Opinião
Notas da semana de Marques Mendes
A análise de Luís Marques Mendes ao que marcou a última semana da vida nacional e internacional. Leia os principais excertos da sua intervenção na SIC.
MARCELO E OS SEM ABRIGO
- O PR sinalizou publicamente o seu desejo de o país ter um plano que permita até 2023 acabar com os sem abrigo. De que é que estamos a falar?
- De cerca de 3.500 pessoas que vivem na rua;
- De um drama que existe, sobretudo, em 15 concelhos, à cabeça dos quais Lisboa, Porto, Coimbra, Setúbal e Aveiro.
- O que há a dizer desta ideia? 3 coisas:
a) Primeiro: o PR teve, para já, um mérito – o mérito de colocar o tema na agenda política e mediática.
b) Segundo: é uma grande causa, embora seja uma causa difícil de tratar. O problema dos sem abrigo é, sobretudo, um problema de pobreza. Mas não é só um problema de pobreza. É também um problema de desestruturação da sociedade, com raízes muito diversificadas.
c) Terceiro: criar um Plano para acabar com os sem abrigo faz-me lembrar o plano criado por Cavaco Silva nos anos 90 para acabar com as barracas em Portugal. Também então, como agora, o que se dizia era isto: é uma grande causa mas impossível de concretizar com sucesso. Pois bem. as barracas acabaram e os sem abrigo também podem acabar.
- Desde que haja um Plano com objectivos concretos, quantificados e calendarizados.
- Desde que haja um forte envolvimento do Estado Estado, das autarquias locais e das IPSS.
A CONDENAÇÃO DE VARA
- Eu já anteriormente o tinha dito e agora reafirmo – a condenação de Armando Vara e de outras figuras públicas, no Face Oculta, e a confirmação dessas condenações agora no Tribunal da Relação, evidencia, a meu ver, uma mudança de paradigma por parte da Justiça. Os tribunais, nos últimos anos, passaram a ter mão muito mais pesada para os chamados crimes de colarinho branco.
- Há uns anos, crimes como estes de Armando Vara não davam prisão efectiva. Davam "pena suspensa". E a pena aplicada seria seguramente mais leve. Esta orientação mudou. Os tribunais endureceram, e muito, as suas sentenças nos últimos anos.
- Qual é a mensagem que os tribunais querem passar?
a) Primeiro: que acabou a impunidade e a ideia de que a justiça protegia os poderosos;
b) Segundo: que não há qualquer tolerância em especial para crimes que têm uma reprovação social tão acentuada, sobretudo em tempos de crise económica;
c) Terceiro: que tem de consolidar-se uma sólida cultura do exemplo, para ter um efeito dissuasor da prática do crime.
O ARQUIVAMENTO DE DIAS LOUREIRO
Um dos piores momentos da justiça. Por duas razões simples:
a) Primeira: pela duração desta investigação. Esta investigação levou 8 anos. Para chegar a que conclusão? Nenhuma. Isto é aceitável? Não é. Oito anos é uma eternidade. Não pode ser.
b) Segunda: pela decisão final. Quando se faz uma investigação é para fazer uma de duas coisas: ou há provas e faz-se uma acusação; ou não há provas e arquiva-se o processo.
- O que não pode suceder é o que sucedeu neste caso. Arquivar por falta de provas e acrescentar: não há provas, mas continuam as suspeitas.
- Isto não é aceitável. E não é aceitável porque um juízo destes é a pior das condenações. É condenar na praça pública, sem passar por um tribunal, sem passar por um juiz, sem haver uma acusação, sem haver uma prova e sem haver um julgamento.
- Dizer isto não é defender A, B, C ou D. Seja político ou não político; poderoso ou não poderoso. Dizer isto é defender princípios.
A POLÉMICA DO EUROGRUPO
- O que se passou anteontem na reunião do Eurogrupo é do pior que a política tem: hipocrisia, falta de coragem, política de show off.
- Era a primeira reunião do Eurogrupo depois da polemica em torno das declarações do seu Presidente. O que esperaria de Portugal?
a) Primeiro: que estivesse presente o Ministro das Finanças. Se o tema era tão sério e indignou tanto o Governo, e bem, devia ter estado na reunião o MF e não um Secretário de Estado. O peso político não é o mesmo.
b) Segundo: mas, sobretudo, o que se esperava é que o Governo português fizesse dentro do Eurogrupo o que ao longo destes dias fez cá fora – que pedisse a demissão do Presidente do Eurogrupo. Que fosse coerente e consequente.
- Ora, o que fez Mourinho Félix foi um recuo. Um recuo lamentável. Uma vergonha.
- Pediu a demissão do Presidente do Eurogrupo? Não. Nem dentro nem fora da reunião. Limitou-se a fazer um apelo e um pedido de desculpas. O que é muito menos do que pedir a demissão.
Conclusão: "entradas de leão e saídas de sendeiro". Muita "coragem" em Portugal, muita subserviência na Europa.
PASSOS NÃO SE DEMITE
A entrevista de Passos Coelho à SIC tem: um recuo positivo; uma omissão; e uma conclusão falhada.
a) Recuo positivo – Passos Coelho abandonou, pelo menos por agora, o discurso negativo. A ideia de que tudo ia correr mal. É um recuo positivo. Pode ser tarde e pode até não ser para sempre. Mas que é um esforço para emendar a mão e corrigir o discurso, lá isso é.
b) Omissão – Faltou falar do futuro e sobretudo apresentar as suas propostas e ideias alternativas para o futuro. Ou seja, faltou gerar mobilização e gerar esperança. Porque só com ideias se gera esperança e só com ideias alternativas se faz a mobilização.
c) Conclusão falhada: o que passou desta entrevista para o exterior (títulos dos jornais) é que Passos não se demite; e que Passos critica Marcelo.
- Ora isto é um erro. Primeiro, porque não dá um voto; depois, porque mostra que não há uma mensagem pela positiva; sem esquecer que criticar o PR nunca é bom para um líder da oposição – o adversário do líder da oposição nunca é o PR; é sempre o Primeiro-Ministro. Enquanto se ataca o Chefe de Estado, deixa-se à solta o Primeiro-Ministro.
COSTA E A MAIORIA ABSOLUTA
- A novidade de António Costa na entrevista à Rádio Renascença é dizer isto: mesmo que o PS tenha uma maioria absoluta, queremos fazer coligação à mesma com PCP e BE. Parece uma afirmação inócua, ingénua ou inocente. Mas não é.
- O que é que isto significa? 3 coisas:
a) Primeiro: que António Costa está a pensar e a trabalhar para ter uma maioria absoluta;
b) Segundo: que está a dizer uma coisa e o seu contrário só para tentar não desagradar ao BE e ao PCP. Ter maioria absoluta e mesmo assim fazer uma segunda geringonça são, na prática, duas realidades incompatíveis. Nesse caso, o PCP e o BE teriam apenas um papel decorativo. Como é evidente não fariam nunca o papel de idiotas úteis.
c) Terceiro: que António Costa só faz isto porque está muito confiante. Por causa das sondagens e do ciclo económico. Mas, apesar da confiança, tem de ter cuidado: é que declarações como esta geram um nervoso miudinho no PCP e no BE. Convém não abusar da sorte.
O CONFLITO NA SÍRIA
- O mundo está mesmo perigoso. A comprová-lo, mais 2 factos desta semana: o atentado de Estocolmo e sobretudo o agravamento do conflito na Síria.
- Síria:
a) O massacre com armas químicas prova que o Presidente Sírio é um criminoso de guerra;
b) A surpresa, porém, foi a resposta americana. Surpresa pela reviravolta dos Estados Unidos. Até agora, Trump tinha dado sinais de simpatia por Putin e de complacência com o regime sírio;
c) Porquê esta reviravolta?
- Uma hipótese é Donald Trump querer distinguir-se de Obama, que em 2013 reagiu de forma passiva a um ataque semelhante com armas químicas;
- A segunda hipótese é a confirmação de que Trump se comporta como um verdadeiro catavento – muda de opinião ao sabor dos acontecimentos;
- A terceira hipótese é a de a Administração americana estar mesmo a mudar o seu comportamento em relação às proclamações iniciais.
Notas finais:
- DÉFICE - O INE vai rever em baixa (para 2%) o défice de 2016. Bom para o País
- METADADOS- PS e PSD estão prestes a firmar um acordo para fazer lei que permita aos Serviços de Informações o acesso a dados de comunicações nas investigações sobre terrorismo.
- BASE DAS LAJES- MNE veio dos EUA, há cerca de 15 dias, com a perspectiva de que os EUA têm abertura para uma solução que pode passar por uma base naval.
- Cativações nas despesas militares – Má noticia: há um mal-estar nas Forças Armadas com uma cativação de 20% no 1º trimestre. Boa notícia – Governo já começou a descativar na Força Aérea.