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12 de Fevereiro de 2023 às 21:24

António Costa está a ponderar passar as CCDR a institutos públicos

As notas de Marques Mendes no seu comentário semanal na SIC. O comentador fala sobre os sismos na Turquia e na Síria, a inflação e os atrasos no PRR, a nova estratégia do Governo entre outros temas.

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OS SISMOS NA TURQUIA E SÍRIA

Primeiro apontamento: a calamidade desperta a solidariedade. A calamidade na Turquia e na Síria foi brutal. Mas a solidariedade foi impressionante. No caso da Turquia, até países com más relações com o regime turco – como a Arménia ou a Suécia – não perderam tempo a expressar o seu apoio. É caso para sublinhar: apesar de vivermos num mundo cada vez mais perigoso e egoísta, ainda há lugar para a esperança!

Segundo apontamento: Portugal esteve muito bem ao enviar para a Turquia uma missão de apoio. Como também para o Chile, país que está confrontado com uma catástrofe de incêndios florestais. Há uma boa lição a tirar: em matéria de cooperação internacional, neste tipo de calamidades, faz todo o sentido termos uma força rápida de intervenção capaz de ser mobilizada em 24 horas. Reforça o nosso prestígio externo. Um país pequeno como Portugal não se afirma pela quantidade de meios. Destaca-se pela rapidez e eficácia da sua intervenção.

Terceiro apontamento: o risco sísmico em Portugal. Nestes momentos, os palpites e opiniões surgem de todo o lado. Nada a opor, embora às vezes gerem mais confusão que esclarecimento. Mas acho que os portugueses apreciariam ver o Parlamento criar uma Comissão Eventual que, ouvindo especialistas e responsáveis do Estado, respondesse solidamente a algumas questões básicas: as regras de construção que temos são suficientes ou precisam de ser melhoradas? Os edifícios públicos vitais, tipo hospitais, são de construção segura ou precisam de melhoramento? Há fiscalização suficiente das leis que temos ou não? Há seguros eficazes contra risco sísmico? Aqui fica a sugestão.

A QUEDA DOS SALÁRIOS

O INE deu-nos esta semana indicadores brutais sobre 2022: por causa da inflação, tivemos no ano passado uma forte queda dos salários; o poder de compra baixou para valores de 2018. Um autêntico retrocesso social.

A quebra real dos salários no sector público foi, em média, de 7,2%. No sector privado foi de 4,2%. Uma enormidade. Esta perda maior no Estado não surpreende: o aumento salarial foi de apenas 0,9% em 2022.
O poder de compra dos salários baixou para os níveis de 2018. O salário médio real, em termos brutos, no último trimestre de 2018, estava nos 1.322 euros. No último trimestre de 2022, ficou-se pelos 1.334 euros, praticamente igual. São quatro anos perdidos.

Todos os sectores de actividade foram penalizados. Mas há diferenças: a administração pública foi o sector mais afectado; o alojamento e a restauração foram os menos atingidos.

O ano de 2023 pode ser ligeiramente melhor que 2022: por um lado, há a expectativa que a inflação baixe ao longo do ano; por outro lado, os aumentos salariais em 2023, apesar de insuficientes, são maiores do que no ano passado. Mesmo assim, há que ter prioridades:

Na alimentação: é essencial apoiar os mais carenciados. O cabaz alimentar essencial tem um aumento que é o dobro da inflação global.

Na habitação: é preciso atenção à classe média. O aumento das prestações da casa é asfixiante para alguns sectores.

Nas pensões: os pensionistas têm que ver atualizadas as suas pensões. Os pensionistas mais antigos, mas também os mais recentes, alvo de uma injustiça. Quem se reformou em 2022 não tem direito a atualização da sua pensão este ano. Só em 2024. É o que diz a lei. Mas não é justo. Antes, praticamente não havia inflação. Agora há e é muito alta. É preciso, pois, mudar a lei e atualizar todas as pensões em 2023.

OS ATRASOS DO PRR

O PRR voltou à agenda política: reunião entre PR e PM na quarta-feira; Conselho de Estado em março; relatório da Comissão de Acompanhamento dentro de dias. Há uma preocupação geral: os atrasos na aplicação da bazuca. Até o Presidente da CA, Pedro Dominguinhos, já fez recomendações públicas para acelerar o processo.

Eu não tenho dúvidas de que vamos aplicar, euro a euro, cêntimo a cêntimo, o PRR. Que não vamos desperdiçar recursos. Somos maus a planear, mas em "estado de necessidade" temos uma capacidade enorme de "desenrascar". Mas há duas realidades a ter em atenção: primeiro, é preciso gastar bem. Ter resultados. Segundo, passados 19 meses sobre a aprovação do PRR, há uma taxa de execução muito baixa.

Vejamos:

O valor inicial do PRR era de 16,6 mil milhões de euros. Até esta semana, o valor efetivamente pago é de 1,475 milhões de euros. Uma taxa de execução de 8,8%.

Por áreas, distribuído os valores já pagos, a transição digital é, em termos percentuais, a que tem melhor taxa de execução (19,3%); a transição climática está no meio termo (9,7%); e a área da resiliência, a que tem maior dotação, é a que tem a execução mais baixa (6,2%).

Finalmente, em que sectores de atividade estão as piores taxas de execução? Onde económica e socialmente não deviam estar:

Na habitação (só 3,3% de execução). Socialmente lamentável.

Nas empresas 4.0 (só 2,6% de execução). Economicamente inacreditável.

Na descarbonização da indústria (0% de execução de fundos). Ambientalmente lamentável. Mudar esta realidade é urgente. Um desafio novo para os Ministros da Economia e do Ambiente.

A NOVA ESTRATÉGIA DO GOVERNO

O Governo assustou-se ultimamente com dois factos: a queda nas sondagens e o risco de eleições antecipadas a seguir às Europeias. Por isso, mudou de estratégia: no plano da acção, da comunicação e do combate político.

No plano da acção, o Governo está a tentar retomar a iniciativa política. Há meses que andava a reboque dos acontecimentos. Agora está a tentar mudar. Vê-se na ideia de um CM especial sobre habitação. Nas visitas do PM dedicadas ao PRR. Até na desconcentração administrativa. O PM está a ponderar passar as CCDR a institutos públicos e pode anunciá-lo a curto prazo.

No plano da comunicação, o Governo também mudou. Deixou a atitude de sobranceria para passar a assumir uma postura de humildade. Foi assim com o PM na entrevista à RTP; foi assim esta semana com o MNE na AR, sobre o Hospital Militar. Já antes tinha sido com o ME na questão dos professores. Há uma tentativa de anestesiar o país e a oposição.

Finalmente, no plano do combate político. Também aqui o PS mudou de atitude. A partir do momento em que caiu nas sondagens, os socialistas passaram a atacar a sério o PSD: o caso emblemático foi o da TAP. O PS veio ressuscitar a privatização feita em 2015 e uma eventual negociata em seu redor. Tudo para embaraçar Luís Montenegro.

Ninguém sabe se esta nova estratégia vai dar para recuperar. O Governo tem sérias dificuldades pela frente.

Primeiro, a crise económica, que ataca muito a classe média e os estratos mais carenciados; depois, a conflitualidade social, que voltou em força agora que não há geringonça; finalmente, o cansaço político. A generalidade das pessoas começa a estar cansada do Governo, do seu estilo, do seu discurso. São muitos anos de poder. Já sucedeu o mesmo no fim do cavaquismo e do guterrismo. Uma coisa, porém, é certa: o Governo pode estar em dificuldades, mas não deitou a toalha ao chão!

ZELENSKY NA EUROPA

O périplo europeu de Zelensky foi um sucesso. Isso deve-se ao Presidente ucraniano e à força da opinião pública europeia.

Zelensky é um caso singular. Antes da guerra ninguém dava nada por ele. Hoje não é exagero compará-lo a Winston Churchill. Além de exímio comunicador, Zelensky é um líder com inegável sentido de Estado.

Zelensky fez uma coligação com a opinião pública europeia. Ele fala ao coração dos europeus de forma tocante e exemplar. A seguir, a opinião pública europeia força os líderes europeus a apoiar a Ucrânia.
França e Alemanha, os motores da UE, passam a vida a hesitar. Forçados pela opinião pública, acabam sempre a apoiar. Foi assim que Zelensky conseguiu o envio dos tanques Leopard 2 e é assim que vai acabar por conseguir o apoio dos caça F16. E bem. Os Ucranianos estão a lutar por eles e por nós. Pela sua independência e pela nossa segurança. A vitória da Rússia seria a derrota da Europa.

A entrada da Ucrânia na UE é um dossiê mais difícil. Acho que vai acontecer e é estrategicamente essencial. Mas há na UE uma grande hipocrisia. O que alguns líderes europeus dizem não corresponde ao que pensam. Vai ser uma batalha dura para vencer três sérias resistências.

Uma resistência política. A ideia de que é mau ter uma UE com peso excessivo do Leste. É o que pensam vários Países.

Uma resistência institucional. A Ucrânia, sendo um País grande pode ter uma influência desproporcionada nos processos de decisão. É o que pensam vários Estados.

Uma resistência financeira. Sendo um país pobre, a Ucrânia irá buscar muitos fundos estruturais, penalizando os países que hoje são os maiores beneficiários. É preciso encontrar novos recursos para a UE.

BONS EXEMPLOS NO PAÍS

O bom exemplo do PR perante a agressão a um imigrante nepalês. Foi a Olhão, condenou a agressão e fez pedagogia pela tolerância, contra a xenofobia e o racismo. Muito bem. Em matéria de imigração não pode haver ambiguidades. Precisamos de imigrantes, venham eles de onde vierem, eles são essenciais à nossa economia e à nossa segurança social, devemos integrá-los e não os segregar.

O bom exemplo dos Ministros da Educação e do Ensino Superior, mantendo os exames nacionais no ensino secundário. Há uma semana critiquei o risco da sua abolição. Hoje saúdo a sua manutenção. É muito positivo quando há bom senso e não passamos o tempo com aventuras e experiências.

O bom exemplo do Ministro do Ambiente, Duarte Cordeiro. Fez aprovar um Simplex no Ambiente, designadamente na simplificação dos licenciamentos ambientais. A ideia é excelente. Falta saber se vai resultar na prática.

O bom exemplo de Carlos Moedas e de D. Américo Aguiar na JMJ. Como se vê, tudo era possível: baixar custos; fazer o altar de forma mais rápida do que estava previsto; restabelecer o consenso em torno da JMJ. Há polémicas que são virtuosas. Carlos Moedas mostrou capacidade de decisão e coordenação.

O bom exemplo dos professores. Mostraram ontem, novamente, a sua razão e a sua força. Agora, é preciso acelerar um acordo. As escolas têm de voltar á normalidade. Há milhares de alunos que sofrem sem aulas.
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