão deixar de ter influência directa ou indirecta no governo. Voltam à sua natureza de partidos de protesto. No entretanto, sairão penalizados desta eleição pelo chumbo do Orçamento do Estado.
  4. Terceiro: vai acentuar-se a ideia de uma governação ao centro. Ou governa o PS com governo minoritário viabilizado na Assembleia da República pelo PSD; ou governa o PSD, acompanhado da IL e CDS, com viabilização parlamentar do PS.

 

  1. Importante também seria mudar o modelo económico e social: o modelo actual faliu. Esta questão é séria. Mas não é partidária. É nacional.
  • Nestas duas décadas já fomos ultrapassados em termos de PIB per capita por 7 países do leste europeu.
  • Só de 2015 até hoje foram 4 os que nos ultrapassaram (Estónia e Lituânia em 2017; Hungria em 2020; Polónia em 2021). Dados oficiais da Comissão Europeia.

Sem economia a sério, nem crescem os salários; nem aumentam as pensões; nem se criam condições para resolver o problema da natalidade.

 

 

O CONFLITO NA UCRÂNIA

 

  1. Primeiro ponto: há quem diga que a invasão da Ucrânia está iminente. É a opinião dos especialistas da NATO em serviços de informação. Há outros sectores que dizem: só depois dos Jogos Olímpicos de Inverno. Numa coisa todos convergem: o ataque vai mesmo acontecer.

  1. Segundo ponto: qual é a grande questão? A Rússia considera que a Ucrânia está no seu espaço vital de influência. Não aceita a sua inclusão na NATO e até na UE. Ao contrário, os ocidentais reclamam que um país independente é soberano para decidir o que entender. Estamos num impasse difícil de ultrapassar.

 

  1. Terceiro ponto: porquê a pressa? Porque há uma cimeira da NATO em Madrid (Junho de 2022) onde se vai discutir o seu novo Conceito Estratégico. Os russos receiam que a Ucrânia seja "encarada" no novo Conceito Estratégico. Por isso, antecipam a pressão militar. Acresce que Putin está com problemas internos. Quando assim é, nada melhor que arranjar um inimigo externo.

 

  1. Quarto ponto: se houver invasão, como responde o ocidente? As opiniões dividem-se: os políticos, com os EUA à cabeça, querem responder apenas com sanções económicas; os militares da NATO querem resposta militar. O mais provável é que a resposta seja só ao nível de sanções económicas. Mas são sanções tão severas que podem asfixiar a economia russa.

 

  1. Quinto ponto: pode haver repercussões globais? É inevitável. O Ocidente aplica fortes sanções económicas à Rússia. A Rússia retalia. Basta pensar no cenário de a Rússia cortar o gás que abastece a Alemanha. Entramos numa escalada que atinge a economia mundial. Em conclusão: ou a diplomacia faz um "milagre" ou corremos o risco de um conflito muito sério.

 

 

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