Opinião
Alternativa e propaganda (II)
O Governo comunicou esta semana o resultado da adesão dos contribuintes ao Plano Especial de Redução do Endividamento ao Estado. No que respeita apenas à regularização de dívidas ao fisco, o programa permitiu um encaixe de 511 milhões de euros já em 2016, contribuindo para a redução do défice nuns providenciais 0,3%.
Ao todo, considerando os pagamentos em prestações que se estenderão nos próximos anos, o Estado espera contabilizar a entrada de 1144 milhões nos seus cofres (ainda que parte substancial tenha ainda de ser devolvida ou nunca venha a ser realmente paga, já que muitas das dívidas têm contencioso associado, que em muitos casos poderá ser decidido a favor dos contribuintes).
É curioso que o Governo tenha decidido comunicar a execução do plano dando nota, em jeito de celebração, dos seus efeitos orçamentais. Todos nos lembramos de quando, no momento da sua aprovação, alegadamente o Plano nada tinha que ver com captação de receita e redução do défice. O Governo e seus apoiantes andaram abespinhados durante dias, incrédulos com o facto de ninguém aceitar a mentira oficial – que a intenção era, apenas e só, a de permitir o reequilíbrio financeiro dos devedores, evitando o aumento das insolvências, e a criação de condições de acesso aos fundos comunitários, que exige a situação tributária e contributiva regularizada.
Conforme aqui escrevi anteriormente ("Alternativa e propaganda", 12 de Outubro de 2016), o Governo tinha todo o interesse em que o Plano não fosse visto como a medida de emergência que foi, de facto. Em primeiro lugar, porque, na oposição, o PS foi impiedoso com uma medida essencialmente semelhante aprovada pelo PSD e CDS. Em segundo lugar, porque a justificação verdadeira do Plano refuta a tese do "virar da página da austeridade". A necessidade desta medida mostra não só que o Governo não confia que a sua política económica seja auto-suficiente para o efeito da trajectória de consolidação orçamental como que o "regresso à normalidade" da propaganda oficial é um logro.
Daí que se mantenha válida a minha conclusão de então: ‘a proposta política que a esquerda portuguesa tem para os tempos que correm (ainda) não é exactamente uma "alternativa". Não é o crescimento por via do consumo, não é o investimento público, não é a reestruturação da dívida, não é certamente a "leitura inteligente" do Tratado Orçamental (tudo ideias que passaram directamente dos programas eleitorais para os manuais de História). Até ao momento, e para lá da capa cintilante da propaganda, a "alternativa" ainda é a velha e conhecida obediência ao conservadorismo orçamental’.
P.S.: No meu artigo da semana passada, sobre a visita do Presidente da República ao Teatro da Cornucópia, escrevi a dado passo que Marcelo Rebelo de Sousa afirmou ter estado na estreia da companhia em 1973, na primeira representação de "O Misantropo", de Molière. Esta suposta afirmação gerou um comentário público de Jorge Silva Melo, fundador da Cornucópia, que chamou o Presidente de "mentiroso". Presumi que Marcelo disse o que eu escrevi que ele disse por ter visto essa informação na generalidade dos órgãos de comunicação social. Soube entretanto que a mesma é incorrecta: o que o Presidente disse foi que esteve numa das representações de "O Misantropo", em 1973, não na representação de estreia da peça (e da companhia). Fica a rectificação – e o meu pedido de desculpas ao Presidente da República e aos leitores.
Este artigo está em conformidade com o novo acordo ortográfico
É curioso que o Governo tenha decidido comunicar a execução do plano dando nota, em jeito de celebração, dos seus efeitos orçamentais. Todos nos lembramos de quando, no momento da sua aprovação, alegadamente o Plano nada tinha que ver com captação de receita e redução do défice. O Governo e seus apoiantes andaram abespinhados durante dias, incrédulos com o facto de ninguém aceitar a mentira oficial – que a intenção era, apenas e só, a de permitir o reequilíbrio financeiro dos devedores, evitando o aumento das insolvências, e a criação de condições de acesso aos fundos comunitários, que exige a situação tributária e contributiva regularizada.
Daí que se mantenha válida a minha conclusão de então: ‘a proposta política que a esquerda portuguesa tem para os tempos que correm (ainda) não é exactamente uma "alternativa". Não é o crescimento por via do consumo, não é o investimento público, não é a reestruturação da dívida, não é certamente a "leitura inteligente" do Tratado Orçamental (tudo ideias que passaram directamente dos programas eleitorais para os manuais de História). Até ao momento, e para lá da capa cintilante da propaganda, a "alternativa" ainda é a velha e conhecida obediência ao conservadorismo orçamental’.
P.S.: No meu artigo da semana passada, sobre a visita do Presidente da República ao Teatro da Cornucópia, escrevi a dado passo que Marcelo Rebelo de Sousa afirmou ter estado na estreia da companhia em 1973, na primeira representação de "O Misantropo", de Molière. Esta suposta afirmação gerou um comentário público de Jorge Silva Melo, fundador da Cornucópia, que chamou o Presidente de "mentiroso". Presumi que Marcelo disse o que eu escrevi que ele disse por ter visto essa informação na generalidade dos órgãos de comunicação social. Soube entretanto que a mesma é incorrecta: o que o Presidente disse foi que esteve numa das representações de "O Misantropo", em 1973, não na representação de estreia da peça (e da companhia). Fica a rectificação – e o meu pedido de desculpas ao Presidente da República e aos leitores.
Este artigo está em conformidade com o novo acordo ortográfico
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