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Manuela Arcanjo - Economista 26 de Abril de 2018 às 20:56

Desigualdade de género: um longo caminho a percorrer

Apesar do forte aumento da participação feminina na formação superior, observa-se que as subsequentes carreiras são, ainda hoje, mais curtas com salários mais baixos e um perfil mais alisado.

A Comissão Europeia (CE) publicou o seu mais recente "Report on equality between women and men in the EU", no qual avalia os progressos realizados em diversas dimensões. Consideremos apenas a desigualdade no mercado de trabalho e nas pensões (cobertura e valor) e que resumem a independência económica.

 

Para a UE28, a diferença entre as taxas de emprego de homens e mulheres registou uma redução entre 2010-2013, mas a partir daí manteve um desvio de 12 pontos percentuais, em favor dos homens. Portugal encontra-se no conjunto de países (em que surgem, por exemplo, Alemanha, Dinamarca, França, Suécia) com menor desigualdade. Porém, este indicador deve ser complementado com um outro relativo à intensidade do trabalho: o número de horas de trabalho pago por semana. Em resultado de uma pesada herança sobre o papel das mulheres nas tarefas domésticas e como cuidadoras, o panorama por países apresenta diferenças expressivas. Embora longe da paridade, nos países nórdicos a diferença entre mulheres e homens não ultrapassa as oito horas por semana. Portugal encontra-se agora entre os países - na UE15 - com maior desigualdade (23 horas e nove horas para mulheres e homens, respectivamente).

 

A segunda conclusão remete-nos para a desigualdade salarial. Apesar do forte aumento da participação feminina na formação superior, observa-se que as subsequentes carreiras são, ainda hoje, mais curtas com salários mais baixos e um perfil mais alisado. No que se refere à desigualdade salarial (o designado "Gender pay Gap" - GPG), medida pela diferença entre a remuneração média bruta de mulheres e homens, a CE destaca a ausência de progressos a partir de 2010 para os 28 países (16,4%). Alguns deles revelam uma redução do GPG (casos da Dinamarca, Espanha, Luxemburgo, por exemplo); Portugal registou um dos maiores aumentos do GPG: de 8,5% em 2007 para 17,8% em 2015. Como a própria CE refere, existem três causas comuns à maioria dos países: i) as mulheres ainda registam uma forte participação nos sectores económicos com menores remunerações, indicador com evolução muito lenta entre 2005-2015; ii) maior incidência das mulheres no trabalho a tempo parcial e com contratos temporários, a que estão associadas remunerações mais baixas; iii) a forte discriminação directa das mulheres na obtenção de vantagens prevalecentes nos homens e derivadas de horários prolongados, menores interrupções de carreira e maior mobilidade geográfica. Em Portugal, as mulheres acumulam estas desvantagens que naturalmente se repercutem nas suas pensões futuras.

 

A desigualdade na protecção à velhice apresenta duas dimensões. Primeiro, a menor cobertura para as mulheres por via das carreiras mais curtas tornando-as dependentes de pensões sociais e, desta forma, aumentando a taxa de pobreza nas mulheres idosas (65 anos e mais). Segundo, a relação entre o valor médio bruto da pensão recebida por mulheres e homens - "Gender Gap in Pensions" (GPP). Para a UE15, Portugal foi um dos quatro países que registaram um agravamento do GPP, entre 2013-2015, fruto da acumulação de diversas fontes de desigualdade ao longo da vida activa.

 

Em Portugal, tem sido aprovada legislação para uma participação mais paritária nos órgãos de gestão das empresas cotadas e na administração pública. É importante, claro, mas tal só beneficia uma reduzida percentagem de mulheres. É no mercado de trabalho que se identificam as maiores desigualdades de género e os fracos progressos obtidos, a nível europeu, na desigualdade salarial fundamentam uma importante conclusão da CE (página 25): não havendo um progresso significativo, será necessário mais um século para se atingir a igualdade salarial entre mulheres e homens. É um caminho demasiado longo para milhões de mulheres.

 

Professora universitária (ISEG) e investigadora. Economista

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