Opinião
Notas da semana de Marques Mendes
As notas da semana de Marques Mendes nos seus comentários na SIC. O comentador fala sobre a prisão de Vara, a crise no PSD, os futuros líderes do PSD, as tabelas de retenção na fonte e analisa se a austeridade acabou mesmo.
A PRISÃO DE VARA
A prisão de Vara tem várias lições:
- Primeira lição: é o princípio do fim de uma ideia generalizada em Portugal – a ideia de que para a cadeia só vai a arraia miúda; de que os poderosos se safam sempre à prisão. Como se vê, não é assim: Vara foi muito poderoso no PS, no país e na banca e está hoje na prisão.
- Segunda lição: como se verá em próximos processos (por exemplo, na Operação Marquês), Armando Vara é apenas uma ponta do icebergue de uma rede muito poderosa que durante 20 anos, ou mais, existiu em Portugal.Que rede? Uma rede liderada por Sócrates, Vara e Carlos Santos Silva, que começou a operar ainda no tempo de Guterres, nos anos 90 e que foi até ao fim do consulado de Sócrates em 2011; Que objectivos? Uma rede que durante duas décadas pretendeu controlar o país – começando no PS, continuando na banca, alastrando pela comunicação social e pelas grandes empresas (caso da PT).
- Terceira lição: este homem, Armando Vara, para ajudar a destruir a CGD e o BCP, não teve apenas o aval de Sócrates. Teve também a aprovação do Banco de Portugal. Convém nunca esquecer que o BP deu autorização para que Vara fosse o senhor todo poderoso da Caixa e do BCP.
A CRISE NO PSD
- Há uma semana antecipei que Rio ganharia no Conselho Nacional. Para mim, era óbvio. Por que é que Rio ganhou? Por três razões:Primeiro: jogou em casa, ou seja, jogou no terreno que lhe dava jeito – o Conselho Nacional e não eleições directas. A verdade é que na história do PSD nunca um líder perdeu uma votação relevante em Conselho Nacional. Segundo: fez dois bons discursos, acutilantes e mobilizadores: um a responder a Montenegro; o segundo a apresentar a Moção de Confiança. Terceiro: foi de um grande profissionalismo. Foi profissional no discurso e na comunicação, na gestão dos seus apoios, na forma como desgastou os seus adversários em Conselho Nacional.
- O que é que ganhou? Perante o país, não ganhou nada. Esta disputa não disse nada ao país. Porque não foi feita com base em ideias. Discutiu-se mais a forma de votação da moção que uma única ideia para o país. Perante o partido, ganhou duas coisas: ganhou em definitivo o direito de ir às eleições legislativas; e ganhou adrenalina. Rui Rio e os seus apoiantes ficaram mais motivados, mais activos, com mais speed.
- O que muda a partir de agora? Depende de Rui Rio. Rui Rio deve fazer esta reflexão: durante estes oito dias de confronto no PSD ninguém elogiou a liderança de Rui Rio. Nem sequer um único dos seus apoiantes. Criticaram Montenegro, disseram que os mandatos devem ser cumpridos e que este desafio era inoportuno. Mas nenhum dos seus apoiantes disse que Rui Rio estava a fazer um bom trabalho. Este é o problema de Rio: é líder mas ninguém está feliz com a sua liderança. Rui Rio deve, pois, aproveitar esta oportunidade para mudar. Deve ser inclusivo, acutilante e diferenciador.
- Inclusivo – Deve internamente falar com toda a gente e chamar mais gente a trabalhar consigo;
- Acutilante – Deve falar para António Costa e para o Governo como falou para Montenegro – claro, firme e assertivo;
- Diferenciador – Deve ter causas que diferenciam o PSD do PS. Na economia, na saúde, no combate à pobreza e às desigualdades sociais, no sistema político. Se Rui Rio mudar, a vitória foi importante. Se não mudar, foi uma vitória de Pirro. Aplica-se então esta máxima: "de vitória em vitória até à derrota final".
- O futuro de Montenegro – Ganhou o direito de estar na pole position para a corrida à liderança, daqui a 10 meses, se as coisas correrem mal ao PSD. A tradição no PSD é que quem desafia a liderança está sempre na primeira linha do combate seguinte. No entretanto, deve prepara-se: estruturar um pensamento político para o país, seja na economia, seja no plano europeu.
FUTUROS LÍDERES DO PSD?
- Há, pelo menos, sete potenciais candidatos à liderança do PSD no futuro:
Pesos pesados:
- Passos Coelho – Pode ter a tentação de regressar. No imediato, não me parece muito prudente e inteligente. Mas nunca se sabe.
- Luís Montenegro – Passou a ser incontornável. A partir de agora, todos têm de contar com a sua candidatura.
- Paulo Rangel – Foi um concorrente à liderança no passado. Pode voltar a sê-lo no futuro. Qualidades não lhe faltam. Para já, está decidido que vai ser novamente cabeça de lista do PSD nas europeias.
Nova geração:
- Carlos Moedas – A sensação que tenho é que vai ser líder. Só não se sabe é quando. Não será no imediato.
- Miguel Pinto Luz – O actual vice-presidente da Câmara de Cascais tem ambição e qualidades. Está a fazer o seu caminho.
- Pedro Duarte – Outro jovem cheio de qualidade e talento. É igualmente incontornável. Ou como candidato ou como um excelente número dois.
- Miguel Morgado – Outra boa cabeça. Qualidades políticas não lhe faltam. O problema, pelo menos para já, são os apoios.
- Em conclusão, o futuro vai depender de três realidades: Do resultado que Rui Rio tiver nas legislativas; Do resultado do PS. Uma maioria absoluta de António Costa assusta. A falta de maioria atrai. Das condições que cada um tiver. Para se ser eleito líder, não chega ter qualidades. É preciso ter condições (apoios).
VAI HAVER ALÍVIO FISCAL?
- Não vai haver alívio fiscal, mas vai haver a sensação de alívio. Por duas vias: Primeira: por causa dos reembolsos de 2018. Os portugueses vão receber este ano, em Abril/Maio, reembolsos do IRS, maiores do que imaginavam. Porquê? Porque em 2018 andaram a pagar de IRS mais do que deviam. Um truque do Governo para dar uma sensação de alívio em ano eleitoral. Segunda: por causa das taxas de retenção na fonte aprovadas para 2019 e divulgadas esta semana. No OE para 2019 não há nenhum alívio no IRS. Mesmo assim, os contribuintes com menos rendimentos – até 40 mil euros anuais – vão este ano, mês a mês, descontar de IRS menos do que descontaram em 2018. Porque este ano é ano eleitoral. Depois, em 2020, já depois das eleições, fazem-se acertos e já receberão menos de reembolsos.
- Ou seja: tudo isto é um truque eleitoral. Trata-se de o Governo usar o sistema fiscal para dar aos contribuintes uma ilusão de alívio fiscal. Não há alívio mas parece que há. Não é bonito mas ajuda à campanha eleitoral.
A AUSTERIDADE ACABOU MESMO?
- Neste fim de semana tivemos mais um confronto verbal: o PM a reafirmar que a austeridade acabou; Assunção Cristas a insistir que a austeridade até se agravou. Em que ficamos? Ambos têm razão: A austeridade acabou no que diz respeito às pessoas – os cortes nos salários da função pública e nas pensões foram repostos pelo Governo; A austeridade não acabou nos serviços públicos e no investimento público.
- Caso da saúde – É o próprio Tribunal de Contas a reconhecer que tem havido menos transferências que no passado;
- Caso das obras públicas – O normal, a 10 meses de eleições, seria o Governo andar a fazer inaugurações. Não anda, porque quase nada tem para inaugurar. Por isso, substitui inaugurações por anúncios. Esta é a prova provada de que não acabou a austeridade no investimento público.
- Por que é que o Governo seguiu esta estratégia? Por duas razões: Primeiro: por imposição dos seus parceiros. Foram o PCP e o BE que impuseram ao PS a devolução de rendimentos, feita toda de uma vez logo no primeiro ano de mandato. O PS propunha-se fazer de forma gradual, em dois anos. Ora, um aumento de despesa tão forte e tão rápido obrigaria inevitavelmente a cortar no investimento público. Segundo: porque esta estratégia é mais popular. Devolver rendimentos às pessoas é muito mais popular que apostar no investimento público. Afinal, as pessoas votam, os serviços não.